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Schwartsman propõe solução brasileira para Europa

Para ex-diretor do BC, o plano que saneou as dívidas dos estados brasileiros na década de 90 poderia servir de base para o resgate da Grécia e outros PIIGS

Alexandre Schwartsman: os políticos europeus terão de entender que será necessário assumir as dívidas da Grécia (Germano Lüders/EXAME.com)

Alexandre Schwartsman: os políticos europeus terão de entender que será necessário assumir as dívidas da Grécia (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 14 de julho de 2011 às 07h36.

São Paulo – Nesta semana, ficou claro para o mercado financeiro que a Europa precisa colocar em prática com urgência um plano que evite que a crise que já derrubou países como a Grécia e a Irlanda atinja economias consideradas até há alguns dias mais sólidas, como Espanha e Itália. Após várias reuniões, no entanto, os líderes europeus ainda parecem longe de chegar a um consenso sobre a melhor forma de dividir as perdas inevitáveis de qualquer processo de reestruturação de dívida.

Para Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, a única alternativa ao calote grego - e eventualmente de outros países do bloco conhecido como PIIGS (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha) - é um plano que preveja a troca dos títulos de dívida de países muito endividados por papéis emitidos pelo bloco europeu. A contrapartida seria um compromisso de ajuste fiscal rigoroso nos países resgatados.

A proposta reduziria o endividamento total, diminuiria as despesas com juros e resgataria a confiança do mercado nos países periféricos da Europa – em uma solução semelhante à que foi adotada pelo governo federal brasileiro na década de 1990 para sanear as finanças dos estados mais endividados. Leia abaixo os principais trechos do depoimento de Schwartsman a EXAME.com:

A ideia de trocar a dívida grega ou de outros países excessivamente endividados por uma dívida europeia não é nova. Isso seria uma solução semelhante à que foi dada para sanear as contas dos estados brasileiros na segunda metade da década de 1990. Naquela época, estados bastante endividados como Minas Gerais e São Paulo podiam vender títulos ao mercado. Os investidores entendiam que os estados ofereciam um risco de crédito superior ao do governo federal e cobravam juros mais altos para rolar os débitos.

O que foi feito para reduzir o custo da dívida dos estados e que poderia copiado pela Europa? O governo federal, que era visto como mais confiável pelos investidores, assumiu as dívidas dos estados. Quem detinha os títulos estaduais entregou os papéis ao governo federal, que deu em troca papéis da União. O risco para o investidor era considerado menor no mercado e, portanto, os juros cobrados podiam ser mais baixos. Já a União passou a ser credora dos estados e refinanciou as dívidas. Os estados passaram a pagar ao governo federal juros de IGP-M mais 6% ao ano. Na época, isso era um subsídio aos estados porque o juro médio era bem mais alto que o atual.

Em troca do acordo, os estados tiveram de assumir uma série de compromissos fiscais. Eles foram obrigados a colocar o orçamento em ordem e comprometer até 15% da receita líquida com o serviço da dívida. Foi uma imposição de austeridade aos estados. Se eles não cumprissem as exigências, o governo federal podia suspender repasses de tributos. Nesse mesmo contexto, bancos estaduais foram federalizados e privatizados. As receitas com as privatizações abatiam o montante que deveria ser pago à União.

Os paralelos entre a situação brasileira na década de 90 a atual na Europa são claros. É lógico que muita coisa precisaria ser adaptada. Não existe uma federação europeia, por exemplo. Mas existe um fundo de estabilização europeu, que tem 440 bilhões de euros e foi criado para tranquilizar o mercado em relação ao risco da dívida individual de cada país. Esse fundo poderia ser usado como embrião para a troca da dívida. Seria necessário fazer uma injeção de recursos para capitalizar o fundo, o que envolveria um rateio proporcional entre todos os países da União Europeia. Estamos falando de um caminhão de dinheiro, mas acho que é algo que cabe dentro do PIB europeu.


O fundo pegaria esse dinheiro e faria um leilão para trocar títulos gregos com deságio por títulos europeus. Hoje os títulos gregos são negociados com desconto de 50% sobre o valor de face. O resultado desse leilão provavelmente seria um percentual maior do que esse porque os investidores cobrariam um pouco a mais para aceitar o plano. Daria 60% do valor de face, por exemplo. O fundo passaria a ser o credor do governo grego e ficaria com algo próximo à totalidade da dívida do país. Os juros da dívida seriam então renegociados para que passassem a caber no orçamento do governo grego. Seriam taxas equivalentes às pagas pelo governo alemão mais um spread justo.

É óbvio que, em troca da boa vontade, a Grécia precisaria dar contrapartidas, fazer superávit primário, privatizar estatais, dar patrimônio em garantia... Voltando ao caso do Brasil, o governo federal tinha poder para suspender repasses e obrigar os estados a cumprir o acordo. A Europa também exigiria mais controle sobre as finanças da Grécia. Mas com o desconto no valor de face dos títulos, a redução dos juros e o cumprimento de um superávit primário, a Grécia voltaria a ser solvente.

O principal problema do plano é vender a ideia ao eleitor alemão, holandês, finlandês... Os países que estão em melhor situação teriam que ajudar a financiar a constituição do fundo que compraria a dívida grega. Não vejo muita disposição desses países até agora. É possível argumentar à população que não haverá subsídio, já que os juros pagos pela Grécia serão maiores que a taxa alemã, por exemplo. Mas ainda assim é uma medida impopular.

Em primeiro lugar, será necessário garantir que Grécia, Portugal ou Irlanda cumpririam exatamente o que foi acordado. É algo que exige uma confiança mútua e, por isso, politicamente difícil de aprovar. De um lado, o político alemão tenta evitar essa solução a todo custo. Do outro, a Grécia terá de aceitar dar empresas estatais como garantia do cumprimento do acordo. Eles vão ter que oferecer o Parthenon [risos]. O país também se comprometeria a permanecer dentro da União Europeia. Não vai ser nada tranquilo convencer o povo grego que esse é o melhor caminho.

Ainda há outro problema a ser avaliado. Muita gente vai ganhar e perder dinheiro com esse plano. Quem comprou os títulos da Grécia pelo valor de face terá um enorme prejuízo. Já quem comprar os papéis por 50% e vendê-los por 60% do valor de face terá um belo lucro. Então a ajuda a quem investiu em títulos gregos ou irlandeses embute um risco moral. O leilão é uma forma de minimizar esse problema porque obriga o investidor a aceitar um deságio, mas haverá críticas.

Neste momento, no entanto, não há alternativa. A Alemanha fica tentando empurrar a conta para o setor privado, mas não vai dar certo. Uma hora ou outra, os políticos terão de enxergar isso. Sem esse plano, a Grécia não terá como pagar a dívida e pedirá moratória. A Irlanda também está em uma situação bem complicada e poderia seguir o mesmo caminho. Portugal não está tão ruim, mas também precisa fazer algo. É hora de ser pragmático e evitar um novo Lehman Brothers. Se houver uma solução rápida para a dívida dos países periféricos, provavelmente o mercado vai enxergar com menos ceticismo a situação de vizinhos como a Itália. Então não vejo outro saída para a Europa que não seja um plano parecido com o brasileiro adaptado à realidade deles.

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