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Depois do IPO, o que quer a Mobly?

Com a tecnologia como pilar essencial, empresa espera conquistar o Brasil – e, potencialmente, a América Latina

Sócios da Mobly: crescimento apoiado em estratégia digital deve continuar a ser o foco (Germano Luders/Exame)
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Karina Souza

Publicado em 11 de março de 2021 às 07h30.

A oferta pública de ações (IPO, na sigla em inglês) da Mobly (MBLY3) foi considerada bem-sucedida para a empresa: movimentou R$ 812 milhões, com o preço da ação fixado em R$ 21 – portanto, na parte de cima da faixa indicativa de preço, que se estendia até R$ 23 – e reforçou o caixa da companhia com R$ 778 milhões. Diante de tanto sucesso, dez anos após a fundação da startup, o que quer a Mobly?

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Além da missão óbvia de liderança no setor, o cofundador Marcelo Marques traduz o propósito da companhia para os próximos anos: “continuar a ter orgulho da empresa e de tornar a vida de muitas pessoas melhor, com produtos acessíveis”, afirma.

De forma prática, isso tudo acontece por meio de um pilar valorizado pela Mobly desde sua fundação, em 2011: a operação totalmente focada nos benefícios do mundo digital. Espaço para isso, de certa forma, não falta. De acordo com estimativas da Euromonitor, o mercado de produtos para casa movimenta R$ 90 bilhões por ano e, desse total, apenas 8% se dá por meio de canais digitais. Dentro desse espaço, os cinco maiores players respondem por apenas 13% das vendas.

Para vencer nesse mercado, a companhia investe em uma estratégia ágil: testar rápido, errar rápido e corrigir rápido. E, se der certo, fazer com que cresça rapidamente. É o caso das soluções já implantadas, como inteligência artificial para recomendação de produtos e realidade aumentada. As ferramentas ampliam em até 118% a taxa de conversão da visita do cliente em compras.

Para reforçar o “DNA digital”, a empresa está investindo em contratações para ampliar as equipes de tecnologia, focadas cada vez mais em automação, otimização e descoberta de informações por meio dos dados. O foco é diminuir pontos de atrito entre a loja e o consumidor, proporcionando a melhor experiência de compra, com sistemas integrados e automatizados em todas as plataformas (loja, site e aplicativo).

“Já consigo mapear os produtos mais vendidos a cada quarteirão. Isso é um exemplo de uma iniciativa de uso de dados que deve nos ajudar a melhorar cada vez mais a estratégia de distribuição e de sortimento para cada local”, explica Marcelo.

Hoje, a Mobly está presente nas cidades de São Paulo (estendendo-se para a Grande São Paulo), Campinas e Taubaté. O plano da companhia é seguir um crescimento “em caracol” pelo Brasil, de acordo com as regiões próximas onde a companhia já atua e, é claro, visando aos locais de maior potencial de acordo com o PIB de cada um deles, segundo Marcelo.

Com o caixa reforçado em mais de R$ 700 milhões pela captação na bolsa, a expansão focada em um modelo multicanal de negócio deve ganhar ainda mais força. Nascida como uma empresa totalmente digital, a Mobly deve continuar investindo para proporcionar esse tipo de experiência aos clientes. No último ano, a empresa inaugurou uma megaloja de móveis na época da Black Friday, a Megastore Tietê – que se somou à unidade do Morumbi.

Os pontos físicos faziam parte da estratégia da empresa desde quando a startup começou a ganhar fôlego nas vendas – porém, no início, não era viável tê-las de forma sustentável para o negócio. Agora, a ideia é desenvolver essa estratégia, apoiando-se sempre no ambiente on-line como ponto de partida para esses investimentos. “Nossas unidades físicas não são lojas de móveis comuns, mas efetivamente o canal físico para o estoque digital”, afirma Marcelo.

Concorrência

O modelo de negócio guarda semelhanças com a estratégia adotada pelo Magazine Luiza, um dos principais nomes do varejo no país – e que, recentemente, declarou que tem o objetivo de se tornar “o Alibaba brasileiro”.

Além do Magalu, outras varejistas como Via Varejo e B2W têm fortalecido cada vez mais o modelo de “retira em loja”, agilizando a entrega – e fornecendo uma outra utilidade aos pontos de venda físicos.

Especificamente no setor em que a Mobly atua, também chama a atenção a MadeiraMadeira, startup que também vende móveis pela internet e que recebeu aporte de R$ 190 milhões no início deste ano. Nesta rodada de captação, a empresa foi avaliada em mais de 1 bilhão de dólares, ficando ao lado de outras gigantes como Nubank, Wildlife e Creditas.

Todo esse fôlego digital também deve agradar aos investidores. Em um ano marcado pelos IPOs das concorrentes – Westwing e Tok&Stok –, a Mobly tem a possibilidade de ganhar espaço. Para André Bolonhini, sócio da Bain&Company especializado em varejo, o investimento da companhia na omnicanalidade é um ponto central disso, já que melhora a experiência do consumidor e pode colaborar para reduzir problemas com logística.

“Quem tem capacidade digital consegue desenvolver ferramentas para melhorar a experiência do consumidor em ambas as frentes. Algumas varejistas já perceberam isso e estão investindo de forma pesada em tecnologia também, como é o caso da Tok&Stok. Esse investimento deve reduzir a distância da Mobly para as suas concorrentes nos próximos anos”, afirma.

Na hora de digitalizar, o potencial do e-commerce gerado pela pandemia é inegável. A necessidade fez com que mais de 7 milhões de brasileiros comprassem online pela primeira vez só nos primeiros seis meses de 2020. Em faturamento, o varejo digital faturou R$ 126,2 bilhões em 2020, 68% a mais do que em 2019, segundo o relatório Neotrust|Compre&Confie, que mapeia o varejo digital no país.

Para empresas desse setor, o fundamental é ter atenção com a logística. É ela quem vai ditar grande parte do crescimento da empresa e assegurar que seja feita de forma eficiente é fundamental. Existem várias estratégias para isso, desde alianças com parceiros até comprar outras empresas, como temos visto em grandes empresas de varejo. Diversificar centros de distribuição é uma etapa fundamental desse processo”, afirma André Dias, diretor de inteligência da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm).

Investidores

Com o sucesso de todos esses planos, a Mobly pretende ir além das fronteiras brasileiras, segundo o prospecto enviado à CVM antes da abertura de capital. “Nós nos esforçamos para estar na vanguarda da migração do offline para o online no setor de Home and Garden no Brasil e, eventualmente, na América Latina ”, diz o documento.

Para isso, o reforço de caixa trazido pela captação é essencial. Com 50% do volume de dinheiro captado no IPO destinado a esse fim (35% foram para marketing e 15% para bens de capitais) a empresa deve enfrentar a pandemia com ainda mais fôlego para crescer.

A disposição da empresa para enfrentar o cenário adverso da pandemia (com tecnologia) tem consequências positivas para os investidores. Mesmo antes do IPO da Mobly, basta lembrar que o mercado estava atento ao setor de tecnologia: pelo menos cinco empresas superaram o Ibovespa em 2019, como Locaweb e Totvs.

Com os impactos gerados a partir da crise do coronavírus, o e-commerce também ganhou os holofotes na bolsa brasileira. Basta lembrar que, há algumas semanas, Lojas Americanas tiveram valorização de 20% ao anunciar uma possível fusão com a B2W.

“Ainda não sabemos como serão os termos da junção dos negócios, mas deverá gerar muito valor para os acionistas”, afirmou Luis Fernando Mollo, analista de ações e dividendos da Exame Invest Pro em relatório.

Nesse cenário, a Mobly tem as condições favoráveis para seguir no radar dos investidores. Para Henrique Castro, professor de finanças da Escola de Economia de São Paulo da FGV, o crescimento da receita da empresa ao longo do tempo também é um indicador positivo: em 2017, a receita da empresa era de 200 milhões de dólares, montante que passou a 400 milhões em 2019. Apesar de não trazer lucro imediato para o acionista, a empresa apresenta perspectivas de fazê-lo.

“Um outro ponto favorável é o de que o IPO foi quase totalmente primário (com recursos indo para o caixa da empresa). Ou seja, não foi uma abertura de capital em que os acionistas antigos estavam querendo ‘cair fora’. Muito pelo contrário, ficaram dentro do negócio e boa parte desse dinheiro deve ajudar a empresa a alavancar o crescimento. Eles têm boa perspectiva de gerar lucro e é nisso que o mercado aposta”, explica.

Até lá, a Mobly ainda tem muito espaço para conquistar no mercado brasileiro. E, em um Brasil cada vez mais digital, a estratégia tem tudo para dar certo: em dez anos, a companhia foi do zero a um IPO. Nos próximos dez, resta observar o que virá.

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