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Os millenials chegam à meia-idade mais pobres, infelizes e inseguros do que seus pais

Uma multidão de pessoas nascidas nos anos 1980 está chegando aos 40 anos mais pobre, insegura e infeliz do que as gerações anteriores. Como resolver essa crise?

 (Getty Images/Getty Images)

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Bloomberg Businessweek
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Publicado em 22 de março de 2023 às 06h00.

Este será o terceiro lote de millennials a atingir o marco. Mas esse grupo provavelmente não vai agir como rebeldes como seus pais, que na casa dos 40 a 50 anos conseguiram adquirir chamativos barcos ou foram para Bali depois de ascender na escada corporativa. Eles não estão se divorciando de um cônjuge (pois nunca tiveram um) ou fazendo uma tatuagem (eles já as têm).

Não, esta geração vai enfrentar a crise da meia-idade de maneira diferente. Eles não podem se dar ao luxo de fazer diferente. O relatório The Emerging Millennial Wealth Gap (“A emergente lacuna da riqueza dos millennials”, numa tradução livre), do think tank apartidário New America, mostra que os nascidos entre 1981 e 1996 ganham 20% menos do que os baby boomers ganhavam na idade deles. E dados do Federal Reserve Bank de St. Louis dizem que suas poupanças têm uma média de 162.000 dólares, ante 198.000 dólares da geração X na mesma idade.

Diversos fatores conspiraram para deixar os millennials de meia-idade muito mais pobres do que seus precursores. Mais proeminente, o estouro das empresas pontocom e a subsequente crise financeira de 2008 moldaram o início de sua vida profissional.

O Bureau Nacional de Pesquisa Econômica diz que os indivíduos experimentam 70% do crescimento geral de seus salários durante a primeira década da vida profissional; se esse período coincidir com uma desaceleração, é provável que haja uma redução de 9% no longo prazo.

O relatório de 2021 do Centro de Pesquisa da Aposentadoria disse que a geração do milênio entre 28 e 38 anos tinha a menor riqueza média comparada à renda média em relação a qualquer geração anterior.

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Eles estão ganhando e economizando menos, mas esta geração está repleta de sinais de que deveria agir com mais ousadia. Um crescente coro de especialistas diz que todos deveríamos buscar uma nova carreira a cada 12 anos ou mais e que, durante a “debandada em massa” de 2021, as demissões mensais nos Estados Unidos atingiram recordes históricos.

A indústria do bem-estar e autocuidado aumentou para mais de 4 trilhões de dólares por ano em todo o mundo. Mas, embora tenham mais acesso a ferramentas de fitness e tecnologia do que qualquer geração anterior, de acordo com um estudo da Technogym sobre 5.000 millennials, muitos sentiram que tinham um “déficit de bem-estar”. Apenas 52% avaliaram seu nível geral de bem-estar como “bom” ou “excelente”.

“Eles se sentem presos e não estão felizes com isso, mas não têm muitas opções”, diz ­Steven Mintz, historiador da Universidade do Texas, em Austin, e autor de O Melhor da Vida: Uma História da Idade Adulta Moderna. “Eles não podem simplesmente pedir a conta e ir embora.”

De onde vem o termo "crise da meia-idade"

A “crise da meia-idade” já ultrapassou a própria curva — completa 58 anos neste ano. Esse fenômeno, a muito ridicularizada mistura de barriga e pânico, foi apresentado pela primeira vez ao público americano em 1965, pelo psicólogo Elliott Jaques, em um deprimente artigo chamado Morte e a Crise da Meia-Idade.

A pesquisa de Jaques, à época com 48 anos, mostrou que criativos como compositores e artistas vinham demonstrando declínios ou vertiginosas mudanças por volta dos 35 anos. Nesse ponto, de acordo com Jaques, os humanos trocaram a cronometragem otimista por uma abordagem pessimista — em vez de “sobrevivência desde o nascimento” era “sobrevivência até a morte”.

O trabalho que ele apresentou provocou impacto instantâneo, com lançamento de livros, cobertura televisiva e até mesmo uma força-tarefa do governo para investigar suicídios de homens na meia-idade. Metáforas do fenômeno foram estabelecidas desde o início: era uma preocupação distintamente branca, masculina e de classe média.

Na mesma época, uma convulsão social generalizada tornou o fato de divorciar-se da esposa para se casar com uma mulher mais jovem menos desaprovado (de 1960 a 1969, a taxa de divórcio subiu de 2,2% para 3,2%; atingiria o pico de 22,6% em 1980) e sem restrições.

O mercantilismo estava em alta geracional. Comprar um carro veloz era patriotismo e atitude. Apropriadamente, o Camaro da Chevrolet foi lançado em 1966.

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A primeira massa a experimentar a crise da meia-idade como Jaques a definiu foi a geração silenciosa, ou aqueles nascidos nos dez anos ou mais antes da Segunda Guerra Mundial. Seus descendentes, os boomers, adotaram muitos dos mesmos movimentos quando chegaram aos 40 anos na década de 1980.

A geração X conquistou o título nos anos 2000. Essa turma com formato de Nirvana colocou uma dose da característica rebelião na mistura — se Ben Affleck tivesse completado 40 anos na década de 1960, duvida-se de que ele tivesse optado por fazer uma tatuagem nas costas.

Como esses quarenta e poucos recém-chegados estão reconsiderando a vida?

O que nos leva aos dias de hoje e aos millennials de meia-idade. “O roteiro da vida se desintegrou”, diz Mintz. “O manual que dizia o que fazer aos 25, aos 35 ou aos 50 já não existe mais.

Então, como esses quarenta e poucos recém-chegados estão reconsiderando a vida? Gastando menos, é claro. Em vez de comprar um carro novo, eles compram uma bicicleta e saem para a estrada, melhorando a saúde e aumentando a longevidade ao longo do caminho.

Em vez de fazer uma cirurgia plástica, provavelmente adotarão um hobby aventureiro.

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“Existe uma ideia de que não é preciso envelhecer na meia-idade”, de que se pode permanecer jovem fazendo exercícios e viajando, diz Mark Jackson, autor de Broken Dreams: An Intimate History of the Midlife Crisis (“Sonhos desfeitos: uma história íntima da crise da meia-idade”, numa tradução livre).

“Esses passatempos têm um preço, “mas são muito mais baratos do que comprar um Porsche ou uma Ducati ou manter uma amante.”

Graças aos protocolos de trabalho flexível estimulados pela pandemia, o velho argumento de deixar sua família para trás se transformou em desenraizar todo o clã e mover todos para algum lugar com maior qualidade de vida por centavo. “Se você deseja se mudar para o Alasca, isso não é mais uma fantasia”, diz Mintz. “Com certo grau de trabalho remoto, agora é possível fazer isso.”

Em vez de se divorciar, muitos casais estão repensando a monogamia e a maneira como compartilham o espaço. O designer de interiores Francis Sultana, sediado em Londres, diz que o chamado quarto do ronco, ou segundo espaço para dormir, agora é uma característica regular das casas que ele projeta para clientes em relacionamentos de longo prazo.

Ele e seu próprio parceiro têm mantido os próprios quartos por pelo menos uma década. “É uma maneira feliz de administrar, especialmente se os ciclos de trabalho ou de vigília forem diferentes”, diz ele. “E, antigamente, quartos separados eram a norma.”

O que fazer com tantos pratos girando?

Para muitos, o ideal não é uma mudança agressiva. Lucia Knight, que dirige o que chama de “consultoria de design de carreira de meia-idade” chamada Midlife Unstuck, explica da seguinte forma: “Há muitos pratos girando agora para simplesmente deixá-los cair” sempre que quiser adotar um novo caminho. “Então, é preciso negociar com cada um dos dez pratos da vida para que isso aconteça.”

Ela trabalha com clientes para ajustar progressivamente sua vida, em vez de implodi-la. Uma diretora-gerente de um banco, por exemplo, transformou o crochê, um hobby que desenvolveu para diminuir sua ansiedade, em uma lucrativa atividade paralela.

Outra, uma enfermeira, começou a trabalhar meio período para poder fazer um curso de tapeçaria e pensar em mudar para a fabricação de móveis. Knight diz que 40% de seus clientes são mulheres. O fenômeno, diz ela, “não é mais muito masculino”.

“Acho que ninguém se preocupou em olhar para a crise da meia-idade de uma mulher na década de 1960”, diz Annabel Rivkin, cofundadora do Midult, um site para mulheres na meia-idade. “Elas foram abandonadas e, portanto, tornaram-se reativas, não ativas.”

Rivkin prefere o termo “encruzilhada da meia-idade”, na esperança de ajudar a mudar o diálogo sobre esse estágio da vida, afastando-o de sexo, separação ou poder de compra.

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Atingir a meia-idade para um millennial não precisa ser uma fonte de pânico. Não ter dinheiro para dar uma virada em sua vida pode realmente ser libertador, dizem alguns conselheiros.

Se uma crise é, em última análise, reafirmar o controle sobre suas circunstâncias e destino, há uma moeda sobre a qual todos têm controle: o tempo.

Sarah Knight, autora best-seller do jornal The New York Times de uma série de manuais, como A Mágica Transformadora de Ligar o Foda-se, sugere que pensemos em nosso tempo, energia e dinheiro como dinheiro emocional e que criemos um “foda-se o orçamento” ao seu redor.

“Gaste seu dinheiro em coisas e pessoas que façam você feliz — ou pelo menos com aquelas que sirvam de alguma forma. E recuse-se a gastá-lo com coisas que não façam isso”, diz ela. Substitua o “sim, claro!” por “vou pensar a respeito e depois falo com você”.

Pare de pensar que precisa justificar a recusa de um convite, data ou oferta de emprego. Você não deve a ninguém uma explicação além de “não, obrigado”. Não se preocupe tanto em ser considerado alguém bacana: “Se você for honesto e educado, não fez nada de errado”, diz Knight.

Como a geração Z vai chegar à crise de meia-idade?

Rivkin, da Midult, chama a meia-idade de “sua era de fazer coisas”, quando as mulheres dão as costas à deferência. “Meu bolso não é fundo, e minha vida tem muita ânsia”, diz ela. “Eu acho que existe hoje uma nova capacidade de dizer ‘foda-se’.”

Quando a crise da meia-idade como conceito foi apresentada pela primeira vez, “era vista como um período de depressão”, diz Jackson, do Broken Dreams. Mas nossas expectativas mudaram drasticamente. “Estamos acostumados a mudar de emprego. Nós nos casamos mais tarde e temos menos filhos, e mais tarde na vida. E estamos vivendo mais, então a meia-idade se prolongou.”

Esses cronogramas mais longos também remodelarão o ritmo da crise da meia-idade no futuro. Em vez de um único momento de reinvenção da vida, ­Jackson sugere que o novo normal é uma constante reavaliação e iteração silenciosa, permitindo que a geração do milênio e aqueles que vêm mais tarde se recalibrem sem mudar totalmente sua vida.

Os primeiros da geração Z completarão 40 anos em 2037. Poderemos nem perceber então, diz Rivkin. “A geração Z tem uma crise de identidade a cada 30 segundos”, diz ela. “Portanto, não há mais muitas regras sobre quando podemos tentar redefinir nossa vida.”

Tradução de Anna Maria Dalle Luche

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