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Nestlé começa hoje a vender Starbucks no Brasil e turbina aposta em café

A aposta nos cafés passa pela ampliação da rede de boutiques Nespresso no país – a marca abriu 3 novas lojas em janeiro totalizando 28 unidades

Café da Nespresso em boutique da marca em Nova York (Daniel Acker/Bloomberg)

Café da Nespresso em boutique da marca em Nova York (Daniel Acker/Bloomberg)

Mariana Desidério

Mariana Desidério

Publicado em 17 de abril de 2019 às 06h00.

Última atualização em 17 de abril de 2019 às 07h52.

Os próximos anos da Nestlé no Brasil terão foco especial no café. O produto é a grande aposta da companhia, que firmou recentemente uma parceria para vender itens da Starbucks fora das cafeterias da rede. A oferta dos produtos começa hoje no Brasil, em algumas lojas do Pão de Açúcar. “O café se tornou uma prioridade porque o mundo se abriu para novas experiências. Essa é uma categoria que está explodindo com novas ideias.”, afirma Patrice Bula, vice-presidente executivo da companhia, em entrevista a EXAME durante sua mais recente passagem pelo país.

Nascido na Suíça, Bula tem 63 anos e costuma vir ao Brasil a cada dois anos para checar de perto como estão as operações da Nestlé por aqui. Ele é responsável pelas áreas marketing, vendas e negócios estratégicos no setor de alimentação, no qual a Nestlé atua há mais de 150 anos. Também chefia a Nespresso, marca de café em cápsulas que mudou o modo como o consumidor se relaciona com a bebida.

A aposta nos cafés passa pela ampliação da rede de boutiques Nespresso no país – a marca abriu 3 novas lojas em janeiro totalizando 28 unidades. Outra frente é o crescimento da Nescafé Dolce Gusto, marca de café e outras bebidas em cápsulas, como cappuccino, chás e chocolates. Em 2015, a Nestlé montou uma fábrica de cápsulas Dolce Gusto em Montes Claros (MG), a primeira fábrica do tipo fora da Europa. No ano passado, foram produzidas 422 milhões de cápsulas Dolce Gusto no país. A expectativa é crescer cerca de 15% em 2019.

A parceria com a Starbucks complementa esses esforços. A Nestlé passa a vender cápsulas compatíveis com Nespresso e Dolce Gusto além de pó de café torrado e moído, tudo com a marca Starbucks. O Brasil é um dos primeiros países no mundo a receber os produtos, junto com Bélgica, Chile, China, México, Holanda, Coréia do Sul, Espanha e o Reino Unido.

Para além do cafezinho, a Nestlé tem buscado se alinhar às novas tendências de consumo. O desafio para uma companhia centenária é não ficar para trás. Um dos esforços nesse sentido está em deixar clara a origem de seus produtos, tendo em vista que hoje os consumidores buscam mais produtos locais e menos marcas internacionais. “Essa é uma companhia global, mas a realidade é que 95% do que produzimos no Brasil é feito localmente. Muita gente no Brasil pensa que a Nestlé é uma empresa local. Na Europa é assim, nos Estados Unidos também”, diz Bula. A companhia se esforça ainda para reduzir a quantidade de açúcar em seus produtos. No Brasil, o principal exemplo é o Nescau, que ficou 30% menos doce.

Produtos da Starbucks vendidos pela Nestlé

Produtos da Starbucks vendidos pela Nestlé (Nestlé/Divulgação)

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Quais são as principais tendências do setor de alimentação que estão no radar da Nestlé?

Vemos na Nestlé hoje três tendências. A primeira é que os consumidores estão buscando produtos autênticos. Grande parte da população, em especial os mais jovens querem saber de onde vem o produto e se é feito com ingredientes simples os quais ele possa entender. Essa é uma tendência muito forte nos Estados Unidos e na Europa. Vemos também uma busca por produtos que venham do seu próprio país, e não produtos que trazidos de navio do outro lado do mundo. Outra tendência é o consumidor olhar para o que ele come e o que bebe como uma fonte de saúde, e aqui entram os produtos sem gluten, sem lactose, orgânicos, mas também uma parte mais científica, presente nas fórmulas para bebês NAN, por exemplo. O terceiro é o que pilar é o que chamamos de experiência. É o que estamos fazendo em vários países com o chocolate Kit Kat. Temos boutiques onde o cliente pode fazer o seu próprio Kit Kat personalizado. É o que fazemos em torno de um produto para mantê-lo vivo.

Quais são os principais investimentos da Nestlé tendo em vista essas tendências?

A forma como implementamos isso é diferente no Brasil e na Europa. Mas a tendência é a mesma. É por isso que lançamos o chocolate Talento orgânico. É por isso que realizamos ações entre o Nescau e ONGs no Brasil, é por isso que a Nespresso continua crescendo com seu sistema de boutiques no Brasil, é por isso que lançamos novas fórmulas infantis. Estamos presentes em 12 categorias e estamos tentando ativar todas elas, para que permaneçam relevantes.

Dentre essas 12 categorias, quais as prioridades para a Nestle?

Nosso CEO identificou algumas categorias em que temos alto crescimento e uma boa habilidade de ganhar mercado. O café é uma delas. O café se tornou uma prioridade porque o mundo se abriu para novas experiências em cafés. Essa é uma categoria que está explodindo com novas ideias, uma tendência ao café mais premium, e claro, a aquisição que fizemos da marca Starbucks fora das cafeterias. A parte de nutrição infantil continua sendo para nós uma chave absoluta. Esse é o coração da Nestlé, é onde nascemos. O terceiro é o setor de comida para pets. É um setor que cresce globalmente, à medida que as pessoas envelhecem, elas gostam de ter pets e cuidam muito bem deles. Nós gostamos disso e temos desenvolvido muita tecnologia nesse ponto. Outra categoria é a água. Vemos no mundo todo as pessoas substituindo refrigerantes e bebidas açucaradas por água e somos os líderes nesse setor em escala global. A isso adicionamos a parte de ciência da saúde, que desenvolve produtos para pessoas que tem alguma alergia ou estão doentes.

Como vê o mercado de alimentos no Brasil?

Venho para cá a cada dois ou três anos, Estive aqui dois anos atrás e as pessoas estavam muito preocupadas. Voltei agora e vejo uma mentalidade bem mais positiva. Estamos no Brasil há 98 anos, e gostamos daqui. Na indústria de alimentação, eu sempre digo para as pessoas que o consumidor não come PIB no café da manhã, não é como em outras indústrias. As pessoas comem alguma coisa no café da manhã. Então, o desafio é como fazemos o nosso produto ser  relevante para eles, nos bons momentos e nos momentos difíceis também. Isso é importante em um mercado como o Brasil.

Quais as prioridades da Nestlé aqui? 

Temos uma enorme ambição para o Brasil. Em termos de categorias, temos grandes planos para o setor de café. Se olhar para o nosso portfólio aqui, comos uma empresa forte em leite, em nutrição, em bebidas como o Nescau. Comparado ao mundo, onde a Nestlé é um líder global em café, temos menos ((espaço)) em café. Quero dizer que os próximos 3 a 5 anos serão os anos do café para a Nestlé no brasil. Não significa que o restante é menos importante, mas vemos agora, com o crescimento do nosso negócio de Nespresso, o crescimento do Nescafé Dolce Gusto, no qual nós investimos em uma fábrica no Brasil, o que a marca Nescafé pode fazer para nós, e o que a marca Starbucks abre de possibilidades, vemos um momento em que realmente podemos mudar o jogo no setor de café. Acreditamos que o consumidor está preparado para olhar para novas experiências em café, novos modos de consumir novas marcas, então será uma nova era excitante para a Nestlé no Brasil.

O senhor menciona a compra da marca Starbucks. Como vai funcionar isso?

Vamos cobrir o mundo até o final do ano, mas temos alguns mercados prioritários, e o Brasil é um deles. Em um mês o produto vai começar a aparecer nas prateleiras. A ideia é trazer a experiência Starbucks para a sua casa. Temos três tipos de produtos. O primeiro são cápsulas compatíveis com Nespresso, para entregar pelo sistema a melhor experiência Starbucks. Temos também o Nescafé Dolce Gusto, esse outro sistema que lançamos no Brasil em que temos uma gama de produtos, como expresso, o cappuccino, o macchiato, e etsá mais próximo do que as pessoas bebem no Starbucks no Brasil. O terceiro é o café torrado e moído, e aí teremos três ou quatro blends icônicos da Starbucks. Estamos felizes de trazer isso tão rapidamente. Assinamos o acordo com a Starbucks em setembro e seis meses depois estamos lançando os primeiros produtos. Foi importante trazer para o Brasil entre os primeiros, porque a marca Starbucks tem uma ótima imagem aqui.

O senhor menciona a tendência do consumidor em buscar produtos locais. Como veem essa tendência alinhada à Nestlé? Quando eu penso em produtos locais, não penso em Nestlé, por exemplo.

É uma boa pergunta. Essa é uma companhia global, mas a realidade é que 95% do que produzimos no Brasil é feito localmente. Nosso desafio, e nós discutimos isso recentemente, é lembrar o consumidor que a Nestlé pode ser uma grande marca, mas nós produzimos aqui, fazemos com material que vem do Brasil. Por que não dizer no nosso café que aquele grão veio da Bahia, por exemplo? Por que não lembrar o consumidor que nossos produtos  matinais são feitos com leite produzido no Brasil? Marcas como a nossa têm um grande trabalho a fazer para reconvencer as pessoas, ou lembrá-las, ou contar a elas que somos uma grande marca, mas estamos aqui, não estou trazendo isso de algum lugar lá longe. Estou trazendo de plantações de café no Brasil. Você vai ver o storytelling aparecer em nossos produtos, muito porque o consumidor valoriza isso. Somos uma grande companhia, mas a realidade dessa companhia é que ela se torna uma empresa local em quase todos os lugares. E muita gente no Brasil pensa que a Nestlé é uma empresa local. Na Europa é assim, nos Estados Unidos, eles pensam que é americana, aqui muitos pensam que somo brasileiros porque estamos aqui há eras. E é verdade, as vezes somos mais brasileiros do que algumas empresas brasileiras.

O senhor citou o Nescau como um produto importante. Como a Nestlé lida com a tendência de busca de menos açúcar nos alimentos?

Fizemos um compromisso global na Nestlé de reduzir o açúcar em todos os nossos produtos globalmente. É uma jornada. No Nescau, reduzimos o açúcar em 30%, depois teremos um com menos 50% e já testei um produto com nada de açúcar adicionado. Mas nos adaptamos ao gosto das pessoas. Sabemos por exemplo que para não querer mais açúcar no seu café, você precisa beber café sem açúcar por uma semana. É incrível ver no mundo como a cultura influencia nisso. Nosso produto no Japão tem bem menos açúcar do que na América Latina. Uma coisa é fazer isso, a outra é que o consumidor aceite isso. É preciso alguma coragem porque muitas vezes o consumidor prefereria manter o produto com mais açúcar, por conta do gosto.

Na teoria as pessoas querem menos açúcar, mas na pratica não é bem assim?

Isso acontece no mundo todo. Você pergunta para as pessoas: você quer comida saudável? Ela diz sim. Quer mais vegetais? Sim. Frutas? Sim. Mas quando falamos de seu comportamento a coisa fica diferente. Você vê por exemplo as pessoas fazendo academia, e então para se recuperar, comem um sorvete Hagen Daaz. Temos sempre que lembrar que somos seres humanos, não somos robôs.

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