Rafael Buddemeyer, da Buddemeyer: "Estamos cada vez mais globais" (Buddemeyer/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 25 de março de 2024 às 18h01.
Última atualização em 25 de março de 2024 às 20h17.
Num período com várias empresas em recuperações judiciais, a catarinense Buddemeyer é um exemplo de empresa que deu a volta por cima. Na época de sua principal crise, nos anos 1990, o recurso usado na Justiça ainda era a concordata. A empresa, porém, conseguiu passar por esse período tumultado e voltou a crescer. No ano passado, faturou 505 milhões de reais e está com um plano de expansão olhando, principalmente, para fora do país.
Anualmente, 50 milhões de peças como lençóis e toalhas saem das fábricas da catarinense Buddemeyer, nas cidades de São Bento do Sul e Campo Alegre. São produtos considerados de luxo, com um valor agregado maior.
A empresa tem apostado na internacionalização como um dos ingredientes para crescer no seu setor, competitivo, ao mesmo tempo em que concentrado. Por aqui no Brasil, por exemplo, quem está na corrida fica na mesma região da Buddemeyer, como a também catarinense Altenburg.
O movimento de virar global remonta a estratégia da Buddemeyer das últimas décadas do século passado. No início da sua operação, a catarinense focava mesmo na exportação. Depois, a partir dos anos 1990, passou por uma reformulação e voltou a olhar para o mercado interno, que hoje representa 75% das vendas -- mas chegou num patamar de estabilidade. Para crescer, agora a ideia é voltar a olhar para além das fronteiras nacionais.
“Estamos ficando cada vez mais globais”, diz Rafael Buddemeyer, atual CEO da empresa e membro da quarta geração da família fundadora da marca. “O mercado interno está muito focado nas questões internas, e atendemos isso, mas temos muita experiência de vender para fora do Brasil, e estamos atuando cada vez mais nesses mercados”.
A empresa é fornecedora, por exemplo, de produtos para a Zara Home na Espanha, marca de produtos para casa e decoração da varejista espanhola.
Os resultados estão chegando. No ano passado, a receita da companhia ficou em 505 milhões de reais, com perspectiva de crescimento de 20% para este ano.
A Buddemeyer foi fundada em 1951 na cidade catarinense de São Bento do Sul, iniciando como Mecano Têxtil F. Buddemeyer Ltda.
O fundador, Friedrich Bernhard Buddemeyer, conhecido como Fritz, foi um imigrante alemão que se estabeleceu no Brasil após a Primeira Guerra Mundial. Inicialmente, Fritz começou sua jornada profissional no país trabalhando em tecelagens e, posteriormente, estabeleceu sua própria fábrica de toalhas. A escolha por São Bento do Sul foi motivada pelo clima ameno da região e pela possibilidade de acesso a matéria-prima, graças à proximidade com a Fiação São Bento, uma parceria entre a Renaux e a Lepper.
Nos primeiros anos, a empresa enfrentou desafios como a adaptação ao mercado brasileiro e a necessidade de estabelecer uma marca sólida. Sob a liderança de Fritz e, mais tarde, de seus filhos Curt e Siegfried, a Buddemeyer superou os obstáculos iniciais e começou a crescer, olhando, principalmente, para a internacionalização.
Nos anos de 1980, por exemplo, a Buddemeyer começou a participar de feiras internacionais, como a Heimtextil em Frankfurt, na Alemanha, que era a maior feira do mundo em artigos para o lar e decoração na época. Esse evento se tornou uma plataforma importante para a empresa se apresentar ao mercado global, estabelecer contatos e firmar parcerias. O marketing e as vendas internacionais foram intensificados, com a empresa focando em mercados estratégicos na América do Norte, Europa e Ásia.
“Até os anos 1990, 90% da nossa produção era para o mercado internacional”, diz Rafael.
Na década de 1990, porém, houve uma mudança de rota. A empresa enfrentou as adversidades econômicas do Brasil, como a alta inflação e o Plano Collor, que impactaram negativamente a indústria exportadora. O resultado da crise? Uma concordata, antigo instrumento que hoje é conhecido como recuperação judicial.
Nessa época, com a alta na inflação e impactos de políticas econômicas, a indústria catarinense passou por um abalo. Nos anos 1990, a Buddemeyer acumulou uma dívida de 8 milhões de dólares devido a investimentos significativos, incluindo a construção de uma nova tinturaria. Esse valor era desproporcional ao faturamento anual da empresa, criando um desequilíbrio financeiro.
Em 1992, diante das dificuldades financeiras e do risco de perder o acesso ao crédito bancário, a Buddemeyer optou por entrar com um pedido de concordata, hoje aperfeiçoada na recuperação judicial.
Isso permitiu à empresa reestruturar suas dívidas e ganhar tempo para reorganizar suas finanças. Ao mesmo tempo, foi adotando estratégias para ganhar novos mercados -- na ocasião, principalmente o brasileiro.
A empresa estabeleceu, por exemplo, relações fortes com grandes redes varejistas, que eram os principais canais de distribuição para produtos de cama, mesa e banho. A Buddemeyer passou a desenvolver, também, coleções que atendiam às demandas do consumidor brasileiro, tanto em termos de estilo quanto de funcionalidade.
Além disso, a participação em feiras e eventos do setor ajudou a empresa a fortalecer sua rede de contatos e a se manter atualizada sobre as tendências e preferências do mercado.
A empresa também começou a explorar mais ativamente o marketing e a publicidade para promover seus produtos e reforçar sua marca.
Entre as estratégias para arrumar a casa, esteve:
Atualmente, com cerca de 73 anos de atuação, a Buddemeyer tem cerca de 1.100 funcionários, duas fábricas e três marcas:
A rede de varejo, aliás, é outra aposta da empresa para seguir crescendo. Hoje, a Casa Almeida tem 17 pontos físicos nas cidades de:
Além da presença física, a companhia investe nas vendas online com operação própria e participação em grandes marketplaces. “Hoje o varejo representa de 15% a 20% do negócio do Grupo, além da operação de e-commerce”, diz Rafael.
Para a estratégia de ganhar mercado também fora do país, a empresa tem apostado, por exemplo, nas regras e diretrizes de sustentabilidade, muito requeridas pelas compradoras estrangeiras.
A companhia recebeu em 2023, por exemplo, a certificação Carbono Neutro 2021/2022, sendo a primeira indústria têxtil brasileira do setor de cama, mesa e banho a receber o certificado. Nas fábricas, os processos estão alinhados com a norma internacional Öko-Tex. Além disso, a empresa está gradualmente substituindo o uso de plástico nas embalagens por tecido e materiais biodegradáveis.
Mas para coroar a estratégia de voltar a internacionalizar, a empresa está estudando a possibilidade de um novo canal de distribuição na Europa, para atender todo o continente.
A Buddemeyer está inserida num setor que movimentou 26,5 bilhões de reais em vendas em 2022 no Brasil, de artigos de cama, mesa, banho e decorativas. O levantamento é da consultoria IEMI – Inteligência de Mercado. As exportações ficam na casa dos 57,7 milhões de dólares.