O CHERY QQ: esperança da montadora chinesa para voltar aos melhores anos no Brasil / Divulgação (Chery/Divulgação)
Da Redação
Publicado em 3 de abril de 2017 às 12h54.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h58.
Michele Loureiro
A montadora chinesa Chery começou a vender sábado o carro zero quilômetro mais barato vendido no Brasil. O compacto QQ versão Smile, fabricado em solo nacional, custará 25.990 reais e é uma das apostas da companhia para tentar reviver bons momentos por aqui. Segundo Luis Curi, vice presidente-executivo da Chery no Brasil, “agora não é hora de pensar em margem de lucro, é hora de voltar a pensar na briga pelo mercado”.
Segundo Curi, o modelo é uma volta às origens. “Fizemos pesquisas e descobrimos que os consumidores conhecem a marca QQ tanto quanto ou até mais que a marca Chery. Esse modelo foi um grande sucesso de vendas em 2011, quando tivemos nosso melhor momento no país”, diz. A versão Smile possui motor flex 1.0 de três ciclindros e não é completinha, como dizem os chineses. O modelo não possui ar-condicionado, nem vidros elétricos nas portas traseiras. “Quem quer a versão completa pagará 29 990 reais”, diz o executivo. A ideia é que o modelo subcompacto seja uma alternativa para os consumidores que acabaram migrando para o mercado de seminovos. “Queremos resgatar esse público oferecendo preço acessível, garantia de três anos e todas as vantagens de um carro zero quilômetro, que não requer manutenção”, afirma.
De 2012, no pico das vendas de veículos zero quilômetro, para 2016, a renda mensal dos consumidores que compraram carros novos subiu de 5.200 reais para 7.200 reais, conforme relatam fontes do mercado. Ou seja, o público de menor renda deixou de comprar ou migrou para os modelos usados.
Resiliência chinesa
Mas afinal, como vender um carro zero quilômetro por menos de 30.000 no país que mais cobra impostos sobre veículos no mundo? Curi explica com um conjunto de fatores. “A verdade é que os chineses estão sendo compreensivos para que a gente fique nesse patamar. Temos uma estrutura enxuta no Brasil e também estamos mantendo um controle rígido de custos e de despesas indiretas”, diz Curi.
O QQ Smile chega para competir com modelos como Fiat Mobi e Volswagen up!, que não são encontrados por menos de 30.000 reais. A previsão da Chery é que o modelo venda entre 3.000 e 4.000 unidades nesse ano.
Pode até parecer pouco, mas isso já seria mais do que a montadora vendeu no ano passado inteiro. Para se ter uma ideia do drama da Chery – e da paciência dos chineses – basta olhar os números. Dos 30.000 carros emplacados em 2011, o número caiu para 5.300 em 2015 e 2.200 em 2016, segundo a montadora.
Não se pode acusar a marca de falta de vontade de investir no Brasil. A Chery é a única chinesa com fábrica no país – a Jac Motors anunciou uma unidade na Bahia, mas nunca inaugurou. A fábrica de Jacareí (SP) foi anunciada em 2011 e demandou investimento de 400 milhões de reais para uma capacidade anual para 50.000 carros. Mas aí começaram os problemas. As restrições às importações estipuladas pelo programa do governo federal Inovar-Auto, que taxavam os veículos importados na tentativa de proteger a indústria local, foram anunciadas logo na sequência. “As regras demoraram quase um ano para serem colocadas em prática. Foi um período de incerteza que derrubou nossas vendas”, diz Curi.
Depois, o auge do crescimento brasileiro já havia passado. Com a crise econômica, que derrubou o mercado de quase 4 milhões de unidades em 2012 para 2 milhões de carros em 2016 ficou difícil não cair. Mas na Chery, o tombo foi maior. “Além de todas as dificuldades econômicas, nós enfrentamos a questão de ser uma empresa chinesa que ainda precisa provar suas qualidades”, diz Curi.
O jeito foi parar a fábrica. De junho de 2016 a janeiro de 2017 a Chery não fabricou veículos em Jacareí. “A empresa tentou se estabelecer no Brasil no momento mais difícil que o setor automotivo já viveu. As negociações de demissões afastaram os funcionários e o tempo foi aproveitado para rever o portfólio da marca no Brasil”, diz Guirá Borba de Godoy Guimarães, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região “Não vou dizer que foi fácil. Não teve demissão em massa, mas perdemos colegas e ficamos inseguros. Agora, o pior parece ter passado”, afirma.
Essa também é a impressão de Curi. Um outro modelo deve se unir ao QQ na tentativa de alavancar as vendas da montadora. O Tiggo 2 é um utilitário esportivo na faixa dos 60.000 reais e começa a ser fabricado no país no segundo semestre. “Esse segmento foi menos abalado que o de entrada e acredito que as vendas serão expressivas”, diz Curi. A empresa estuda até contratar mais funcionários – hoje são 400.
O que vem por aí
A Chery projeta vender 10.000 veículos neste ano, um terço de seu melhor momento. A projeção ainda é otimista levando em conta que o mercado não apresentou a melhora esperada, ao menos por enquanto. No primeiro bimestre de 2017, as vendas caíram 0,9% em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo dados da Anfavea, associação que representa as montadoras.
Além disso, a rede de concessionárias da Chery é um desafio à parte. Eram 108 lojas em 27 estados brasileiros. Agora, são apenas 27 concessionários no país. A montadora chegou a negociar uma parceria comercial com o Grupo Caoa, que já representa a Hyundai, para a abertura de uma série de concessionárias no país.
A aposta acabou virando uma empresa especializada em expansão de rede, que começa em abril a buscar interessados em investir em concessionárias da marca. “É um trabalho delicado tendo em vista a situação atual do mercado de veículos. Este é um investimento de longo prazo”, admite Curi.
Pelo menos, o mais importante, a montadora parece ter: apoio da matriz. “Faço informes diários para os chineses sobre a conjuntura brasileira. Se eu fico mais de uma semana sem passar informações acabo me perdendo, pois são muitas movimentações. Eles continuam apreensivos, mas confiantes”, afirma Curi. Ele já ensaia o discurso sobre a terceirização e as novas regras do Inovar-Auto, que acaba este ano, e ainda não foram divulgadas. Dinheiro, ao menos por enquanto, não vai faltar.