Durante anos, o McDonald's e o Burger King resistiram às tentativas de regular a distribuição de brinquedos de plástico, que começaram a proliferar na década de 1980 (Burger King/Reprodução)
Da Redação
Publicado em 4 de janeiro de 2020 às 08h00.
Última atualização em 6 de maio de 2020 às 12h40.
Na cena culminante de "Toy Story 3", Woody, Buzz Lightyear e o resto da turma escapam por pouco da morte quando uma garra controlada remotamente os retira de um incinerador pouco antes que as chamas os envolvam.
Agora, o Burger King resolveu promover um desfecho alternativo – coletar, separar e triturar centenas de milhares de brinquedos minúsculos, para derretê-los em uma fábrica no norte da Inglaterra.
Para qualquer um que se lembre bem de seus bonequinhos da infância, isso pode soar como uma carnificina – mais para o "Inferno" de Dante do que para a Disney Pixar. Mas esse pretende ser um grande gesto ambiental. Confrontado com a crescente preocupação do público com a proliferação do plástico, o Burger King prometeu parar de dar brinquedos junto com as refeições infantis no Reino Unido e incentiva os clientes a depositar os antigos em caixas de coleta nos estabelecimentos locais.
Em dezembro, a empresa de reciclagem Pentatonic vai derreter esses bonecos órfãos e transformar o material em equipamentos de playground e bandejas reutilizáveis. O Burger King planeja eliminar os brinquedos não biodegradáveis de todos os seus restaurantes em todo o mundo até 2025.
"Isso pode ser uma pena para uma pequena minoria de pessoas, mas é muito claro que, em longo prazo, as pessoas acreditam que estamos fazendo a coisa certa", disse Alasdair Murdoch, executivo-chefe do Burger King no Reino Unido.
Durante décadas, os brinquedos de redes de fast-food funcionaram como ferramentas de marketing projetadas para fazer as crianças comerem batatas fritas e nuggets de frango. Políticos e defensores da saúde pública nos Estados Unidos já tentaram bani-los várias vezes, argumentando que o marketing de fast-food destinado a crianças contribui para a obesidade.
Essas preocupações com a saúde nunca influenciaram as principais empresas de fast-food, mas uma petição britânica argumentando que os brinquedos "prejudicam os animais e poluem o mar" causou um efeito mais forte. Ela é parte de uma reação pública crescente contra objetos não são embalagens recicláveis, artigos plásticos descartáveis, como canudos e copos, e uma miríade de outros objetos plásticos que se acumulam em aterros sanitários, sujam as praias e boiam nos oceanos.
O Burger King não é a única cadeia planejando um futuro sem brinquedos. Em 2018, o McDonald's estabeleceu uma força-tarefa para explorar "maneiras de diminuir o impacto dos brinquedos", de acordo com Elaine Strunk, diretora de sustentabilidade da cadeia.
Com base nas recomendações da força-tarefa, o McDonald's começou a reduzir a distribuição de brinquedos de plástico no Reino Unido e em outros mercados fora dos Estados Unidos, embora não tenha se comprometido a interrompê-los totalmente. Em outubro, o McDonald's ofereceu aos clientes britânicos que compram Happy Meals, ou McLanche Feliz, a escolha entre um brinquedo e um saquinho de frutas.
No ano que vem, as crianças do Reino Unido poderão escolher entre um brinquedo e um livro. No passado, o McDonald's distribuiu livros de Roald Dahl, além de histórias sobre dinossauros da autora inglesa Cressida Cowell.
"Estamos em uma jornada em todas as nossas categorias e além, para então desenvolvermos pegadas ambientais mais sustentáveis. É sempre assim que analisamos nossas decisões", disse Strunk.
Especialistas em meio ambiente dizem, porém, que não está claro se eliminar os brinquedos plásticos seria de grande ajuda nos esforços da indústria do fast-food de reduzir esse material, e muito menos se seria uma contribuição mais ampla contra a poluição.
O Burger King disse que acabar com a distribuição dos brinquedos na Grã-Bretanha reduziria sua pegada anual de plástico em mais de 300 toneladas. Mas o contexto desse número não é claro: o Burger King não calculou a quantidade total de plástico que usa em seus mercados globais, de acordo com seu diretor de marketing, Fernando Machado. E, em alguns restaurantes nos Estados Unidos, a cadeia continua a servir bebidas em copos de isopor, mesmo que o McDonald's e outras cadeias tenham proibido os produtos ambientalmente prejudiciais.
Funcionários do McDonald's disseram que a empresa ainda estava planejando uma maneira eficaz de calcular sua pegada de plástico global e se recusaram a revelar o volume de brinquedos que ela distribui anualmente.
"Se você é uma empresa como o Burger King, cuja embalagem é vista como uma grande parte do problema, não faz sentido eliminar os brinquedos, mas não a embalagem", disse Conrad MacKerron, do As You Sow, um grupo de defesa de acionistas que quer que as grandes empresas de fast-food reduzam o uso do plástico. "A empresa parece estar tentando dar certa prioridade a isso, algo que não acho que seja necessariamente merecido."
Machado disse que o Burger King planeja eliminar copos de isopor em breve. E nos próximos meses, disse ele, a empresa publicará um site detalhando as medidas tomadas para reduzir a poluição.
"Não estamos aqui parados dizendo que somos perfeitos", disse Murdoch, chefe do Burger King no Reino Unido. "Estamos em uma jornada e temos um longo caminho a percorrer, mas estamos nos dedicando a isso."
Durante anos, o McDonald's e o Burger King resistiram às tentativas de regular a distribuição de brinquedos de plástico, que começaram a proliferar na década de 1980. Eles provaram ser poderosas ferramentas de mercado. Um estudo realizado por pesquisadores do Dartmouth College mostrou que o conhecimento dos brinquedos de fast-food entre crianças pequenas "estava associado a uma maior frequência de refeições no McDonald's".
"Eles são uma parte muito importante do modelo de negócios das empresas que os utilizam", disse Joel Bakan, autor de "Childhood Under Siege", um livro de 2011 sobre o marketing voltado a crianças. "Tanto a embalagem do McLanche Feliz quanto a adição do brinquedo foram altamente eficazes em atrair os pequenos."
Agora, as cadeias de fast-food estão ficando cada vez mais focadas em ferramentas de marketing digital, como dar às crianças códigos que podem ser escaneados para desbloquear jogos em aplicativos da marca, tornando os bonequinhos de plástico menos importantes para atrair clientes mais jovens.
"Talvez isso não seja mais tão importante para elas", disse Sara Ribakove, funcionária de políticas do Centro de Ciência no Interesse Público, que fez campanha contra brinquedos de fast-food. "Há uma forte mudança no ambiente digital e na forma como estamos vendo o marketing. Tornou-se algo muito mais personalizado. Está chegando a todos de uma maneira diferente."
Nos próximos anos, o Burger King substituirá gradualmente os brinquedos de plástico por alternativas digitais, disseram os executivos da empresa, embora a cadeia possa também desenvolver brinquedos feitos de materiais biodegradáveis.
Algumas outras cadeias de fast-food se desfizeram dos brinquedos por razões comerciais, não ambientais. Em 2013, a Taco Bell anunciou que as refeições infantis não fariam parte de sua "estratégia de marca de longo prazo".
Mas o maior rival do McDonald's e do Burger King, o Wendy's, continua a oferecer as figuras de plástico. Recentemente, a cadeia lançou uma linha de brinquedos Transformers. Um porta-voz do Wendy's não respondeu aos pedidos de comentário.
O McDonald's vem experimentando alternativas em uma série de mercados, incluindo a Alemanha e a França, além do Reino Unido. No Japão, permite que seus clientes devolvam os brinquedos para que a empresa possa convertê-los em bandejas, um projeto semelhante à iniciativa do Burger King na Grã-Bretanha. Nos próximos anos, disseram líderes do McDonald's, a empresa espera distribuir menos brinquedos de plástico, à medida que livros e outras opções se tornarem mais populares.
"É tudo uma questão de escolha", disse Kandice McLeod, funcionária do McDonald's que supervisiona os brindes do McLanche Feliz. "Nossos clientes querem saber se podem escolher o que vão receber."
Nos Estados Unidos, no entanto, um grande segmento de consumidores continua a apoiar amplamente os brinquedos de plástico: as crianças.
Em uma noite de domingo recente em um McDonald's em Nova York, Amber Smith, de oito anos, brincava calmamente com seu brinquedinho do McLanche Feliz. Para ela, eles são sua parte favorita.
"Todos os brinquedos, na minha opinião, são superlegais. Não sou exigente."
Perguntada sobre a perspectiva do fim dos brindes, Amber cerrou os punhos. "Gosto da comida também. Mas, sem os brinquedos eu ficaria muito brava", disse ela.