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Vantagem da China em calçados tem participação brasileira

Empresas chinesas contrataram técnicos gaúchos para apreender o know-how da área de calçados

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h40.

O domínio da China no setor de calçados estima-se que os chineses confeccionem de 7 a 8 bilhões de pares por ano, mais da metade do total mundial contou com uma ajuda brasileira, mais precisamente dos gaúchos. Segundo Heitor Klein, diretor do Programa Calçado do Brasil, da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), a ofensiva do gigante asiático foi muito bem estudada e incluiu a "importação" pelos chineses de mais de 200 técnicos brasileiros do Vale dos Sinos, pólo calçadista gaúcho, no período de 1992 a 1998. "Eles foram ensinar a tecnologia nacional de acabamento e curtimento do couro com tanino, da qual o Brasil tinha praticamente monopólio", afirma Klein.

Esse aperfeiçoamento técnico foi importante para a escalada da exportação e contribuiu para o declínio do desempenho da indústria brasileira desde 1993 depois de atingir o pico de 1,846 bilhão de dólares naquele ano, as vendas externas do setor caíram seguidamente e só no ano passado voltaram ao mesmo patamar. "Exportamos 200 000 empregos para os chineses, e empregos da velha economia, aquela que emprega quem mais precisa hoje no país", argumenta Klein. Parte da diferença de competitividade deve ser atribuída à mão-de-obra mais barata e às políticas cambiais distintas dos dois países. A China mantém sua moeda desvalorizada como ferramenta de incentivo às exportações.

O resultado é que, hoje, os chineses exportam calçados por um preço médio 40% inferior ao do produto brasileiro. As vendas da China somam 4 bilhões de pares por ano, enquanto as do Brasil ficaram em 212 milhões de pares em 2004.

Pequenas empresas em risco

Segundo o diretor da Abicalçados, somente as grandes empresas, melhor estruturadas, encontrarão meios de cortar custos e manter os negócios andando. Os dados da Abicalçados indicam que cerca de 30 empresas detêm aproximadamente 80% das exportações. O grande risco está nas empresas que exportam até 1 milhão de dólares por ano. Essas, de acordo com Klein, foram as que mais cresceram nos últimos anos, e são também as mais vulneráveis. "Temos no país mais de 1 000 empresas cadastradas como exportadoras de calçados, com diferentes tamanhos e níveis de tecnologia", diz Klein. "Dessas, avaliamos que apenas umas 50 tenham gordurinhas para queimar. As demais serão atingidas em cheio."

As grandes empresas também contam com carteiras de compradores suficientemente consolidadas para aceitar repasses de 8 a 12% em alguns preços, para compensar a valorização do real. "Mas se esse percentual chegar aos 20%, o comprador vai começar a olhar para a China e até para a Índia, atrás de alternativas, pois a qualidade da indústria nesses países é boa, não tem tanto mistério nessa produção". Klein explica que muitas empresas optam por exportar com prejuízo, apenas para manter os clientes e esperar por uma melhoria nas condições cambiais. "Mas quanto tempo eles podem esperar? Não vão conseguir manter o pessoal que foi treinado, que levou tempo para aprender e que, se for demitido e precisar contratar depois, terá de treinar tudo de novo", diz.

Democrata segura preço

A Democrata, uma das maiores fabricantes de calçados masculinos do país, sediada em Franca (SP), é um exemplo de empresa que está mantendo seus preços em níveis acertados anteriormente com os importadores, mesmo às custas de reduzir sensivelmente a lucratividade. "É o jeito para manter o cliente, porque os preços são acertados para a temporada e muitas vezes nem é por escrito, é verbal", diz Marcelo Paludetto, gerente comercial da Democrata." Mas a regra no mercado é que os preços, uma vez negociados, não podem ser alterados."

O mercado dos Estados Unidos, o maior do mundo, abre cada vez mais espaço para o produto chinês. Na Europa a situação também está se complicando: com o fim do sistema de cotas, em dezembro passado, é cada vez mais ostensiva a ofensiva chinesa. De acordo com Paludetto, a saída que a Democrata encontrou para enfrentar a concorrência é investir no aperfeiçoamento de seu produto. Até pouco tempo atrás, a empresa tinha como carro-chefe a fabricação de calçados que seguiriam para os grandes mercados com marcas de terceiros. "Percebemos que não podíamos bater de frente com os chineses porque a relação de custo deles é muito baixa", diz Paludetto. "Se não dá para ganhar no preço, então o negócio é optar por outro nível de produção."

Investimento em sofisticação

O contra-ataque da Democrata se dá em duas frentes. A primeira, passando a vender diretamente ao distribuidor com marca própria, tanto internamente quanto na exportação. A segunda foi desenvolver uma nova linha de produtos para exportação, mais sofisticada e com alto índice de mão-de-obra artesanal. "Nesse nicho de mercado, sem os altos custos da mão-de-obra italiana, podemos oferecer um produto de qualidade e preço acessível", afirma Paludetto. "Você opera com um produto diferenciado e com isso consegue driblar a questão dos preços."

Com essa estratégia, que a Democrata pretende manter e aperfeiçoar para os próximos anos, Paludetto diz que a empresa conseguiu recuperar espaço no mercado norte-americano. Nos primeiros quatro meses deste ano aumentou em 15% o volume de vendas para os Estados Unidos. E na Europa, onde a empresa não trabalhava, as vendas também cresceram. "Agora só falta a questão do câmbio ser equacionada, pois há um limite para o valor a que o produto made in Brazil pode alcançar lá fora", completa.

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