Negócios

No aniversário de dez anos, o que a Ebanx quer para continuar crescendo?

Primeiro unicórnio da região Sul cresceu, tem nova presidente no Brasil e continua com foco em conectar empresas internacionais à América Latina - sem descartar IPO para concretizar novos planos

Bellizia: Atenção e foco no mercado latino-americano para continuar crescendo (Tainá Bernard/Divulgação)

Bellizia: Atenção e foco no mercado latino-americano para continuar crescendo (Tainá Bernard/Divulgação)

KS

Karina Souza

Publicado em 10 de março de 2022 às 08h00.

Última atualização em 10 de março de 2022 às 11h33.

O ano era 2012. Fael foi o campeão do BBB, Avenida Brasil era o entretenimento que unia o Brasil, o 7x1 não estava nem perto de ser realidade por aqui e a Netflix havia chegado ao país há cerca de um ano. Isso tudo, é claro, sem falar no papo de que o mundo iria acabar. E, já que tudo poderia ir pelos ares, por que não aproveitar o tempo por aqui com uma nova geladeira, ou com a roupa mais nova das prateleiras das lojas? Brincadeiras à parte, fatores como a taxa de desemprego no menor nível histórico e a ascensão do e-commerce tiveram seu efeito. O varejo eletrônico teve um excelente ano, faturando R$ 22,5 bilhões, aumento de 20% em relação ao ano anterior. No ano em que as pessoas consumiram relativamente mais no mundo on-line, por que não aperfeiçoar a forma como elas pagam por essas transações? Com base nessa premissa, nasceu a Ebanx.

A startup financeira foi criada em Curitiba, fundada por Alphoense Voigt, João Del Valle e Wagner Ruiz. Depois de serem aceitos no processo seletivo dos Empreendedores Endeavor, os sócios quase colocaram tudo a perder na apresentação para conseguir o financiamento necessário – mas, no final do evento, conseguiram o dinheiro para começar. Naquela época, a oferta era uma só: tornar o processo de pagamento mais fácil para companhias internacionais e clientes que estavam na América Latina. O primeiro serviço oferecido foi o de intermediar pagamentos entre ambos os lados, permitindo, por exemplo, que fosse possível pagar compras em sites estrangeiros com boleto. 

Com o tempo, a Ebanx diversificou a atuação em duas outras frentes: processamento de pagamentos para sites brasileiros e serviços para consumidores, com o Ebanx Go – um app de conta digital que também dá acesso a cartão de crédito pré-pago. Foram mudanças que acompanharam o crescimento da companhia, que tem mais de 1.700 colaboradores, cerca de 100 métodos de pagamento incorporados e quase um bilhão de pagamentos processados – aumento de 110% em relação ao ano anterior. São cerca de mil clientes globais, como Amazon, SHEIN, Shopee, Spotify e Uber, além de mais de 35 mil no Brasil. 

A internacionalização veio logo cedo, em 2015, para quatro países. A startup estava longe de ser grande no Brasil, mas iniciar planos de diversificar a fonte de receita já era uma prioridade. Apesar de hoje se comprovar um passo acertado, com metade da receita vindo de fora do Brasil, a forma como esse processo começou se tornou um aprendizado. “A gente foi muito ‘abrindo caminhos’ nos países e demoramos cerca de dois anos para conseguir volume de clientes. Dali para frente, começamos a montar a estrutura e, simultaneamente, gerar demanda por serviços. Isso deixou toda a operação mais saudável”, afirma João Del Valle, co-fundador e CEO da Ebanx, à EXAME.

Onze países depois, a expansão internacional continua a ser prioridade, mesmo com  a meta batida de diversificação de receita. Este ano, a fintech deve abrir vagas nos escritórios no México, China, Estados Unidos e Europa. O plano de olhar para o mercado de fora segue o mesmo, mas com uma nova pessoa para liderá-lo: Paula Bellizia, ex-presidente da Microsoft Brasil e ex-VP do Google. 

O olhar é o de que meios de pagamento locais devem continuar ganhando cada vez mais força, sempre em direção a uma experiência de compra mais fluida. “O PIX transformou o mercado de pagamentos brasileiro e os próprios reguladores querem que discussões como essas avancem, com um PIX global, por exemplo. Também pensamos em fortalecer verticais como serviços digitais e e-commerce, além de buscar por outras”, afirma Paula. 

O importante mesmo para a Ebanx é crescer, sem perder de vista a regulação. No momento em que criptomoedas são a palavra da vez, a fintech não pensa em incorporá-las ao sistema por enquanto, mas está de olho no mercado para identificar o momento certo de trazê-las para dentro de casa. Não deixa de ser um mercado que passou por forte consolidação no último ano e que agora enfrenta outros desafios de amadurecimento de mercado, com uma procura cada vez maior por instruções de como investir nele. Só em 2020, a procura por cursos atrelados a esse universo aumentou cerca de 300% na plataforma online de aprendizado Coursera, por exemplo. 

Tanta procura faz com que passos para regulamentá-la avancem de forma acelerada. Recentemente, o presidente dos Estados Unidos aprovou um decreto inédito que deve apoiar a inovação e aprofundar estudos sobre esse  mercado nos próximos anos. Ao mesmo tempo, o bloqueio de criptomoedas também foi utilizado como forma de sanções por países ocidentais contra a Rússia, em razão dos conflitos recentes com a Ucrânia

No momento em que a situação na região é crítica e afeta setores variados – especialmente o agronegócio – a Ebanx, mesmo com um plano de expansão global, não foi afetada diretamente pelo conflito. “Estamos muito atentos. Temos recebido perguntas dos nossos clientes globais, mas não temos dependência de clientes dessa região para nosso negócio. De toda forma, vamos continuar monitorando com muita atenção a situação local”, afirma Paula. 

Atenção também será a palavra-chave da companhia para desenvolver os projtos iniciados no Brasil em 2022. O principal, ao menos por enquanto, é a integração completa da Remessa Online, startup que ajuda pessoas físicas e PMEs a enviar e receber em dinheiro do exterior, adquirida em dezembro de 2021 numa transação que chamou a atenção do mercado pelo porte: R$ 1,2 bilhão. Nos próximos seis meses, o processo de integração deve ser finalizado e a expectativa é a de que o negócio possa começar a acelerar dentro da fintech de pagamentos. Ainda em 2021, a Ebanx adquiriu também a startup Juno, de processamento de pagamentos de e-commerce, além de uma participação de 30% no Banco Topázio.

Em 2022, vem mais por aí? João afirma que a empresa não descarta oportunidades, mas que no momento todos os olhares estão voltados para a aquisição mais recente. Não custa lembrar que, em 2021, a Ebanx levantou 430 milhões de dólares com a Advent e, em 2020, levantou 20 milhões de dólares em um investimento liderado pela Kaszek Ventures. A companhia não abre detalhes de faturamento e caixa, mas o CEO afirmou ao Brazil Journal, à época da aquisição mais recente, que a companhia gerava caixa e continuava com uma estrutura de capital “muito confortável” mesmo depois das compras.

Tão confortável que um IPO está no mapa da companhia, ainda que isso não deva sair do papel no primeiro semestre de 2022. “Do ponto de vista interno, de contabilidade e governança, estamos prontos. No momento em que acharmos propício fazer [o IPO] deve ser um processo bem rápido”, diz João. 

Na concorrência, a Stone, que abriu capital há cerca de três anos, enfrenta um período complicado. No terceiro trimestre, o lucro líquido 53% menor do que o registrado no período  anterior fez as ações despencarem 32%. No auge do otimismo, a empresa chegou a ser avaliada na Nasdaq por US$ 35 bilhões – e estava valendo, no fim do ano passado, cerca de US$ 6,8 bilhões. Não é um momento fácil, com a inadimplência da oferta de crédito a pessoas físicas explodindo na pandemia, somada ao aumento do custo para conquistar novos usuários

A Cielo, também passou pela crise do setor de maquininhas e viu as ações caírem 55% em 2020, comunicou em fevereiro a venda de uma subsidiária nos Estados Unidos, por US$ 290 milhões, viu as ações dispararem mais de 10% em fevereiro deste ano. O otimismo está ligado ao fato de a empresa seguir a estratégia de focar o core-business no Brasil, como apontaram analistas de mercado, há três semanas. Nesta quarta-feira, a empresa divulgou o balanço com lucro líquido de R$ 970 milhões, aumento de 98% na comparação com o ano de 2020. 

Ambas as empresas enfrentam o ônus de um mercado local com juros em ritmo de alta, o que, por si só, colabora para que gastos de empresas e serviços desacelerem, assim como as compras de pessoas físicas. Isso tudo sem falar de um mercado que está cada vez mais competitivo. Todo o setor sofreu as consequências da pandemia e, com a Ebanx, não foi diferente, ainda que a companhia atue em um nicho ligeiramente diferente: em 2020, demitiu 62 dos 780 colaboradores e precisou reformular parte dos planos de expansão da frente de maquininhas que havia começado.

Depois da “tempestade”, a Ebanx acredita que os próximos anos devem trazer bonança. E, para celebrar a nova fase da companhia, até a marca passou por um rebranding e com um novo slogan: Be there. Anywhere. Encurtar distâncias por meio de pagamentos é o que a Ebanx tem feito nos últimos dez anos – e, pelo jeito, continuará sendo a missão da companhia nos próximos dez. 

Acompanhe tudo sobre:FintechsStartups

Mais de Negócios

Após anúncio de parceria com Aliexpress, Magalu quer trazer mais produtos dos Estados Unidos

De entregadores a donos de fábrica: irmãos faturam R$ 3 milhões com pão de queijo mineiro

Como um adolescente de 17 anos transformou um empréstimo de US$ 1 mil em uma franquia bilionária

Um acordo de R$ 110 milhões em Bauru: sócios da Ikatec compram participação em empresa de tecnologia

Mais na Exame