Para presidente da Eletrobras, estatal não conseguia competir
Ferreira Júnior vê a decisão de privatizar a Eletrobras como reconhecimento de que o país tem uma grande companhia
Estadão Conteúdo
Publicado em 23 de agosto de 2017 às 11h03.
O presidente da Eletrobras , Wilson Ferreira Júnior, afirma que a decisão do governo de privatizar a estatal não muda o plano de reestruturação em curso na companhia, especialmente em relação à venda de ativos. Há um ano no comando de uma das maiores empresas de energia elétrica da América Latina, ele diz que a medida é uma prioridade para reduzir a alavancagem do grupo, cuja dívida líquida é de R$ 23 bilhões. Para Ferreira Júnior, a decisão de privatizar a Eletrobrás é o reconhecimento de que o País tem uma grande companhia, mas que hoje não tem condições de competir com as concorrentes estrangeiras. A seguir trechos da entrevista:
A Eletrobrás vinha conduzindo um plano de venda de ativos. Isso continua?
Sim. Essa medida faz parte da reestruturação da empresa para a qual fui contratado. Hoje temos uma dívida líquida de R$ 23 bilhões. Quando cheguei aqui o índice de alavancagem (relação entre dívida e geração de caixa) era de 9 vezes. E hoje está em 4,7 vezes. O objetivo é chegar a menos de 4 vezes no fim deste ano e próximo de 3 vezes em 2018. Para isso, além das melhorias operacionais que vão economizar R$ 1,8 bilhão por ano, é preciso vender ativo. Temos 74 Sociedades de Propósito Específico (SPEs, que são participações em projetos de geração e transmissão) e a privatização das distribuidoras. Isso vai trazer caixa para a empresa e permitir quitar dívidas mais caras. O plano vai continuar exatamente igual a antes, temos metas, temos prazos e estamos seguindo todos eles.
No caso das SPEs, isso não atrapalha a privatização?
Se eu pedir um empréstimo hoje, só me cobram caro. Uma empresa muito alavancada não consegue ter vantagem competitiva para se expandir porque o mercado financeiro percebe, coloca um risco maior e cobra mais caro, ou aumenta o prazo, ou as duas coisas. A Eletrobrás chegou a tomar recursos a CDI mais 5% ao ano em prazo de 24 meses. Não existe nenhum negócio na nossa área que tenha essa rentabilidade. É uma prioridade vender essas participações. É um passo para trás e dois para frente. Ao mesmo tempo que estou fazendo essas vendas estou concluindo obras, que vão adicionar valor à empresa.
Que obras serão concluídas?
Estamos concluindo as usinas de Sinop e São Manoel e uma linha de transmissão de Belo Monte. Para ter ideia, em 30 de junho, a empresa tinha 47 mil megawatts (MW) instalados. Vamos vender nesse conjunto de SPEs algo próximo a 1 mil megawatts, que são participações minoritárias. E vamos concluir 3.500 MW até o fim do ano que vem. É um passo atrás e dois ou três a frente. Por isso temos de fazer as reestruturações.
A privatização é para quando?
Não há ainda essa decisão. O que temos é uma decisão do poder concedente que reconhece que vamos melhorar a companhia e, ainda assim, continuaremos com as amarras das estatais, que é o grande problema dela. Levo 28 dias para consolidar um balanço mensal. E ainda temos a Lei 8.666, de licitações. Hoje, nem todos os fornecedores querem participar das disputas e quem participa nem sempre gosta do resultado e pode entrar na Justiça para reivindicar alguma coisa. Veja bem: a empresa tem anuênio (adicional por tempo de serviço). Isso significa 1% de custo de pessoal a mais por ano. Isso tira toda a competitividade da empresa diante dos grandes grupos estrangeiros no nosso quintal. A decisão quando foi tomada reconhece isso. Temos uma empresa de grande porte que num momento de economia aberta não consegue competir com as demais. O objetivo é eliminar as restrições para que ela possa competir. E, nesse processo, o governo vai se beneficiar.
O sr. participou da decisão?
Todo mês tenho uma interlocução com o ministro (de Minas e Energia) dando o andamento do programa de reestruturação. Nesse período tenho colocado as dificuldades que a empresa tem. E sempre aparece isso (a questão da privatização).
O que foi possível fazer nesse tempo à frente da empresa?
Fui chamado para conduzir um processo de recuperação da Eletrobrás. Quando comecei ela valia R$ 8 bilhões (ontem estava em R$ 28 bilhões) e tinha um conjunto de pendências para resolver. Trocamos 70% dos administradores de todas as empresas. Isso inclui o presidente, conselheiros e diretores. Todas elas tiveram troca de presidentes. A reestruturação na área gerencial foi reduzida de 2.200 posições para 1.500. Também adotamos a implementação de um sistema único de gestão (ERT) para o grupo Eletrobrás inteiro e um centro de serviços compartilhados para ter maior eficiência corporativa. A Eletrobrás tinha mais de 23 mil funcionários agora tem 17 mil.