De furacão a concorrentes, como as empresas preveem o imprevisível
Não é preciso uma bola de cristal para se preparar para o risco, segundo Prakash Mirchandani, da Universidade de Pittsburgh
Daniela Barbosa
Publicado em 8 de maio de 2012 às 11h20.
São Paulo – Nem sempre é possível adivinhar quando um furacão, um novo concorrente ou a variação do câmbio ocorrerão – com as previsíveis dores de cabeça que causam. Mas, mesmo assim, dá para reduzir bastante seu impacto, se as empresas estiverem preparadas. Esta é a avaliação de Prakash Mirchandani, especialista de gestão de risco e professor da universidade americana de Pittsburgh.
Em recente visita ao Brasil, Mirchandani falou com exclusividade a EXAME.com sobre como as companhias podem ter sucesso, desde que não percam de vista o que pode ameaçá-las. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista:
EXAME.com: Na prática, para que serve a gestão de risco?
Prakash Mirchandani: A função da gestão de risco é minimizar o impacto negativo de estímulos externos e internos nos lucros das companhias. Temos pouco ou nenhum controle sobre alguns desses estímulos. Por exemplo, a utilização de componentes comuns em vários modelos da Toyota e Lexus levou a um recall maciço em 2010, devido a um defeito de fabricação. O uso de componentes comuns em diversos modelos é uma estratégia geralmente recomendada. No entanto, no caso da Toyota, isso levou a um grande recall.
EXAME.com: As companhias devem promover gestão antes que os riscos aconteçam?
Mirchandani: Absolutamente. Planejamento de contingência ou planejamentos feitos hoje para se antecipar às incertezas do amanhã são fundamentais para a gestão eficaz dos riscos. Em muitos casos, a menos que tenhamos feito o planejamento de antemão, podemos não ter tempo para tomar uma ação corretiva após o imprevisto ocorrer. As coisas acontecem tão rapidamente que o tempo para responder é limitado.
EXAME.com: O senhor se lembra de algum exemplo positivo nesse sentido?
Mirchandani: A Bayer tem uma importante unidade instalada em Baytown, no Texas. Baytown fica em uma área propensa a furacão. A companhia tem planejado de antemão quais as medidas que tomar, se um furacão surgir. Além disso, definiu uma "zona vermelha", ou seja, uma área em que o impacto dos furacões pode ser sentido. Todos os anos, durante a temporada de furacões, eles movem as atividades de distribuição para fora da zona vermelha, para que as entregas aos clientes não sejam afetadas.
EXAME.com: Mas por que o exemplo da Bayer é tão bem-sucedido?
Mirchandani: Porque eles têm um processo de planejamento de riscos bem desenvolvido, com reuniões regulares em que os executivos discutem todos os fatores que afetam o nível de risco. Os fatores de risco são monitorados de forma multidimensional. Cada fator é avaliado ao longo da escala de impacto.
EXAME.com: Isso vale para todas as companhias?
Mirchandani: Devemos também ter em mente - e isso é crítico! - que a avaliação de fatores de risco, considerando essas dimensões, é dinâmica e não estática. Fatores que não são arriscados hoje podem se tornar amanhã e vice-versa.
EXAME.com: Como e por que os riscos surgem?
Mirchandani: O risco surge devido a várias razões, tais como a configuração de rede da cadeia de abastecimento, tecnologia, concorrência, mercado, catástrofes naturais, etc. Tudo isso tem que ser monitorado de forma contínua.
EXAME.com: O senhor poderia dar exemplos de empresas que fracassaram por não dar importância à gestão de risco?
Mirchandani: Considere o exemplo da Nokia, que era líder no mercado de celular de massa, e do Blackberry, que detinha a maior participação no mercado de smartphones. A Nokia não viu ou, pelo menos, demorou para reagir ao risco de mudança de tecnologia. A Nokia foi extremamente lenta na resposta. Então, eles não viram os riscos com a mudança de desejos do mercado. O resultado líquido é que a Nokia perdeu sua posição de número um para a Samsung. Isto se deve à falta de análise do risco competitivo.
EXAME.com: E a RIM, criadora do Blackberry?
Mirchandani: A RIM ( Research in Motion ) interpretou mal o risco da tecnologia: como se viu, a empresa assumiu incorretamente que usuários corporativos de smartphones iriam preferir o teclado físico em vez do touchscree (interface oferecida pelo iPhone). Isso não era para ser e a RIM está em 4º lugar no mercado de smartphones.
EXAME.com: Os riscos estão em todos os lugares? Como prevê-los?
Mirchandani: O ponto é que cada empresa enfrenta o risco devido a uma série de fatores diferentes. Claro que há risco devido a um desastre natural, mas também existem riscos devido a tecnologias disruptivas, abrindo espaço para a concorrência e mudando os gostos do mercado. Alguns deles podem começar de forma pequena, mas, se não houver resposta rápida e eficaz, podem devorar as vendas. Para uma empresa alcançar o sucesso, seus executivos devem estar cientes destes e de outros elementos de risco.
EXAME.com: As empresas estão preocupadas com a gestão de riscos? Ou a grande maioria ainda não se deu conta da importância disso?
Mirchandani:Creio que as empresas estão mais conscientes da importância de gerir os riscos de suas cadeias de abastecimento do que uma década atrás. E há uma necessidade urgente de ser assim.
EXAME.com: No Brasil, esse tipo de gestão está sendo priorizada pelas companhias?
Mirchandani:Acredito que sim. Com a globalização das cadeias de abastecimento, veio também o compartilhamento de informações e aprendizagem. Minhas discussões com os alunos do programa de MBA Executivo, na Universidade de Pittsburgh, parecem indicar que os executivos do setor privado no Brasil levam a sério a gestão de risco.
EXAME.com: Existe alguma área no Brasil que precisa de atenção?
Mirchandani:Como anfitrião da Copa do Mundo e Olimpíada, o Brasil está enfrentando um grande desafio no que diz respeito ao gerenciamento do risco de atrasos no projeto e custos. Quanto maior for a empresa, maior é o risco. Resta ver se o Brasil será capaz de seguir o exemplo e realizar a Olimpíada de forma impecável como aconteceu na última edição em Pequim, na China.
São Paulo – Nem sempre é possível adivinhar quando um furacão, um novo concorrente ou a variação do câmbio ocorrerão – com as previsíveis dores de cabeça que causam. Mas, mesmo assim, dá para reduzir bastante seu impacto, se as empresas estiverem preparadas. Esta é a avaliação de Prakash Mirchandani, especialista de gestão de risco e professor da universidade americana de Pittsburgh.
Em recente visita ao Brasil, Mirchandani falou com exclusividade a EXAME.com sobre como as companhias podem ter sucesso, desde que não percam de vista o que pode ameaçá-las. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista:
EXAME.com: Na prática, para que serve a gestão de risco?
Prakash Mirchandani: A função da gestão de risco é minimizar o impacto negativo de estímulos externos e internos nos lucros das companhias. Temos pouco ou nenhum controle sobre alguns desses estímulos. Por exemplo, a utilização de componentes comuns em vários modelos da Toyota e Lexus levou a um recall maciço em 2010, devido a um defeito de fabricação. O uso de componentes comuns em diversos modelos é uma estratégia geralmente recomendada. No entanto, no caso da Toyota, isso levou a um grande recall.
EXAME.com: As companhias devem promover gestão antes que os riscos aconteçam?
Mirchandani: Absolutamente. Planejamento de contingência ou planejamentos feitos hoje para se antecipar às incertezas do amanhã são fundamentais para a gestão eficaz dos riscos. Em muitos casos, a menos que tenhamos feito o planejamento de antemão, podemos não ter tempo para tomar uma ação corretiva após o imprevisto ocorrer. As coisas acontecem tão rapidamente que o tempo para responder é limitado.
EXAME.com: O senhor se lembra de algum exemplo positivo nesse sentido?
Mirchandani: A Bayer tem uma importante unidade instalada em Baytown, no Texas. Baytown fica em uma área propensa a furacão. A companhia tem planejado de antemão quais as medidas que tomar, se um furacão surgir. Além disso, definiu uma "zona vermelha", ou seja, uma área em que o impacto dos furacões pode ser sentido. Todos os anos, durante a temporada de furacões, eles movem as atividades de distribuição para fora da zona vermelha, para que as entregas aos clientes não sejam afetadas.
EXAME.com: Mas por que o exemplo da Bayer é tão bem-sucedido?
Mirchandani: Porque eles têm um processo de planejamento de riscos bem desenvolvido, com reuniões regulares em que os executivos discutem todos os fatores que afetam o nível de risco. Os fatores de risco são monitorados de forma multidimensional. Cada fator é avaliado ao longo da escala de impacto.
EXAME.com: Isso vale para todas as companhias?
Mirchandani: Devemos também ter em mente - e isso é crítico! - que a avaliação de fatores de risco, considerando essas dimensões, é dinâmica e não estática. Fatores que não são arriscados hoje podem se tornar amanhã e vice-versa.
EXAME.com: Como e por que os riscos surgem?
Mirchandani: O risco surge devido a várias razões, tais como a configuração de rede da cadeia de abastecimento, tecnologia, concorrência, mercado, catástrofes naturais, etc. Tudo isso tem que ser monitorado de forma contínua.
EXAME.com: O senhor poderia dar exemplos de empresas que fracassaram por não dar importância à gestão de risco?
Mirchandani: Considere o exemplo da Nokia, que era líder no mercado de celular de massa, e do Blackberry, que detinha a maior participação no mercado de smartphones. A Nokia não viu ou, pelo menos, demorou para reagir ao risco de mudança de tecnologia. A Nokia foi extremamente lenta na resposta. Então, eles não viram os riscos com a mudança de desejos do mercado. O resultado líquido é que a Nokia perdeu sua posição de número um para a Samsung. Isto se deve à falta de análise do risco competitivo.
EXAME.com: E a RIM, criadora do Blackberry?
Mirchandani: A RIM ( Research in Motion ) interpretou mal o risco da tecnologia: como se viu, a empresa assumiu incorretamente que usuários corporativos de smartphones iriam preferir o teclado físico em vez do touchscree (interface oferecida pelo iPhone). Isso não era para ser e a RIM está em 4º lugar no mercado de smartphones.
EXAME.com: Os riscos estão em todos os lugares? Como prevê-los?
Mirchandani: O ponto é que cada empresa enfrenta o risco devido a uma série de fatores diferentes. Claro que há risco devido a um desastre natural, mas também existem riscos devido a tecnologias disruptivas, abrindo espaço para a concorrência e mudando os gostos do mercado. Alguns deles podem começar de forma pequena, mas, se não houver resposta rápida e eficaz, podem devorar as vendas. Para uma empresa alcançar o sucesso, seus executivos devem estar cientes destes e de outros elementos de risco.
EXAME.com: As empresas estão preocupadas com a gestão de riscos? Ou a grande maioria ainda não se deu conta da importância disso?
Mirchandani:Creio que as empresas estão mais conscientes da importância de gerir os riscos de suas cadeias de abastecimento do que uma década atrás. E há uma necessidade urgente de ser assim.
EXAME.com: No Brasil, esse tipo de gestão está sendo priorizada pelas companhias?
Mirchandani:Acredito que sim. Com a globalização das cadeias de abastecimento, veio também o compartilhamento de informações e aprendizagem. Minhas discussões com os alunos do programa de MBA Executivo, na Universidade de Pittsburgh, parecem indicar que os executivos do setor privado no Brasil levam a sério a gestão de risco.
EXAME.com: Existe alguma área no Brasil que precisa de atenção?
Mirchandani:Como anfitrião da Copa do Mundo e Olimpíada, o Brasil está enfrentando um grande desafio no que diz respeito ao gerenciamento do risco de atrasos no projeto e custos. Quanto maior for a empresa, maior é o risco. Resta ver se o Brasil será capaz de seguir o exemplo e realizar a Olimpíada de forma impecável como aconteceu na última edição em Pequim, na China.