PSDB: operador recebeu US$ 952 mil da Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa
A Odebrecht, segundo a investigação, transferiu 275 mil euros, em 2007, ao operador do PSDB e ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de fevereiro de 2019 às 18h15.
São Paulo - A força-tarefa da Operação Lava Jato identificou que as empreiteiras Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa repassaram US$ 952 mil ao ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza em 2008. A Odebrecht, segundo a investigação, transferiu 275 mil euros, em 2007, ao operador do PSDB .
Vieira de Souza foi preso nesta terça, 19, na Operação Ad Infinitum, fase 60 da Lava Jato. O ex-ministro Aloysio Nunes Ferreira (Relações Exteriores/Governo Temer), presidente da Investe São Paulo do governo João Doria, foi alvo de buscas.
"Paulo Vieira de Souza auferiu, nos anos de 2007 e 2008, em suas contas na Suíça mantidas em nome do Groupe Nantes, valores remetidos dissimuladamente pelas três citadas empreiteiras brasileiras, também investigadas no âmbito da Operação Lava Jato", aponta a Lava Jato.
Os procuradores afirmam que a Odebrecht repassou ao operador do PSDB um total de 275.776,04 euros em 26 de novembro de 2007, por intermédio de conta mantida em nome da offshore Klienfeld Services LTD.
No ano seguinte, em 25 de março de 2008, por meio da offshore Dessarollo Lanzarote, o Groupe Nantes recebeu US$ 309.258,00. Em 19 de dezembro de 2008, por intermédio da offshore Shearwater Overseas, ligada à Andrade Gutierrez, Vieira de Souza foi beneficiário de US$ 643.774,00.
"Em 24 de dezembro de 2007, portanto logo após Paulo Vieira de Souza ter recebido da Odebrecht EUR 275.776,04, cuja transferência aconteceu em 26 de novembro de 2007, um dos responsáveis por sua conta mantida em nome do Grupo Nantes na Suíça solicitou a representantes do Banco a entrega de cartão de crédito no Hotel Majestic Barcelona, na Espanha, para Aloysio Nunes Ferreira Filho", diz a investigação.
A Procuradoria afirma que Vieira de Souza manteve R$ 131 milhões em quatro contas no banco Bordier & CIE, de Genebra, em nome da offshore panamenha Groupe Nantes SA, da qual o operador é beneficiário econômico e controlador. As contas foram abertas em 2007 e mantidas até 2017.
Os investigadores apontam que as contas "foram utilizadas para viabilizar diversas operações de lavagem de dinheiro". Segundo a Lava Jato, "Paulo Vieira de Souza não apenas utilizou tais contas para realizar a partir do ano de 2010 as múltiplas operações lavagem de dinheiro que resultaram na disponibilização de recursos em espécie para a Odebrecht no Brasil".
Os procuradores afirmam que o operador usou as contas para, entre 2007 e 2010, "receber no exterior, em seu favor e de integrantes do PSDB, valores ilícitos transferidos pela própria Odebrecht e também pelas empreiteiras Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez."
O Ministério Público Federal afirma que o ex-diretor da Dersa atuou em uma das camadas do sistema de lavagem de dinheiro da Odebrecht.
Os investigadores relataram à Justiça que Paulo Vieira de Souza disponibilizou, a partir do segundo semestre de 2010, R$ 100 milhões em espécie ao operador financeiro Adir Assad, no Brasil.
Assad entregou os valores ao Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, aos cuidados do doleiro Álvaro José Novis - que fazia pagamentos de propinas, a mando da empresa, para vários agentes públicos e políticos, inclusive da Petrobrás.
Em contrapartida, relata a investigação, a Odebrecht repassou valores, por meio de contas em nome de offshores ligadas ao Setor de Operações Estruturadas da empreiteira, ao operador Rodrigo Tacla Duran.
"Esse, por sua vez, repassou o dinheiro, ainda no exterior, mediante a retenção de comissões, diretamente a Paulo Vieira de Souza, ou, por vezes, a doleiros chineses, que se encarregavam de remeter os valores, também por meio de instituições bancárias estrangeiras, ao representado (Paulo Vieira de Souza)", narrou a Lava Jato.
Vieira de Souza já é réu de duas ações penais da Lava Jato em São Paulo. No processo que trata de desvios de R$ 7,7 milhões em obras de reassentamento do Rodoanel, Aloysio Nunes foi arrolado como testemunha de defesa de Tatiana, filha de Paulo, também ré na ação.
No dia 13 de fevereiro, o ministro do Supremo Gilmar Mendes atendeu um pedido da defesa de Paulo Vieira de Souza e adiou o fim deste processo.
Ligado a governos do PSDB no Estado, ele foi diretor da Desenvolvimento Rodoviário S.A (Dersa), estatal paulista. Suas relações com tucanos é muito antiga. Ele desfruta da fama de que detém informações privilegiadas.
Certa vez, na campanha presidencial em 2010, Vieira de Souza protagonizou episódio emblemático. Aparentemente "ignorado" pelo então candidato do PSDB José Serra, que em debate na TV Bandeirantes com sua oponente Dilma Rousseff (PT) disse "não se lembrar" do ex-diretor da Dersa, ele declarou à jornalista Andrea Michael. "Não se larga um líder ferido na estrada a troco de nada. Não cometam esse erro."
O recado de Vieira de Souza soou como um aviso ao ninho tucano sobre o alcance e o peso que suas informações podem ter.
Antes de ser preso nesta terça, Vieira de Souza estava em recolhimento domiciliar integral e monitoramento por meio de tornozeleira eletrônica. A decisão havia sido tomada pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) em setembro de 2018.
A Operação Ad Infinitum foi deflagrada por ordem da juíza Gabriela Hardt, da 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba. A ação mira um esquema com 'diversas camadas de lavagem' envolvendo o operador do PSDB.
Outro lado
A reportagem fez contato com a assessoria de Paulo Vieira de Souza e deixou espaço aberto para manifestação.
O ex-ministro Aloysio Nunes Ferreira disse que ainda "não teve acesso às informações" da Operação Ad Infinitum, a fase 60 da Lava Jato. Segundo ele, o delegado da Polícia Federal que conduziu as buscas em sua residência nesta terça "foi muito cortês", mas não revelou a ele os motivos da diligência. "O inquérito está em segredo, eu estou buscando saber o que há."
Aloysio negou ter recebido cartão de crédito da conta do operador do PSDB Paulo Vieira de Souza, preso na Ad Infinitum.
A Odebrecht se manifestou da seguinte maneira: "A Odebrecht tem colaborado de forma eficaz com as autoridades em busca do pleno esclarecimento dos fatos narrados pela empresa e seus ex-executivos. A Odebrecht já usa as mais recomendadas normas de conformidade em seus processos internos e segue comprometida com uma atuação ética, íntegra e transparente."
A Camargo Corrêa, por sua vez, divulgou a seguinte declaração: "A Construtora Camargo Corrêa foi a primeira empresa de seu setor a firmar um acordo de leniência e, desde então, vem colaborando continuamente com as autoridades."
A Andrade Gutierrez informou que "apoia toda iniciativa de combate à corrupção, e que visa a esclarecer fatos ocorridos no passado". "A companhia assumiu esse compromisso público ao pedir desculpas em um manifesto veiculado nos principais jornais do país e segue colaborando com as investigações em curso dentro do acordo de leniência firmado com o Ministério Público Federal. A empresa incorporou diferentes iniciativas nas suas operações para garantir a lisura e a transparência de suas relações comerciais, seja com clientes ou fornecedores, e afirma que tudo aquilo que não seguir rígidos padrões éticos será imediatamente rechaçado pela companhia."