Compra da BG pela Shell alivia estresse sobre Petrobras
A compra da BG Group pela Shell oferece algum alívio à Petrobras em um momento em que a estatal é alvo de investigação sobre propinas
Da Redação
Publicado em 8 de abril de 2015 às 20h19.
Rio de Janeiro/Madrid - A compra planejada da BG Group Plc pela Royal Dutch Shell Plc oferece algum alívio à Petrobras,em um momento em que a gigante brasileira do petróleo é alvo de uma investigação sobre pagamentos de propinas.
Com a Petrobras envolvida no maior escândalo de corrupção do Brasil, a influência maior da Shell no país ajudaria a empresa controlada pelo Estado a desenvolver suas enormes reservas de petróleo offshore localizadas sob uma camada de sal, disseram analistas.
O acordo é “uma grande legitimação para o Brasil”, segundo o UBS Group AG. As ações da Petrobras subiram após o acordo.
"Uma Shell junto a BG tem muita mais capacidade de alavancar e financiar os investimentos do pre-sal no Brasil", disse Edmar Almeida, especialista em energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
"Acho que muda bastante o contexto do pre-sal no Brasil agora. A Shell indo para o mainstream do pre-sal é bom para o Brasil”.
A Shell acertou nesta quarta-feira a compra da BG por 47 bilhões de libras (US$ 70 bilhões) em dinheiro e ações, maior negócio da indústria de petróleo e gás em pelo menos uma década.
A aquisição vai “proporcionar à Shell posições melhores em novos projetos competitivos de petróleo e gás, especialmente em GNL na Austrália e em águas profundas no Brasil”, segundo comunicado da empresa com sede em Haia, nesta quarta-feira, de anúncio da transação.
A Agência Nacional do Petróleo não quis comentar sobre o acordo em um e-mail
O ministro de Minas e Energia do Brasil, Eduardo Braga, disse a parlamentares nesta quarta-feira que a Petrobras não deveria ser forçada a operar todos os projetos do pré-sal, defendendo uma revisão de um dos pilares da política do governo após as descobertas offshore.
A Petrobras teve seu rating de crédito reduzido a junk (grau especulativo) pela agência de classificação Moody’s em fevereiro, enquanto a Fitch Ratings disse no mês passado que poderá fazer o mesmo se a empresa não conseguir concluir seus equipamentos de produção offshore de forma suficientemente rápida para acelerar a produção.
A Petrobras tem até o final de maio para computar os prejuízos sofridos com a corrupção em um relatório auditado de lucros ou correrá o risco de ter seus pagamentos de dívidas acelerados.
Fator-chave
O portfólio brasileiro da BG se tornará um fator-chave de crescimento para a Shell. A expectativa é que a produção da BG aumente de 144.000 barris/dia em 2015 para 557.000 barris/dia em 2020, segundo nota a clientes de analistas do Jefferies, liderados por Jason Gammel, nesta quarta-feira.
“Para a Petrobras, a Shell é uma operadora capaz, que já tem experiência operacional no Brasil.
A empresa tem o potencial de oferecer apoio técnico e possivelmente até mesmo financeiro”, disse T.J. Conway, gerente de pesquisa e assessoria da Energy Intelligence Group, por telefone, de Washington. “O Brasil, no tocante à produção, é uma oportunidade de curto prazo por causa do crescimento esperado”.
Combinações de ativos
A Petrobras e a Agência Nacional do Petróleo, reguladora do setor no Brasil, não responderam a e-mails em busca de comentários sobre os efeitos do acordo.
A avaliação dos ativos da Petrobras tem sido limitada pela falta de caixa para desenvolver projetos e pelos padrões de governança ruins, escreveram analistas do UBS, liderados por Lilyanna Yang, em uma nota técnica nesta quarta-feira.
“A oferta Shell-BG implica que a Petrobras poderia levantar dezenas de bilhões de dólares se decidisse vender participações minoritárias em ativos combinados do pré-sal”, disseram os analistas. “O UBS enxerga esse acordo como uma grande legitimação para o Brasil”.
“O Brasil é o condutor estratégico-chave”, disseram os analistas do Jefferies. “A transação transforma a Shell na companhia estrangeira de petróleo líder no Brasil”.
Atrasos no campo de Lula
A Shell também tem operações no Brasil e parcerias com a Petrobras, inclusive no gigantesco projeto offshore de Libra.
A diferença é que para a BG a projeção é que o Brasil responda por um terço de sua produção até 2020, enquanto para a Shell esse porcentual não chega nem sequer a 10 por cento de suas operações.
A BG tem fatias não operacionais em cinco blocos do pré-sal, uma região offshore na qual a Petrobras realizou a maior descoberta do mundo das últimas três décadas, pelo menos, entre 2006 e 2007. Os blocos já respondem por cerca de um sexto da produção da BG.
O maior campo do pré-sal é Lula, uma parceria entre a Galp e a operadora Petrobras, com reservas recuperáveis estimadas em 9 bilhões a 11 bilhões de barris.
No mês passado, o CEO da Galp, Manuel Ferreira de Oliveira, disse que a empresa não conseguiu receber uma confirmação da Petrobras a respeito de atrasos nas plataformas para o campo de Lula. A Galp disse que o atraso poderia chegar a um ano.
A BG, cujos escritórios brasileiros estão localizados em frente à sede da Petrobras no Rio de Janeiro, anunciou em 2013 que construiria seu centro global de tecnologia na cidade brasileira como um sinal da importância de suas operações locais.
‘Mais paciência’
A Shell é uma das quatro parceiras da Petrobras em Libra, um campo que estima-se que contenha praticamente o equivalente às reservas atuais do Brasil. Os cinco integrantes concordaram em 2013 em pagar um bônus de assinatura de US$ 6,9 bilhões por uma licença de 35 anos para o projeto. A Petrobras possui 40 por cento do projeto e a Shell e a Total SA são donas de 20 por cento cada.
A China National Petroleum Corp. e a Cnooc. Ltd. controlam o restante.
“A Shell tem mais paciência e força financeira”, disse Juan Ramón Fernández Arribas, analista independente em Madri, por e-mail. “Ela pode esperar mais para desenvolver seus projetos e é uma operadora mais sólida do que a BG. Isso é uma grande vantagem nas discussões com a Petrobras”.