Palmitolândia: cultivo sustentável de palmito na Mata Atlântica, unindo negócios e natureza.
Jornalista especializada em carreira, RH e negócios
Publicado em 29 de novembro de 2024 às 15h42.
“É possível construir um mundo onde o capital exista, mas não impere, e associar natureza com negócios”, diz Anna Gabriella Rodrigues, proprietária da Palmitolândia, localizada em Iporanga (SP) em uma área de 180 hectares, no coração da Mata Atlântica. E é isso que ela vem fazendo. A empresa, que surgiu por conta do desejo da família de valorizar o palmito, foi crescendo ao longo dos anos e, atualmente atua com gastronomia, turismo e lazer, além da comercialização do vegetal in natura e em conserva.
Este ano, já recebeu mais de 300 pessoas, entre brasileiros, chineses, holandeses e argentinos, para almoços e vivências. No cardápio, são aproximadamente 30 produtos – de patês e pratos prontos, como lasanhas, yakissoba e tortas, a cervejas, doces e utensílios. Segundo ela, tudo aconteceu a partir da observação da terra, da região e do mercado, sempre com um propósito muito claro baseado na sustentabilidade. Tradicionalmente, explica, o processo de produção de palmito é muito agressivo: os produtores derrubam uma palmeira inteira e apenas uma parte vai para os vidros; o restante é desperdiçado. “Isso me incomodava. Meu pai sempre chamou o palmito de ‘ouro branco’ e eu sabia que era possível aproveitá-lo de várias formas”.
Ela conta que, no início, não havia um engenheiro agrônomo para dar orientações sobre o que deviam fazer, nem para medir o pH da terra, por exemplo. “Foi ‘amassando' muito barro, colocando a mão na massa mesmo, que identificamos a questão do desperdício e traçamos um caminho”, conta.
Hoje são cultivados mais de 100 mil pés de palmito em uma agrofloresta que integra as árvores nativas e as palmeiras cultivadas de juçara, sustentavelmente preservadas. Além disso, a Palmitolândia integra a Rota Gastronômica do Vale do Ribeira e representa Iporanga no projeto Sabor de São Paulo, que leva o melhor da culinária da roça paulista para grandes feiras e eventos. Anna Gabriela também vem acumulando premiações como ouro no Prêmio Mulher de Negócios Sebrae – categoria Estadual e Regional (2023), bronze no Prêmio Mulher de Negócios Sebrae – categoria Nacional (2023), e Prêmio Braztoa de Sustentabilidade (2023/2024). A meta agora é aumentar o potencial do palmito, conquistar a independência financeira em relação às fábricas e tornar a fazenda autossustentável até 2029.
Tudo começou há 20 anos, quando o casal José Osmar de Araújo e Ana Maria Meneghello de Araújo, ao falo da filha Anna Gabriella e do genro Fábio Braga, apostaram na região do Vale do Ribeira e resolveram plantar as primeiras mudas de palmito pupunha em Iporanga/SP. “Foi como um ritual de família, no qual cada um plantou sua muda”, lembra a empreendedora.
Para as outras etapas de produção, ela decidiu contratar 40 mulheres da região – que chegavam pela manhã para todo o preparo e, ao final do dia, levavam os produtos para a cidade em uma Kombi. “Esse segmento é predominantemente masculino, por isso, fiz questão de trazer mulheres para nos ajudar”, afirma. Além disso, já no primeiro corte, sua mãe testou uma receita de bombocado usando apenas partes do palmito. “Ficou uma delícia, igual ao feito com coco, e começamos a testar outras receitas e vender para amigos”.
Mas como em todo negócio, altos e baixos acontecem. Com a pandemia de covid-19, o fornecimento para as fábricas parou e Anna Gabriella viu muitos produtores quebrarem. Era hora de tirar outro plano do papel. “Já fazíamos muitos produtos com o palmito, como brigadeiro e patês. Resolvi, então, buscar o Sebrae para transformar a região em um local turístico”. O apoio foi fundamental para a estruturação do modelo de negócios e das instalações que seriam necessárias, como banheiros e quiosques, e toda a parte de acessibilidade. “Muitos falaram que eu era louca, que ninguém comeria brigadeiro de palmito, muito menos experimentariam uma cerveja feita com o vegetal. Mas eu acreditava na ideia”, diz.
O projeto de turismo saiu do papel, mas seis meses depois Anna Gabriella precisou lidar com a perda do pai. “Foi uma fase muito difícil. Ele era meu mestre, para quem eu corria nos momentos complicados. Foi o único momento em que pensei em largar tudo, mas o propósito de deixar um mundo melhor para meu filho me fez seguir”, diz.
Hoje, além da venda para as fábricas, o espaço recebe turistas do mundo todo. Entre as iniciativas há o Day Use, um passeio guiado pela plantação, no qual as pessoas escolhem um palmito e descobrem como prepará-lo com receitas exclusivas; e vivências extras que contam com oficina de artesanato e arte com palmeira, área de bioconstrução para crianças, aulas de cozinha vegana à base de palmito, water walking pelo Rio das Pedras, camping e birdwatching para observação dos pássaros da região. “Em uma das visitas, lembro de um garoto que fez uma vassoura com as folhas que colheu”. Ela ressalta que sempre conversa antes com os visitantes para adequar a experiência ao que eles desejam. “Chamo a Palmitolândia de Disneylândia do palmito”.
Para as mulheres, Anna Gabriella deixa um conselho: ignorar as falas de desmotivação e acreditar no sonho. “Sempre haverá pessoas falando que não vai dar certo, te colocando para baixo, mas se você acredita na ideia, se ela faz seu coração bater mais forte e seus olhos brilharem, continue”. Nesse sentido, ela recomenda buscar parceiros e pessoas que acreditam no mesmo propósito para criar uma rede de colaboração. “Se não dermos o primeiro passo, as portas não se abrem”.
Outro pilar fundamental é se atualizar e buscar novidades. “Eu aprendo e me reinvento todos os dias. Agora estou fazendo um sapato com parte do palmito e construindo uma casa. A última peça que fizemos foi um instrumento musical”, completa.