Revista Exame

A política é o que mais assusta no Brasil, Índia e Turquia

Grandes países emergentes terão eleições neste ano. Para o cientista político americano Ian Bremmer, isso significa um risco muito maior de medidas populistas

Ian Bremmer: “Não dar aos mercados a clareza que eles querem” é a melhor forma de evitar outra crise (Bill Pugliano/Getty Images)

Ian Bremmer: “Não dar aos mercados a clareza que eles querem” é a melhor forma de evitar outra crise (Bill Pugliano/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 19 de fevereiro de 2014 às 06h00.

São Paulo - Nos últimos 20 anos, a participação dos países emergentes na economia global mais do que duplicou, chegando a cerca de 40% do PIB mundial em 2013. Por isso, qualquer risco de crise nesses mercados atrai hoje a atenção global. A instabilidade política em países como Turquia e Argentina levou os investidores a avaliar negativamente boa parte dos emergentes.

O Brasil, apesar dos muitos avanços das últimas décadas, entrou na lista das nações que oferecem riscos à economia mundial. Segundo o cientista político americano Ian Bremmer, dono da consultoria Eurasia Group, a tensão deve continuar neste ano. Ao longo de 2014, haverá eleições em vários países emergentes, Brasil à frente, e isso eleva a chance de decisões que afugentem os investidores.

EXAME - O que explica o mau humor generalizado com os países emergentes?

Ian Bremmer - Há diversas razões para o baixo desempenho dos emergentes. Entre elas estão a ausência de reformas estruturais e a instabilidade política decorrente de lideranças despreparadas. Isso tende a aumentar com a chegada de eleições neste ano.

Em 2014, eleitores de 44 democracias irão às urnas, incluindo mercados emergentes importantes, como Turquia, Brasil, Índia e África do Sul. E os preparativos para uma eleição direcionam as políticas econômicas para caminhos mais populistas.

EXAME - O que atrapalha mais os emergentes: o cenário político ou a retirada de estímulos do Federal Reserve, o banco central americano, à economia dos Estados Unidos?

Ian Bremmer - No ano passado, quando não sabíamos quem substituiria Ben Bernanke no comando do Fed e como essa pessoa lidaria com a retirada dos estímulos, as incertezas eram maiores. Essas variáveis são mais claras agora. A desvalorização dos títulos dos países emergentes decorre de desconfianças geradas pelos próprios emergentes.

EXAME - Que tipo de desconfiança?

Ian Bremmer - São várias. Desconfianças provocadas pela queda de desempenho da economia chinesa, pelas tensões entre países vizinhos na Ásia, pela desvalorização cambial na Argentina, por manifestações na Ucrânia e pela crise política na Turquia.

Soma-se a tudo isso um ambiente de menor crescimento econômico. Nos mercados emergentes, a instabilidade política é tão ou mais importante do que a econômica.

EXAME - Existe o risco de contágio, mesmo para países com fundamentos econômicos mais sólidos?

Ian Bremmer - Países com fundamentos sólidos também poderão ser afetados. Por isso, a maneira como os governos vão responder à atual volatilidade é fundamental. A Turquia é um caso interessante. A resposta do banco central à desvalorização da moeda, a lira turca, foi a rápida elevação dos juros, o que agradou aos mercados.

Mas logo em seguida o primeiro-ministro, Recep Erdogan, criticou a autoridade monetária e, mais uma vez, preocupou os investidores. Claramente, a estratégia de sobrevivência política de Erdogan está interferindo na boa gestão econômica.

Outros países, como Chile e Colômbia, foram atingidos, mas a razão é muito mais ligada à desaceleração da China e à dependência de exportação de commodities. Como não sofrem instabilidade política hoje, suas dificuldades serão mais facilmente superadas.


EXAME - Qual é o significado de um menor crescimento dos mercados emergentes para a economia global?

Ian Bremmer - Parte do crescimento no mundo vem desses mercados. Portanto, teremos mais volatilidade na economia global. Além disso, os mercados emergentes são, por definição, países onde a política tem um papel desproporcional na economia.

Ou seja, veremos uma maior influência de ações meramente políticas no cenário econômico global. Caso isso ganhe grandes proporções, os investimentos na economia americana e as aplicações em dólar poderão se tornar mais atrativos.

EXAME - O que os governos de países emergentes devem fazer para não afugentar investidores?

Ian Bremmer - Uma parte enorme dessa tarefa é manter-se fiel às promessas econômicas já feitas. O Brasil está em uma posição muito melhor nesse quesito. Esse também é o caso da Colômbia e do México. Mas e a Argentina? Lá, a situação é tão terrível que quase não importa o que o governo faça neste momento.

EXAME - Há chance de uma nova crise de confiança nos emergentes, como ocorreu no fim dos anos 90?

Ian Bremmer - Não. Os emergentes estão maiores e mais estáveis. Além disso, eles têm vulnerabilidades macroeconômicas menores, passivos fiscais menores e reservas internacionais maiores. Mas é fácil apontar alguns que estão no limite.

Argentina, Venezuela e Ucrânia certamente estão na categoria dos países que não tiveram políticas econômicas sustentáveis e em que os desafios de governança são mais agudos.

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