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Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h26.
Temas como qualidade de vida, trabalho em casa, ensino à distância e tecnologia,todos discutidos à exaustão na última década, prometiam deixar os profissionais com mais tempo livre e as empresas mais eficientes. Muitas vezes, no entanto, a teoria não se confirmou na prática. Para Thomas Silveri, CEO da consultoria americana Drake Beam Morin (DBM), isso está prestes a mudar. Silveri acredita que os atentados terroristas nos Estados Unidos, em setembro passado, agiram como catalisadores de mudanças nas relações de trabalho. "A preocupação com segurança vai beneficiar pessoas e empresas", diz. "As companhias serão mais eficientes, com funcionários trabalhando menos e tendo mais tempo para a família." Parece utópico, mas Silveri já está percebendo isso na prática em Nova York, cidade onde trabalha. Lá, as empresas, mesmo aquelas não afetadas diretamente pelos ataques terroristas, estão considerando a hipótese de mudar suas instalações para fora de Manhattan. A principal preocupação dos executivos é com a segurança do negócio. Se a troca de endereço se concretizar, porém, quem ganha mesmo são os funcionários. Eles poderão ficar mais perto do trabalho, já que muitos moram nos subúrbios da cidade.
Outra mudança, Silveri percebe na própria DBM. Presente em 45 países, a empresa está utilizando mais do que nunca os meios digitais para fazer conferências e reuniões de negócios. Em tempos de segurança máxima nos aeroportos, isso poupa tempo e, muito importante, dinheiro. Apesar disso, Silveri veio ao Brasil no mês passado, para visitar a feira ExpoManagement, em São Paulo. Lá, concedeu esta entrevista a VOCÊ s.a.:
Depois dos ataques terroristas do último dia 11 de setembro, ficou a impressão unânime de que o mundo não seria mais o mesmo. E as relações trabalhistas, vão mudar?
A pergunta agora é o que não vai mudar. O mercado de trabalho americano já estava sendo atingido por uma recessão. Os Estados Unidos saíram de um crescimento de 4% no ano passado para uma previsão (otimista) de crescimento de 1% neste ano. Isso, de certa forma, já tinha afetado investimentos das multinacionais americanas em outros países. As empresas foram obrigadas a enfrentar a recessão, inclusive demitindo funcionários. Principalmente empresas de alta tecnologia. Então, a grande questão era: como reagir. Para piorar, vieram os ataques terroristas.
Piorar como?
A primeira coisa que se fez depois dos atentados foi parar. Depois, pensar e, após o luto, reagir. Em seguida, as empresas perceberam que tinham de garantir a segurança de seus funcionários. Elas devem se preocupar com isso, mas, acima de tudo, precisam fazer dinheiro. Por isso, penso que continuará ainda por algum tempo o movimento de demissões e o acerto de quadros.
Demissões, gastos com segurança e recessão. Nesse cenário, parece uma missão quase impossível as empresas conseguirem bons resultados daqui para a frente. Sob esse ponto de vista, os ataques terroristas têm conseqüências terríveis para indivíduos e empresas. Está certo?
Não. Esse é o ponto. Em curto prazo, sim. Mas o que veremos muito em breve é que esse movimento será benéfico para empresas e pessoas. Para as empresas, a preocupação com segurança vai automatizar ainda mais os processos de seleção, por exemplo, tornando-os mais rápidos e precisos. Hoje, muitas empresas nos Estados Unidos e em outros países estão simplesmente jogando fora currículos que chegam pelo correio comum. As cartas, quem sabe, podem estar contaminadas com antraz. Outro ponto é a segurança: os funcionários serão obrigados a usar cartões de identificação. Fica muito mais fácil controlar o que acontece dentro da empresa.
Até agora só parece bom para as empresas. Como os funcionários ganham com isso?
Ganham em conseqüência da utilização cada vez maior dos recursos tecnológicos por parte das empresas. Para evitar problemas de atrasos (uma viagem de apenas três dias, às vezes, consome uma semana por causa das escalas) e mesmo de segurança, as empresas devem restringir viagens de avião. A tendência é que utilizem cada vez mais videoconferência, atividades online e, também, treinamento virtual. Por ser mais simples e barato, o ensino à distância atinge mais pessoas. Veja nossa companhia, com 200 escritórios no mundo inteiro. Vamos utilizar mais e mais a tecnologia para colocarmos as pessoas em contato.
Isso quer dizer que o ensino virtual é cada vez mais real?
Sem dúvida alguma. Antes, pelo fator custo. Agora, pelo fator segurança. E desde sempre pelo conhecimento. Não restam dúvidas, hoje, de que o maior patrimônio das empresas é o seu capital intelectual. Algumas empresas que funcionavam quase 100% no World Trade Center, em Nova York, tiveram uma perda irreparável: as pessoas. Isso motivou uma nova discussão. As companhias estão avaliando a necessidade de concentrar operações no mesmo local. O prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, está tendo problemas para manter as empresas no sul da ilha de Manhattan.
Além da segurança, qual a vantagem de as empresas espalharem suas estruturas físicas?
Aqui, voltamos ao ponto da produtividade. Não é novidade que as empresas precisam fazer mais com menos. A surpresa é que a preocupação com a segurança pode facilitar esse processo. Explico: uma estrutura com menos pessoas exige que elas sejam mais eficientes e aprendam mais para obter os mesmos resultados em setores críticos do negócio. Em setores não críticos, as atividades podem ser terceirizadas. Outras opções que as empresas podem utilizar para melhorar os resultados são parcerias e alianças estratégicas, que, de certa forma, já acontecem por meio das fusões. No final das contas, abrem-se novas oportunidades de negócios, novas empresas.
O.k., mas e as pessoas que ficam nessas empresas "mais eficientes"? Elas terão de trabalhar mais horas para conseguir os mesmos resultados?
Não necessariamente. Trabalhar mais não é sinônimo de eficiência. Na verdade, estamos verificando uma tendência de as pessoas trabalharem menos. Uma pesquisa da DBM, feita por Philip Simshauser, presidente do Centro de Opções Executivas, constatou que 50% dos executivos de alto nível em busca de recolocação não voltaram para a vida corporativa. Foram para empresas menores ou abriram o próprio negócio. Fizeram essa opção para ficar mais tempo com a família. Essa é outra vantagem de as empresas espalharem a estrutura física. Os funcionários que moram nos subúrbios, boa parte deles, podem ficar mais perto do emprego. Assim, também ficam com mais tempo para a família. Depois dos atentados, muita gente se perguntou por que deveria trabalhar tantas horas se a vida é tão curta.
Por esse raciocínio, o trabalho em casa deve ficar mais comum a partir de agora...
Até o dia 11 de setembro, essa tendência de crescimento não existia. Agora, existem todas as possibilidades para essa opção voltar a ser mais utilizada, graças às tecnologias de conexão que já citamos. Essa vai ser uma boa arma para as empresas atacarem o problema da evasão de funcionários. Satisfazendo a necessidade dessas pessoas de aproveitar melhor seu tempo, elas terão um motivo a menos para deixar a empresa. Além disso, penso que as companhias vão aumentar os benefícios para segurar os talentos.
Essas mudanças de que o senhor falou são exclusivas dos Estados Unidos ou são mundiais?
É bom lembrar que as tendências das quais estamos falando estão acontecendo mais claramente nos Estados Unidos. Lá, principalmente em Nova York, o medo está servindo para acelerar as reações. Mas não tenho dúvida de que, em breve, esse novo tipo de relação trabalhista, com empresas mais eficientes e profissionais passando mais tempo em casa, conquistará o mundo. As mudanças já estavam a caminho. Os atentados serviram apenas como gatilho.