José Efromovich em Congonhas: brigas com o irmão para reestruturar a Avianca (Germano Lüders/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 17 de outubro de 2011 às 06h00.
São Paulo - O empresário boliviano naturalizado brasileiro José Efromovich, de 56 anos, dono da Avianca, a sexta maior companhia aérea do país com um faturamento de 557 milhões de reais, interrompe a entrevista em seu escritório com vista para o aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo, para observar o Airbus 319 da empresa que taxiava no local.
De pé em frente à janela, ele solta um efusivo “the best, nós somos the best” enquanto aplaude, sozinho, a aeronave. Efromovich então sorri, pede desculpas pela empolgação e retoma a conversa.
Muito embora esteja se referindo a uma companhia que detém menos de 3% do mercado brasileiro e que nunca, desde sua fundação, em fevereiro de 2002, como OceanAir, registrou um só ano de lucro, Efromovich tem lá seus motivos para ficar entusiasmado.
O “engenheiro”, como é conhecido entre os 2 437 funcionários (ele é formado em engenharia civil), conseguiu tirar a Avianca de um estado de quase falência em 2008 e colocá-la de volta na rota de crescimento — o faturamento previsto para 2011 é de 840 milhões de reais, 51% mais do que no ano passado.
Embora ainda opere no vermelho, o buraco da companhia diminuiu — em 2010, seu prejuízo foi de pouco mais de 60 milhões de reais, um terço do registrado dois anos antes e inferior às perdas da concorrente Azul, de 87 milhões de reais, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil. “Neste ano devemos finalmente equilibrar as contas”, diz Efromovich.
Há três anos, quando José assumiu o comando, sucedendo ao irmão German, lucro era uma palavra muito distante do vocabulário da Avianca.
Naquela época, a companhia acumulava um prejuízo de quase 600 milhões de reais, havia deixado de pagar fornecedores e contava com uma estrutura de custos até seis vezes maior do que a média do setor.
Para não ver o negócio sucumbir, Efromovich foi obrigado a reestruturar, radicalmente, a companhia. Injetou 200 milhões de reais na operação, demitiu metade dos 1 200 funcionários e reduziu de 34 para 14 o número de aeronaves. Tudo isso num momento em que o mercado de aviação crescia 60%.
“Não tivemos escolha”, diz ele. “Sem isso teríamos mais seis meses de vida.” Ciente de que não conseguiria bancar uma guerra tarifária com as concorrentes, maiores e mais poderosas que a OceanAir, ele decidiu centrar esforços na melhoria da qualidade do que havia restado da companhia.
Para isso, trouxe uma equipe de dez executivos da Avianca na Colômbia (uma operação que os dois irmãos haviam comprado em 2004 durante um processo de recuperação judicial) para comandar áreas-chaves da OceanAir, como operação de voos, comercial e atendimento ao cliente.
Uma das primeiras medidas do novo time foi substituir o call center terceirizado por uma estrutura própria, com 80% dos atendentes com nível universitário. Antes de começar a trabalhar, todos são obrigados a fazer pelo menos um voo de Avianca para entender o funcionamento do negócio.
Os aviões foram padronizados para modelos Airbus (restam apenas 14 do tipo Fokker 100, que serão aposentados em 2015) e ganharam benefícios, como espaço maior entre as poltronas, tomadas para carregar laptops, apoio para bolsas e refeição quente inclusive na ponte aérea Rio-São Paulo.
Em abril do ano passado, José adotou o nome Avianca em referência à bem-sucedida operação colombiana — e, com isso, tenta apagar da memória dos consumidores os estragos causados pela OceanAir.
As medidas permitiram que a Avianca retomasse a participação de mercado dos anos pré-crise, de 2,8%, e — mais importante — ampliasse sua presença no lucrativo mercado corporativo.
Segundo dados da Associação Brasileira de Agências de Viagens Corporativas, a Avianca vendeu mais de 60 milhões de reais em passagens para empresas no primeiro semestre, 41% mais do que no mesmo período de 2010. Foi a segunda maior alta depois da Azul, com 133%.
Para efeito de comparação, TAM e Gol aumentaram sua participação em 12% cada. Para seguir crescendo, Efromovich anunciou recentemente que investirá 1,5 bilhão de dólares na aquisição de 18 aeronaves, que chegarão até 2015. Sem poder bancar investimentos maciços em marketing, ele tem confiado basicamente no boca a boca para seguir crescendo.
Mesmo com dois jatinhos da empresa à sua disposição, Efromovich tem feito todas as suas viagens de Avianca. Ele chega sempre 1 hora e meia antes dos voos para ver o movimento e auxiliar os funcionários no check-in.
“Dessa forma, conseguimos resolver eventuais problemas mais depressa. Para os passageiros, faz diferença ver a cara do dono na operação. Já cheguei até a despachar malas”, diz.
Sócios desde a época da faculdade, José e German Efromovich entraram no negócio de aviação meio por acaso. Desde 1977, eles tocavam juntos o que é hoje o grupo Synergy, composto de uma empresa de inspeção industrial e outra de equipamentos de diagnóstico.
Em 1998, para não levar calote de um cliente, eles aceitaram receber como pagamento de uma dívida dois aviões turboélice e passaram a usá-los no transporte de seus funcionários em cidades não atendidas pelas grandes companhias aéreas, como Macaé, no Rio de Janeiro.
A rota alternativa logo despertou o interesse de outras empresas, como Petrobras e Odebrecht, que queriam utilizar o serviço. Quatro anos mais tarde, os Efromovich decidiram comprar as quatro aeronaves da extinta Rio Sul, antiga companhia de aviação regional da Varig. Nascia a OceanAir.
German assumiu o comando da nova companhia aérea e José ficou responsável pelos demais negócios. Tudo parecia correr bem, até que em novembro de 2007 o clima azedou.
Na época, German anunciou que a OceanAir assumiria os 70 000 passageiros da BRA, que acabara de suspender suas atividades, assim como seus cinco aviões.
José foi contra, com o argumento de que a OceanAir nem sequer conseguia equilibrar suas próprias contas — a empresa fecharia 2007 com um prejuízo de 153 milhões de reais.
Seis meses depois, ficou claro quem venceu o embate. Os irmãos Efromovich decidiram devolver as aeronaves, as rotas e os passageiros da BRA.
Internamente, o conselho de administração da OceanAir apoiou José na disputa. Após meses de discussões, os dois finalmente chegaram a um acordo: German se afastaria da operação brasileira (ele hoje toca a Avianca na Colômbia) e José assumiria a companhia.
“Na OceanAir, o German, que era mais agressivo, saía atirando, e José corria para consertar os estragos”, diz um ex-executivo da empresa.
Ceticismo
Como essa não é a primeira vez que os irmãos Efromovich ameaçam tomar de assalto o mercado brasileiro — em 2007, é bom lembrar, German chegou a dizer que a então OceanAir seria a terceira maior do setor em apenas quatro anos, com uma participação de 17% —, analistas e especialistas em aviação têm encarado os planos da Avianca com certo ceticismo.
“A empresa não possui uma identidade clara, não mostrou a que veio”, diz Respício Espírito Santo, professor do departamento de engenharia de transportes da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Seu maior trunfo hoje são os 24 intervalos diários de pouso e decolagem (ou slots, no jargão do setor) no aeroporto de Congonhas, o mais movimentado do país — atrás apenas de Gol e TAM.
“Esses slots são disputados a tapa pelas empresas aéreas, o que faz da Avianca um alvo de futuras aquisições”, diz Sérgio João Galhardo Junior, consultor especializado em aviação.
O mais provável, no entanto, é que a Avianca acabe finalmente se unindo à operação colombiana — a integração entre as duas empresas tem sido tema recorrente nas conversas entre José e German. “São planos para daqui a dois anos”, diz Efromovich. Antes disso, ele tem um desafio mais urgente: fazer a Avianca no Brasil, enfim, dar dinheiro.