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A cachaça é o novo gim?

Sete anos depois de comprar a Ypióca, a fabricante britânica de bebidas Diageo investe para transformar a marca brasileira em um novo sucesso global

Gavazzi, da Diageo: inspiração no sucesso do gim (Germano Lüders/Exame)

Gavazzi, da Diageo: inspiração no sucesso do gim (Germano Lüders/Exame)

AJ

André Jankavski

Publicado em 28 de março de 2019 às 05h40.

Última atualização em 25 de julho de 2019 às 15h53.

Se no mundo das startups todo mundo quer criar o novo Uber, e no do entretenimento todos tentam emular o modelo da Netflix, no mundo das bebidas o sonho é replicar o sucesso do gim. O gim é a bebida alcoólica da moda no Brasil e em boa parte do Ocidente. De 2012 a 2017, as vendas de gim cresceram quatro vezes em valor no Brasil, para 100 milhões de reais, enquanto em volume o crescimento foi de 150%, segundo a empresa de pesquisas Euromonitor. A expectativa é que, até 2022, esses números dobrem.

Criado no século 17 em Londres como um diurético, o gim despontou graças a uma agressiva estratégia comercial. Replicar seu sucesso é que são elas. Diferentes fabricantes tentam, mundo afora, com bebidas como tequila e rum. A britânica Diageo, maior fabricante de bebidas do mundo, dona de marcas como o uísque Johnnie Walker e o gim Tanqueray, pensa que a cachaça pode ter sucesso nessa empreitada.

Em 2012, a Diageo desembolsou 930 milhões de reais para comprar a destilaria cearense Ypióca. Depois de levar longos sete anos tentando conhecer o potencial do mercado e da bebida, os ingleses agora estão seguros de ter um plano para levar a cachaça ao lugar que merece. “Não digo que nos arrependemos da compra, pois olhamos para o longo prazo. Mas o valor da aquisição poderia ser outro”, diz Alberto Gavazzi, presidente da Diageo na América Latina. A operação da Ypióca tem caminhado trançando as pernas. No último ano fiscal, encerrado em junho, as vendas da cachaça tiveram queda de 7%. O gim Tanqueray cresceu 12% no mesmo período.

Para fazer da cachaça um sucesso global, a Diageo precisa inverter uma curva descendente no Brasil. A cachaça continua sendo a segunda bebida alcoólica mais consumida no Brasil, atrás apenas da cerveja, mas sua produção é para lá de informal e está em queda. De 2014 para cá, o volume de vendas da bebida caiu 3%, de acordo com estimativas da Euromonitor, para 523 milhões de litros. Além da crise econômica, outro motivo que explica a queda foi o aumento de impostos que a cachaça sofreu em 2016, no auge da crise fiscal, durante o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. A cachaça hoje paga 82% de imposto, ante 80% do cigarro e 72% das armas de fogo. A estimativa do Instituto Brasileiro da Cachaça é que 85% da produção seja feita em alambiques informais.

Todos esses problemas, somados à falta de uma publicidade mais robusta dentro e fora do Brasil, não deixam a cachaça engrenar. Atualmente, apenas 1% da produção da aguardente é enviada a outros países, enquanto outras bebidas, como a tequila mexicana, alcançam proporções acima dos 70%. A estratégia é estimular a exportação das linhas mais caras, que concorrem diretamente, no limite, com o uísque. A líder de mercado, Companhia Müller de Bebidas, dona da marca 51, cresceu 2% no ano passado muito em razão das vendas de sua cachaça premium Reserva 51, que custa mais de 100 reais.

A Diageo tem estimulado profissionais de bares a criar drinques utilizando a cachaça como base, para gerar marketing e margem, e para diminuir o preconceito em relação à bebida. Por meio da iniciativa Diageo Bar Academy, a empresa treina bartenders para criar novas maneiras de consumir a cachaça. O gim, por exemplo, só se tornou popular graças ao gim tônica, onipresente em bares brasileiros. Com os coquetéis, a Diageo espera, pouco a pouco, elevar o preço médio da cachaça. Enquanto uma garrafa de entrada de tequila e gim chega a custar 10 dólares, a cachaça é facilmente encontrada em supermercados por menos de 2 dólares.

Uma das apostas é a edição Cinco Chaves, que custa cerca de 100 reais, oito vezes o preço da versão Ouro, a mais vendida. “O segmento premium, que tem marcas como o uísque Red Label e a vodca Smirnoff, é o que dá sustentação à empresa, pois consegue unir volume e margem”, afirma Gavazzi.

Se a cachaça ganhar força, poderá fazer com que a Diageo mantenha uma distância segura da principal rival, a francesa Pernod Ricard, responsável por marcas como o uísque Chivas, a vodca Absolut e o gim Beefeater — e dona também das cachaças São Francisco e Janeiro. Mas a própria Pernod admite que não mantém investimentos de marketing e comunicação nos dois produtos.

Nos resultados do primeiro semestre do ano fiscal de 2019, a Diageo apresentou faturamento global de 9 bilhões de dólares, 6% maior do que o do mesmo período do ano anterior. A receita ficou 60% acima dos resultados da Pernod, assim como a margem operacional, de 35%, ante 21% da rival. É uma vantagem que a Diageo tentará manter caipirinha a caipirinha. 

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