A cozinheira Paola Carosella: empreendedora lidera restaurantes de sucesso, como o Arturito e o La Guapa (Endeavor e Sebrae/Divulgação)
Mariana Fonseca
Publicado em 7 de junho de 2017 às 06h00.
Última atualização em 7 de julho de 2017 às 10h36.
São Paulo – Paola Carosella é mais conhecida por ser a jurada do Masterchef, programa de gastronomia transmitido pela Band. Quem já viu a atração talvez já tenha ido a um dos restaurantes da autodenominada cozinheira: o Arturito e o La Guapa.
Quem vê tanto sucesso não imagina que o caminho até ele foi cheio de desafios, que envolveram infelicidade e um empréstimo milionário.
Em palestra durante o Day1, evento organizado pela Endeavor em parceria com o Sebrae que ocorreu nesta semana, Carosella falou sobre seu começo na cozinha e sua trajetória empreendedora – e o que aprendeu no meio desse caminho.
A cozinheira começou seu discurso revelando um dia decisivo na sua carreira – o seu “Day1”.
“Eu tinha 40 anos de idade – hoje, tenho 44. Estava no Brasil havia doze anos. Tinha uma filha de dois anos. Era dona de um restaurante quase falindo. Um relacionamento absolutamente falido também. E estava morando no cheque especial”, afirma a cozinheira.
Carosella pegou duas folhas de papel e colou na parede. Em uma delas, estava escrito hoje. Na outra, daqui a dois anos. Ela sentou no chão e ficou olhando para os dois cenários. Levantou do chão com quatro certezas.
“A primeira é que eu irei morrer, algum dia. A segunda certeza é que eu não sou feliz na vida que tenho, não é isso que eu quero. A terceira é que eu preciso fazer alguma coisa, porque ninguém irá mudar a vida por mim. E a última: eu sou cozinheira.”
A argentina Paola Carosella é filha de imigrantes italianos, e credita sua paixão pela cozinha à comida artesanal da sua avó, feita aos fins de semana.
“A forma como minha avó colocava a comida na mesa me parecia algo poderoso. Eu me apaixonei por essa coisa erótica da cozinha, de colocar a comida farta na mesa e todo mundo babar”, explica a cozinheira.
Durante os dias úteis, Carosella cozinhava para ocupar os dias, e esquecer daquele espaço em que era infeliz. A cozinha apaixonante dava lugar a uma cozinha do ofício.
“Eu sou filha de pais separados, e cresci morando com minha mãe em um apartamento. O cotidiano era bem diferente: não havia galinha, ou horta, ou alguém que cozinhasse. Tive uma mãe linda, forte, super empreendedora, que trabalhou e estudou a vida inteira – mas muito triste.”
“Minha infância e minha adolescência se deram nesse espaço, de muita solidão. E o que me resgatava era cozinhar. Eu voltava da escola e cozinhava, copiando minha vó ou as cozinheiras da televisão. Com poucos ingredientes, eu fazia de tudo. Comecei a preparar o jantar para esperar minha mãe voltar do trabalho.”
Carosella começou na cozinha como “uma estagiária invisível”; passou a “cozinheira invisível”; virou uma “cozinheira mais ou menos visível”; subiu para “sous chef” [segundo em comando na cozinha]; e, por fim, foi trabalhar em restaurantes estrelados da Europa e dos Estados Unidos.
Depois de dez anos trabalhando para outras pessoas, ela decidiu que tinha de abrir seu próprio restaurante. Tinha uma pequena herança, após perder muito cedo sua mãe e seu pai.
O ano era 2001, e Carosella estava havia um ano no Brasil, trabalhando no restaurante Figueira Rubayat. Resolveu investir sua poupança no país, de 500 mil reais, e tirou um visto de investidora.
Seu primeiro restaurante, chamado Julia, foi bem sucedido na cozinha – mas fechou por conta de uma sociedade que não funcionava mais. “A gente talvez até pudesse se resolver, mas continuaríamos no mesmo lugar. Não iríamos para frente. E eu queria ir além.”
No próximo restaurante, chamado Arturito, Carosella diz que não escolheu um sócio errado: escolheu sete deles.
“Ótimas pessoas, mas com ideias diferentes. Eu tinha muito claro o que eu queria fazer: abrir um restaurante generoso, com um impacto na sociedade muito maior do que ter clientes e um bom ticket médio. Queria ter pessoas felizes, um espaço branco e aberto, que soltasse raízes e tivesse hortas. Mas o que eu tinha era uma espécie de boate: um lugar todo preto, com música longe, caríssimo e com 14 mestres de cozinha. Cafona.”
Carosella não acreditava na proposta que tinha em mãos, com todo seu dinheiro investido, mas o restaurante faturava. Assim, não chegava a um acordo com os outros sete sócios.
Mas algo mudou na sua vida: virou mãe. “Aí, eu soltei todas as minhas unhas e falei que precisávamos mudar. Não sei se estava sentindo uma tendência de mercado, mas tinha certeza absoluta de que o Brasil iria mudar e que a gastronomia, no modelo de toda sua parafernália, não iria mais funcionar.”
O ano era 2012: voltamos ao Day1 de Paola, em que ela olhou para as duas folhas de papel coladas na parede.
“Naquele dia, eu entendi que o mais valioso que existia na empresa era eu. Pode parecer arrogante, mas não é: eu que cozinhava, que fazia as pessoas chegarem, e eu tinha que dar valor ao meu valor”, conta a cozinheira.
No dia seguinte, Carosella ligou para o banco, viu quanto dinheiro tinha disponível e pegou um empréstimo de 2 milhões de reais. A garantia de pagar a dívida era apenas sua própria dedicação.
Com o dinheiro, conseguiu chegar a um acordo com os outros sócios e se tornou a única dona do Arturito. O restaurante, porém, já sofria com queda no número de clientes – e 40 funcionários ansiosos por melhoras.
“Fiz a única coisa que sabia fazer: trabalhar. Virei uma espécie de polvo no restaurante – em qualquer local dele, eu estava lá, desde desentupir a privada do banheiro até ir à junta comercial. Fiz tudo que era necessário para recompor a empresa.”
Com o tempo, a cozinheira sentiu falta de cozinhar. Decidiu que às sextas-feiras seria a chef, enquanto nos outros dias seria a empresária. O menu de Carosella começou a atrair executivos, e com isso o Arturito começou a florescer e se encher novamente de clientes.
Seu outro restaurante surgiu desse menu de sexta-feira: a cozinheira ofereceu empanadas como aperitivo, e foi um sucesso. O ícone argentino entrou no menu fixo do Arturito, e Carosella decidiu elencar todos os sabores que poderia fazer, logo ao chegar em casa.
Em 2014, Carosella tirou o projeto do papel e se associou ao sócio Benny Goldenberg para criar o café de empanadas argentinas La Guapa.
“As únicas certezas da vida se aprendem no inferno. Eu tinha errado o suficiente para saber reconhecer um sócio que tivesse um jeito que me completasse e que crescêssemos juntos. Eu tenho muito orgulho de ser empresária, da maneira como Benny e eu fazemos negócios”, conta a cozinheira.
O Arturito está cheio, de clientes e funcionários. O La Guapa vale 40 vezes mais do que seu investimento inicial. Todos os empréstimos que Carosella tomou foram pagos.
“Hoje, eu tenho a certeza de que eu consigo traçar o destino da minha vida. Tenho uma riqueza que não vem do dinheiro, e sim de ter olhado para trás e saber que os sonhos que eu tive já não têm limites.”
Veja o vídeo completo da apresentação de Paola Carosella no Day1.