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Na web, a vez das roupas artesanais

Rafael Gonzaga Não faz muito tempo que comprar roupas e calçados pela internet era um negócio para corações fortes. E se não servir? E se não chegar? E se descosturar? Nos últimos anos, um grupo de empresas conseguiu resolver boa parte desses problemas com imagens melhores, descrições mais detalhadas, frete grátis para devoluções – e […]

CUTTERMAN: a companhia curitibana, criada em 2012, se rendeu ao mundo real e abriu uma loja no início de 2016  / Divulgação

CUTTERMAN: a companhia curitibana, criada em 2012, se rendeu ao mundo real e abriu uma loja no início de 2016 / Divulgação

DR

Da Redação

Publicado em 22 de julho de 2016 às 20h08.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h42.

Rafael Gonzaga

Não faz muito tempo que comprar roupas e calçados pela internet era um negócio para corações fortes. E se não servir? E se não chegar? E se descosturar? Nos últimos anos, um grupo de empresas conseguiu resolver boa parte desses problemas com imagens melhores, descrições mais detalhadas, frete grátis para devoluções – e preços mais camaradas. No fim das contas, o risco passou a valer a pena. Agora, pouco a pouco, uma nova onda ganha força no varejo online: as lojas de roupas e calçados artesanais e, em muitos casos, sob medida. Elas não têm escala, nem se destacam na comparação de preços. Mas oferecem praticidade e exclusividade. Não vão deixar ninguém bilionário, mas estão descobrindo seu caminho.

A moda cresce, veja só, principalmente entre os homens – e sobretudo entre homens de negócios. São clientes que nem sempre acham tempo em meio à rotina para bater perna em shoppings, e que não querem gastar pequenas fortunas em peças sob medida. Ou pelo menos é essa a explicação encontrada pelo empresário Ricardo Nobel, da Camisaria 1818. “Sabemos da grande dificuldade do brasileiro em encontrar uma roupa com o caimento ideal, devido à grande diversidade de biótipos e a pequena grade de tamanhos disponíveis no mercado nacional”, diz.

A Camisaria 1818 é uma plataforma online que funciona praticamente como uma alfaiataria – só que com a facilidade de sequer precisar levantar da cadeira do escritório. Através de uma ferramenta digital de visualização 3D, os clientes montam a própria camisa passo a passo, estipulando as medidas pessoais e escolhendo o que mais agradar em uma gama de opções de colarinhos, punhos, bolso, tecido. De acordo com Nobel, essa quantidade de detalhes customizáveis permite que qualquer homem, com qualquer tipo de corpo, receba uma camisa de qualidade a um custo acessível (na casa dos 250 reais). O faturamento é pequeno para os padrões das grandes redes: a previsão é chegar a dezembro produzindo 600 camisas por mês e faturando 1 milhão de reais por ano.

Ricardo diz que sempre foi fã de serviços de alfaiataria clássica e que virou um cliente fiel no momento em que comprou sua primeira camisa feita sob medida. A ideia da Camisaria 1818 começou a tomar forma durante uma temporada de seis meses nos Estados Unidos para um programa da New York University, onde foi possível conhecer melhor um modelo de negócios ainda novo no Brasil. “Nossa ideia é descomplicar a vida do homem, aliando a tecnologia com toda a qualidade da alfaiataria tradicional”, explica.

Inspiração que vem de fora

Esse novo mercado, como se vê no caso da 1818, não nasceu por geração espontânea. Como costuma acontecer no varejo online, as tendências começam no mercado americano e europeu, e depois são adaptadas para a realidade brasileira. Foi o que aconteceu com a empresária Livia Ribeiro, que, ao lado do sócio Adolfo Turrion, criou a fabricante de sapatos Louie. “Achamos que dá pra fabricar um sapato de qualidade a um preço justo. A crise ajudou, já que as pessoas estão viajando menos e olhando mais para o que podem ter dentro do Brasil”, diz Livia. “Além disso, hoje já está fora de moda gastar 4.000 reais em um sapato que vai ser usado diariamente. As pessoas já entenderam que isso não faz sentido”. Por preços justos, entenda algo como 300 reais num sapato masculino – ou seja, justo na comparação com as marcas de elite do país, e não com calçados de massa.

Os dois empresários se conheceram em Londres, quando trabalhavam em uma agência de propaganda. Depois de um breve desencontro, os dois voltaram a se encontrar em São Paulo. Foi só após o fechamento da agência na qual Livia trabalhava que a Louie começou a ter os primeiros esboços rascunhados. A empresária conta que as coisas foram caminhando com calma: primeiro montou uma pequena grade, fez uma lojinha via Facebook e a marca foi se espalhando no boca a boca. Até que Adolfo largou o emprego para cuidarem juntos da Louie em tempo integral. A marca foi lançada em dezembro de 2012 e hoje vende de 2.000 a 3.000 pares por mês.

O fato de Livia ser filha de uma tradicional família fabricante de sapatos, em Franca, no interior de São Paulo, certamente facilitou as coisas. Ela utiliza parte do maquinário da fábrica para fabricar seus sapatos, mas a maioria do trabalho é feita à mão mesmo.

Como é comum nessa nova leva de empresários, ela gosta de ressaltar que a Louie não é apenas uma marca, mas um “estilo de vida”. O site da Louie explica para os clientes desde a história de cada modelo de sapato até em que ocasiões usar, passando ainda pelas melhores combinações entre tipos de pés e calçados. “A moda masculina tem crescido muito a cada dia, o homem brasileiro está se preocupando mais. Eu ensino, dou entrevista e falo como tem que ser, recebo muito e-mail pedindo dica”, diz.

Vale até machado

A grande questão desses novos fabricantes é se dá pra vender todo esse estilo de vida apenas pela internet. Livia afirma que já pensou em abrir ao menos uma loja conceito. Mas não para vender seus produtos por lá. “A web funciona muito bem. Se o cliente errar a numeração, a gente busca o produto na casa dele e de um dia para o outro já leva um novo. É comprar sapato de uma forma rápida, simples e divertida”, explica.

A Cutterman Company, criada no fim de 2012, se rendeu ao mundo real no início de 2016 ao abrir uma loja em São Paulo. A empresa foi criada em Curitiba, onde ainda funciona sua operação, pelos publicitários Gustavo Oliveira e Rafael Matheus (que se desligou da marca em 2015).

A Cutterman vende artigos em couro como bolsas, carteiras e cintos, produzidos por artesões locais. No site, a aba com os produtos divide espaço com dicas de conservação e de identificação de couro de qualidade. Gustavo conta que eles tentaram alinhar diversos gostos pessoais com referências de consumo internacionais na hora de colocar o negócio para andar. “Trabalhamos com algumas pesquisas de referência feitas fora do país que mostravam que o couro estava sendo resgatado na Europa e nos Estados Unidos de uma forma artesanal muito bacana. Foi a chance perfeita para começar nossa marca, aliando o lifestyle de algo feito com as próprias mãos à internet”, diz.

Gustavo pontua também que, seja no ambiente virtual ou no físico, as pessoas buscam uma experiência de compra que vá além de abrir a carteira e levar uma sacola para casa. “A gente tem muita coisa no nosso DNA, desde referências ao universo da fazenda até se preocupar com bens duráveis”, diz.

Ricardo, da Camisaria 1818, acredita que essa roupagem virtual – prática, rápida e didática – para serviços que antes eram vistos como tradicionais é uma tendência sem volta. “Dos clientes que compraram com a gente nos últimos seis meses, 72% voltaram a fazer uma nova compra”, diz. A julgar pelos exemplos americanos, a moda pode de fato ter vindo para ficar. Por lá, a Best Made vende roupas e todo tipo de apetrecho hipster sob medida, e tem machados super estilosos como carro chefe. Isso mesmo: machados. Podem custar até 350 dólares. Perto disso, vender sapatos e camisas parece moleza.

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