Estes engenheiros desafiaram seus chefes – e salvaram vidas
Três funcionários queriam inovar em equipamentos para atendimentos médicos críticos. Então, criaram um negócio que faturou 34 milhões só no ano passado
Mariana Fonseca
Publicado em 20 de abril de 2017 às 06h00.
Última atualização em 20 de abril de 2017 às 18h52.
São Paulo – Os engenheiros Tatsuo Suzuki e Wataru Ueda, formados no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), passavam por uma situação comum a muitos funcionários: suas ideias não eram ouvidas por seus chefes.
O que é incomum nessa história é o fato de que suas propostas poderiam ajudar a salvar mais vidas. Suzuki e Ueda trabalhavam em uma empresa que fabricava equipamentos de ventilação hospitalar, que são essenciais para pacientes em situações críticas.
“A gente começou a ver que poderíamos melhorar muito os produtos que eram fabricados na época, em termos de montagem, uso e confiabilidade dos equipamentos. Tentamos conversar, mas não conseguimos. Então, eu decidi sair e convidei o Tatsuo [Suzuki] a sair também, alguns meses depois”, diz Ueda. Seis meses depois, o engenheiro Toru Kinjo se juntou ao negócio, que se chamaria Magnamed.
O risco assumido pelos três empreendedores valeu a pena: a Magnamed exporta seu equipamento medicinal , chamado OxyMag, para mais de 50 países. O empreendimento estima salvar um milhão de vidas por ano, apenas em equipamentos vendidos para o transporte de pacientes em situação crítica.
No ano passado, o negócio faturou 34 milhões de reais. Para este ano, espera crescer tal valor em 40%.
Começo de negócio
“A gente adquiriu muitos conhecimentos e experiência no nosso antigo trabalho, mas queríamos devolver o resultado dos nossos estudos para a sociedade, ao abrir um negócio próprio”, diz Ueda.
O grande objetivo da Magnamed era projetar um equipamento de ventilação de emergência que resolvesse os problemas que os engenheiros costumavam ver como funcionários: peso, complexidade, custo e duração da bateria, por exemplo.
O empreendimento passou seus primeiros seis meses baseada na garagem da mãe de Ueda, no ano de 2005. Os empreendedores desenharam seu plano de negócio e pensaram nos próximos passos – o que incluiu a ideia de participar de um processo de incubação.
No ano seguinte, o projeto foi selecionado para integrar o Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), baseado na Universidade de São Paulo. “Lá, começamos a realmente fazer a pesquisa e desenvolvimento do produto, colocando em prática nossa ideia de negócio.”
Foram dois anos de incubação, com pesquisas financiadas por entidades como CNPQ, Fapesp e Finep. O fundo de investimentos de capital semente Criatec, mantido com recursos do BNDES, fez outro investimento no negócio dos engenheiros: ao todo, cinco milhões de reais foram investidos na Magnamed naqueles anos.
O aporte do Criatec deu um novo fôlego ao negócio, que já se encontrava sem muitos recursos para continuar o desenvolvimento. No fim de 2008, o chamado OxyMag estava finalizado e a primeira fábrica na Magnamed foi montada, em Cotia (São Paulo).
Diferenciais de produto
O OxyMag é um ventilador pulmonar portátil, que ajuda médicos e paramédicos a agirem de forma mais rápida em momentos de emergência – por exemplo, ao transportar pacientes em ambulâncias.
“A gente olhou muito para o que existia em termos de equipamentos no mercado internacional, indo além do Brasil, já que a maioria dos nossos equipamentos já são importados mesmo. Queríamos entrar direto em terapia intensiva [UTI], mas vimos que havia uma concorrência forte. Então, focamos em um setor pouco atendido, que era o de ventiladores de transporte”, diz Ueda.
O primeiro entrave que os empreendedores perceberam foi a duração da bateria dos equipamentos vistos por aqui: elas duravam cerca de uma hora e meia, o que inviabilizava o uso do produto em viagens mais longas – por exemplo, para um hospital em outro estado. Além disso, quanto mais leve o equipamento, mais fácil seria o manuseio e transporte – os tradicionais pesam cinco quilos. Por isso, o OxyMag foi projetado com uma bateria de seis horas e um peso de três quilos.
Outro grande diferencial foi simplificar a operação do equipamento. “O profissional alemão, por exemplo, é muito treinado no uso de cada funcionalidade do equipamento. Pensamos em dar mais acessibilidade para profissionais brasileiros usarem o aparelho, apenas com as funções essenciais”, explica Ueda.
Os profissionais foram elencando as necessidades do aparelho e projetaram de acordo. O aparelho possui, por exemplo, uma tela com três ícones: neo-natal, pediátrico e adulto. Segundo o empreendedor, essa configuração mais simples facilitou muito a venda do OxyMag.
Exportações e expansões
O produto foi finalmente lançado no final de 2010, quando obteve a Certificação Europeia (CE) para equipamentos industriais. Com isso, o negócio exportou desde seu primeiro dia de operação.
“Desde 2007 já participávamos de feiras internacionais do setor, e formamos contatos nelas. Assim que conseguimos a CE, em 2010, participamos de licitações internacionais. Nesse mesmo ano, já conseguimos fornecer 250 OxyMags para a África do Sul”, explica Ueda.
A certificação pela Anvisa só viria no ano seguinte. Com o tempo, a Magnamed atendeu o mercado nacional e conseguiu ir além das ambulâncias e dos transportes interhospitalares: o negócio começou a participar de licitações públicas e firmar acordos com hospitais privados para fornecer equipamentos de ventilação também para tratamentos intrahospilatares críticos – transporte entre a UTI e a sala de raio-X, por exemplo.
“Como nosso know how já era forte na terapia intensiva, onde pensamos em entrar primeiro, vimos que podíamos fazer um produto com a tecnologia que tínhamos para essa área também”, diz Ueda. “Aos poucos, estamos oferecendo serviços agregados de manutenção e reposição de peças, o que reduz o custo ao longo da vida do equipamento.”
Ao todo, a Magnamed já vendeu cinco mil equipamentos em sua história de negócio. O ticket médio é de 25 mil reais por aparelho. Ueda estima que, apenas nas vendas para transportes, um milhão de vidas são salvas por ano: cada equipamento atende cerca de dois pacientes por dia.
Em 2011, 70% do volume de vendas da Magnamed era feito de exportações. Hoje, o quadro se reverteu: 70% das vendas estão no mercado brasileiro. A Magnamed, por exemplo, foi a fornecedora oficial dos equipamentos de ventilação de emergência das Olimpíadas do Rio de Janeiro de 2016.
Mesmo com tanto volume nacional, o empreendimento continua exportando para mais de 50 países, especialmente na América Latina e no Sudeste Asiático. “Em breve, devemos começar a trabalhar o mercado dos Estados Unidos, que é o maior do mundo em equipamentos médicos”, diz Ueda.
A expansão deve acompanhar um crescimento de faturamento: a expectativa é crescer 40% sobre o número de 2016, que foi de 34 milhões de reais.