Alejandra Yacovodonato, fundadora da Fly Educação: Em 2024, a empresa conseguiu sua primeira captação de R$ 1 milhão.
Jornalista especializada em carreira, RH e negócios
Publicado em 16 de dezembro de 2024 às 11h00.
A venezuelana Alejandra Yacovodonato, fundadora da Fly Educação, uma ONG voltada à capacitação de pessoas em vulnerabilidade social, chegou ao Brasil em 2014 para fugir da crise humanitária que assolou a Venezuela naquela época e foi marcada por roubos, escassez de alimentos e cortes de luz e água. “Ao lado da minha mãe, decidi emigrar em busca de segurança e oportunidades. Viemos para São Paulo com duas malas e apenas US$ 750”, lembra.
Nos primeiros meses, por conta das dificuldades financeiras, ela precisou trabalhar em dois empregos, como garçonete e hostess. Até que um cliente equatoriano que estava abrindo uma startup de tecnologia, a convidou para integrar o time e abrir mercado na América Latina. “Essa experiência transformou minha vida”, diz.Com a estabilidade financeira, conseguiu cuidar da saúde mental e fazer terapia, concluiu a faculdade e um mestrado, e começou a criar uma rede de contatos potente. “Eu me conectei com muitas pessoas inspiradoras, incluindo um colega negro, com quem discutia o que havia nos tirado das estatísticas de pobreza. Concluímos que o diferencial foi o aprendizado de competências socioemocionais, como comunicação, liderança e resiliência”, diz. Essa reflexão foi o ponto de partida para fundar a Fly Educação.
Em dez anos, a ONG já impactou cerca de 300 mil pessoas indiretamente, sendo 8 mil de forma direta, e gerou R$ 5 milhões de renda anual para mulheres em vulnerabilidade social em todo Brasil. Por meio do programa Mulheres in Tech, por exemplo, 54% das estudantes encontraram um trabalho na área da tecnologia. A Fly também atua na Colômbia, Venezuela e Uruguai, tem parcerias com empresas como Alura, MRV e Localiza e realiza treinamentos corporativos. Foi desenvolvido, por exemplo, um curso online para a Editora Moderna voltado à capacitação de professores de escolas públicas sobre competências socioemocionais e metodologias ativas.
Em 2024, conseguiu sua primeira captação de R$ 1 milhão e, para 2025, a meta é a autossustentabilidade, gerando mais de R$ 600 mil em receita anual.
Com a bagagem que acumulou na startup e os cursos que realizou, Alejandra sabia que precisava traçar um plano bem estruturado. O primeiro passo foi definir o propósito da Fly. Tendo como base a pergunta “o que quero solucionar?”, começou a dar os primeiros passos. “Meu objetivo era fortalecer o senso de autonomia das pessoas, ajudá-las a sentirem que, mesmo diante de uma crise inesperada, são capazes de encontrar os caminhos necessários para melhorar”, afirma.Outros passos fundamentais foram pedir ajuda e conselhos, sem medo de compartilhar seus objetivos, e ir a locais frequentados por pessoas que tinham os conhecimentos ou recursos que ela precisava. “Esse processo me mostrou que, com clareza de propósito, busca ativa por apoio e disposição para agir, é possível demonstrar o valor da nossa voz e o poder que temos de transformar realidades”.
Alejandra conta que a Fly iniciou levando capacitações sobre competências socioemocionais para escolas periféricas em São Paulo, como Capão Redondo e Campo Limpo. Aos poucos, o projeto cresceu, atraiu voluntários e surgiu uma parceria com a Secretaria de Educação, que levou a ONG a atuar em 33 escolas na Brasilândia. “Naquela época, saúde mental e inteligência emocional eram assuntos pouco discutidos, especialmente em escolas da periferia”. Atualmente, a instituição desenvolve programas socioemocionais e de geração de renda que enfatizam empreendedorismo, tecnologia e iniciativas ambientais para indivíduos de grupos sub-representados, com impacto em todo o país. Para isso, possui uma metodologia própria e pioneira no Brasil, que combina elementos da Educação Experiencial, Hermenêutica, a renomada Teoria U do MIT, além de outras abordagens.
A busca e a conquista da primeira capacitação exigiu calma e determinação. “Foi um processo realizado com muita paciência, dando um passo de cada vez”, diz. E sempre tendo como bases um propósito claro e resultados concretos – tanto em números, quanto relacionados às transformações realizadas pela ONG. “Investidores e parceiros se conectam com dados, mas também com narrativas que mostram como as pessoas estão sendo beneficiadas quando falamos em negócios de impacto”.
Para quem busca investimento, a empreendedora recomenda fortalecer a autoconfiança. “Ouvir ‘não’ faz parte do processo e é essencial não deixar isso abalar o seu propósito”, diz. Também é fundamental, segundo ela, estudar sobre temas como gestão, vendas e marketing para conseguir mostrar o valor do negócio, buscar redes de apoio e mentoria, e não deixar de cuidar de si mesma “O descanso é parte da jornada. Cuidar da sua saúde mental e física é tão importante quanto alcançar os resultados financeiros”, diz.
Ela ressalta, ainda, que é fundamental construir parcerias genuínas. “Não basta buscar apoio; é preciso criar vínculos autênticos. Empresas e pessoas percebem quando há interesse verdadeiro em caminhar junto para resolver problemas de longo prazo”. E nunca deixar de se especializar. A empreendedora é comunicadora empresarial com mestrado em planejamento e administração, focada em educação experiencial, e possui diploma de liderança em inclusão social e acesso a direitos, além de um programa em tomada de decisões baseada em ciência de dados, pelo Institut d'Intelligence Artificielle Appliquée.
Alejandra deixa um conselho às mulheres: “Empreender é uma jornada e exige equilíbrio. O medo estará lá, mas sua vontade de transformar sonhos em realidade pode ser maior. Acredite em você e dê o primeiro passo. O resto, você aprende no caminho”.