Futebol: Sem investimentos ou planejamento a longo prazo, “os times terão desempenhos financeiros e em campo cada vez piores", diz consultor do Itaú BBA (moodboard/ThinkStock/Thinkstock)
Karin Salomão
Publicado em 26 de setembro de 2016 às 09h41.
São Paulo – O futebol no Brasil precisa ser mais profissional. Sem investimentos nas categorias de base ou planejamento a longo prazo, “os times terão desempenhos financeiros e em campo cada vez piores, com mais dificuldades de formar e manter boas equipes”, afirma Cesar Grafietti, Superintendente de Crédito do Itaú BBA e coordenador de estudos sobre futebol.
O banco divulga relatórios anuais sobre a situação financeira dos 20 times da primeira divisão do futebol brasileiro. A partir desses dados, desenvolveu as melhores práticas de gestão para desenvolver não apenas os balanços dos times, mas também a qualidade dos jogos.
Entre os tópicos levantados, está a transparência dos times em relação às suas finanças, já que muito do sucesso da entidade diz respeito a seus torcedores.
Os clubes de futebol surgiram de dentro de clubes sociais, mas cresceram muito desde então. “Para que essas entidades tivessem o tamanho que têm hoje, elas conquistaram o torcedor de fora, que hoje é o grande dono do clube”, afirma Grafietti.
Outras dicas falam sobre o planejamento a longo prazo. Isso é especialmente difícil dada a configuração administrativa do clube, já que o presidente muda a cada dois anos. “As gestões não conseguem ser perenes e estáveis, o que prejudica o futuro do time”, afirmou ele.
Confira quais são as 10 melhores práticas financeiras para clubes de futebol.
Antes de tudo, um clube precisa saber quanto pretende gastar. É importante desenvolver orçamentos abertos aos associados e torcedores apresentando qual a estimativa de receitas, custos e investimentos.
Dessa forma, no início de cada ano todos sabem de antemão o que esperar de cada clube, se há dinheiro disponível para contratações e investimentos ou se o time pretende arrumar a casa.
As organizações são obrigadas a apresentar o orçamento a cada ano. No entanto, o ideal seria que o acompanhamento fosse trimestral, como as empresas de capital aberto.
Dessa forma, todos podem acompanhar se os gastos e receitas estão de acordo com o orçamento apresentado no início do ano.
Cada novo presidente de clube quer fazer uma gestão vitoriosa. Por isso, acaba gastando muito com contratações caras e pedem adiantamento de publicidade ou patrocínio ou empréstimos aos bancos, diz Grafietti.
Os gastos com salários e contratações deveriam ser, no máximo, se igualar às receitas, para garantir que o restante possa ser usado para quitar dívidas.
Essa é uma das táticas mais polêmicas e complicadas entre as sugeridas pelo economista do Itaú BBA. A ideia é ajustar os salários dos jogadores da mesma forma como no mundo corporativo, ajustando pagamentos adicionais por performance que gere resultado financeiro, como títulos e classificações.
No entanto, isso só seria possível se todos os times seguissem a mesma mudança. Se um time mantiver a prática atual de pagamento, os jogadores trocariam seus times por esse. “Como os clubes não pensam em conjunto, não existem práticas comuns ao mercado”, afirma o economista.
Assim como em uma empresa, os clubes deveriam ter uma identidade, um jeito de jogar específico. “Quando o Barcelona entra em campo, por exemplo, todos sabem como ele vai jogar e o que esperar da partida. Todos os jogadores têm a mesma filosofia”, afirma ele.
Para alcançar essa unidade, o time precisa trabalhar nas categorias de base e profissional de forma alinhada, ao utilizar os mesmos conceitos táticos.
Criar uma cultura corporativa só é possível se o time investir na categoria de base. Esse ponto deveria ser mandatório, diz o Itaú BBA, pois formará o jogador que será a base do elenco. O investimento também é muito mais barato do que a contratação de um jogador já “pronto”.
Ao formar o atleta desde o começo de sua carreira, o time pode desenvolver sua cultura esportiva. De acordo com Grafietti, o São Paulo é um bom exemplo de investimentos na base.
A criação de uma cultura e o investimento de base culminam com a necessidade de pensar o futuro da organização a longo prazo. No entanto, a troca de treinadores e de presidência em poucos anos levam as organizações a pensarem apenas no curto prazo. “Quem se preparar para o futuro provavelmente não estará no time para colher os frutos”, afirmou o especialista.
Para ele, o Flamengo é um exemplo de como um time conseguiu se planejar para o futuro há alguns anos e, hoje, está colhendo esses frutos.
Os times precisam se afastar do torcedor que a arranha a imagem do clube. De acordo com Grafietti, a torcida organizada traz poucos benefícios financeiros ao clube, já que os membros consomem marcas próprias de uniforme e têm descontos nos ingressos.
Do outro lado, o clube deveria focar em ações que atraem a torcida “comum”, que traz mais receita e que irá garantir a sobrevivência do clube no longo prazo. Um bom exemplo é o programa de sócio torcedor do Palmeiras, afiram.
O clube deve ser responsável pela formação do atleta, pela avaliação e pesquisa de mercado para contratações.
Além disso, deveria criar Comissões de Contratações para discutir junto com a Comissão Técnica a real necessidade de uma contratação após avaliar o elenco atual e as possibilidades da base.
Essas medidas deixariam o clube mais independente dos empresários dos jogadores, que podem colocar obstáculos na relação entre time e atleta, empregador e empregado, diz o banco.
Os conselheiros do time também merecem uma atenção especial. De acordo com Grafietti, os clubes têm uma estrutura anacrônica com função meramente política que são os Conselhos Deliberativos. A estrutura de Conselhos de Administração, que trabalham trazendo sugestões e recomendações de ações do dia a dia, pode trazer uma visão arejada e sem vínculos políticos.