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A guerra e paz da fidelidade

Betina Neves  Os programas de fidelidade vivem num mundo à parte no Brasil, que não vê a cor da crise. Dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (ABEMF) mostram que os cadastros em programas chegaram a 77,9 milhões no terceiro trimestre de 2016. O número, referente a cinco das empresas associadas à […]

SMILES: os cadastros em programas chegaram a 77,9 milhões no terceiro trimestre de 2016  (Divulgação) (Divulgação/Divulgação)

SMILES: os cadastros em programas chegaram a 77,9 milhões no terceiro trimestre de 2016 (Divulgação) (Divulgação/Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 8 de junho de 2017 às 16h27.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h03.

Betina Neves 

Os programas de fidelidade vivem num mundo à parte no Brasil, que não vê a cor da crise. Dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (ABEMF) mostram que os cadastros em programas chegaram a 77,9 milhões no terceiro trimestre de 2016. O número, referente a cinco das empresas associadas à entidade (Dotz, Grupo LTM, Multiplus, Netpoints e Smiles), apresentou um aumento de 15% em um ano. Na busca por aumentar a participação dos brasileiros neste mercado promissor, bancos e programas são parceiros e concorrentes.

A Multiplus tem crescido os mesmos 15% ao ano, com atuais 16,5 milhões de clientes cadastrados. A Smiles, criada há 20 anos como programa de relacionamento da Varig, teve em 2016 lucro líquido de 548,3 milhões de reais, 48,2% a mais do que no ano anterior. A Netpoints, com apenas 6 anos de vida, distribuiu mais de 1,6 milhão de produtos com o resgate de 900 milhões de pontos em 2016.

A Dotz também vem nessa toada. Em trocas no varejo, houve aumento de 87% no primeiro trimestre deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. A empresa vai aumentar em 55% os investimentos em 2017, com 30 milhões de reais destinados a tecnologia e marketing. São atuais 300 parceiros, com um sistema permite até a possibilidade de usar a pontuação para o pagamento de contas de água, luz e telefone.

Os bancos apostaram no negócio nos últimos anos numa busca por novas fontes de receita. Além de participar efetivamente do acúmulo de pontos através do cartão de crédito, eles criaram seus próprios sistemas de resgate (como o Esfera, do Santander, e o Sempre Presente, do Itaú Unibanco), fazendo com que, para comprar uma passagem aérea, por exemplo, o cliente não tenha que necessariamente transferir os pontos para outros programas de pontos como o Multiplus e a Smiles.

“Fidelidade ainda não é o negócio dos bancos. Eles têm um portfolio mais restrito, e as pessoas não criam com eles a mesma relação que têm com o programa de pontos”, diz Roberto Medeiros, presidente da ABEMF. De fato, a estimativa do mercado é que 80% dos pontos acumulados sejam transferidos para outros programas de fidelidade, e não utilizados regatados com os bancos. Medeiros também atenta ao fato de que os programas permitem outras fontes de acúmulo (na Multiplus você pode ganhar pontos comprando roupa na varejista online Dafiti ou abastecendo nos postos Ipiranga, por exemplo), enquanto os bancos estão restritos aos gastos com cartão.

A última novidade no mercado foi a criação da Livelo, em junho de 2016, joint venture entre o Bradesco e Banco do Brasil. Já lançada com 10 milhões de clientes, ela veio para medir forças diretamente com as empresas de fidelidade, com algumas estratégias exclusivas como permitir que o cliente use a opção “pontos + dinheiro” para comprar os mais de 600.000 produtos disponíveis (as empresas normalmente só permitem esse modo de compra para passagens aéreas) ou a possibilidade de pagar a taxa de embarque com pontos. Para o cliente interessado em viagens, a Livelo tem parceroa com 750 companhias aéreas e com a CVC, maior operadora de turismo do país. Mas também tem Dotz, Smiles e Multiplus como parceiros.

“A conversa com o consumidor começou com as milhas aéreas, e os bancos entraram para alimentar essa conversa. Quanto mais competente for nossa plataforma, menos os clientes vão passar os pontos para os programas”, diz ”, diz Paula Nader, diretora do Esfera, programa de fidelidade do Santander.

O paradoxo parceiro/concorrente vai mais além: em janeiro deste ano, o Itaú Unibanco e a Multiplus lançaram um novo crédito co-branded com foco no público de alta renda, com ofertas para acelerar o acúmulo de pontos (ele permite entre 1,3 e 2,5 pontos por dólar gasto, ante a média do mercado 1 ponto por dólar). Na prática, o acordo faz com que os pontos acumulados por meio do cartão co-branded vão direto para o programa da Multiplus, em vez do Sempre Presente, plano do próprio Itaú Unibanco.

De qualquer jeito, ambos seguem na briga por engajar os brasileiros no acúmulo de pontos: a ABEMF estima que apenas um de cada dez participe do mercado. De acordo com relatório do Banco Central, que realiza uma apuração junto às emissoras de cartão de crédito, em 2015 foram cerca de 63 milhões de pontos expirados, equivalente a 21% do total de pontos acumulados no ano (ainda não há dados de 2016). É quase o dobro do percentual verificado em 2010, primeiro ano em que o número foi apurado pelo BC.

“Falta educar o consumidor para entender como ele pode usar esse benefício, que requer a criação de um hábito e certa disciplina”, diz Ricardo Rocha, professor de finanças do Insper. “Os pontos ainda são uma moeda pouco percebida”. Como o período de acúmulo normalmente é longo, entre 12 e 18 meses, o consumidor acaba não checando com frequência a sua pontuação. “Muita gente só fica almejando passagens aéreas, e, quando não consegue o número de pontos para adquiri-las, acaba desistindo de usá-los”. É comum também que as pessoas gastem em cartões de crédito diferentes, pulverizando os pontos, em vez de concentrá-los num só.

Apesar de as empresas gerarem receita com as milhas vencidas, é mais interessante estimular o uso. “Quando o cliente usa os pontos ele tende a aumentar seu gasto médio no cartão de crédito e usá-lo como primeira opção”, diz Nader. “Nossa intenção é mostrar que pontos não servem só para passagem aérea e batedeira”.

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