Rússia desafia Ucrânia ao enviar comboio sem permissão
Os 262 caminhões, cuja carga não foi revisada nem certificada totalmente pelas autoridades da Ucrânia, já chegaram a seu destino, a cidade de Lugansk
Da Redação
Publicado em 22 de agosto de 2014 às 17h38.
Kiev - A Rússia deixou de lado a diplomacia nesta sexta-feira e enviou um comboio com ajuda humanitária ao leste da Ucrânia sem a permissão das autoridades ucranianas nem apoio da Cruz Vermelha , em um aberto desafio a Kiev.
Os 262 caminhões, cuja carga não foi revisada nem certificada totalmente pelas autoridades da Ucrânia, já chegaram a seu destino, a cidade de Lugansk, sitiada pelas tropas ucranianas em sua luta contra os separatistas pró-Rússia e à beira de uma catástrofe humanitária.
"Já começou a retirada da ajuda humanitária (de dentro dos caminhões), que depois será distribuída entre os moradores", disse aos jornalistas um porta-voz da administração municipal de Lugansk, órgão eleito democraticamente muito antes da rebelião pró-russa no leste da Ucrânia.
Em uma conversa por telefone com a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, "ressaltou que devido aos indissimulados impedimentos de Kiev no assunto da ajuda russa à população do leste da Ucrânia que sofre uma catástrofe humanitária, foi tomada a decisão de enviar o comboio", informou o Kremlin.
Após denunciar hoje de manhã vários pretextos da Ucrânia para impedir o envio da ajuda, a Rússia foi além do procedimento negociado com Kiev e a Cruz Vermelha e ordenou que os veículos entrassem em território ucraniano.
Pouco a pouco, todos os caminhões russos atravessaram a fronteira e entraram em território controlado pelos separatistas pró-Rússia, que escoltaram o comboio ao longo dos 70 quilômetros que separaram a passagem fronteiriça ucraniana "Izvarino", em Lugansk.
A chegada do comboio a seu destino mostra que os dois lados da disputa, que combatiam poucas horas antes na mesma estrada que chega à fronteira com Lugansk, permitiram que a carga chegasse sem incidentes à cidade na qual permanecem 200 mil civis.
O fator essencial para evitar sobressaltos passou por uma conversa telefônica entre o chefe da administração da presidência russa, Sergei Ivanov, e seu equivalente ucraniano, Boris Lozhkin, na qual ambos apostaram em "um rápido (...) envio da ajuda humanitária russa, sem incidentes nem provocações", segundo um comunicado do Kremlin.
Apesar da violação, por parte de Moscou, dos acordos alcançados anteriormente, independentemente dos impedimentos e desculpas da parte ucraniana para reter o comboio, as autoridades de Kiev optaram pelo pragmatismo para lidar com esta situação, pelo menos até a chegada do comboio a Lugansk, e descartaram o uso da força militar para detê-lo.
O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional e Defesa da Ucrânia (CSND), Andrei Lisenko, disse que Kiev tenta resolver a crise por meios diplomáticos, e deu a entender que a Ucrânia será reservada em sua reação se constatar que o comboio transporta realmente ajuda humanitária.
"Se no conteúdo do comboio forem descobertos outros objetos ou aparelhos de caráter não humanitário, a reação será outra", disse Lisenko, que também advertiu que toda a responsabilidade sobre a segurança dos caminhões está a partir de agora sobre a Rússia.
Apenas os 34 primeiros caminhões foram revisados e certificados pelos guardas de fronteira e alfandegários ucranianos, que não puderam comprovar o conteúdo do pelo menos outros 110 veículos.
A Guarda de Fronteira da Ucrânia, que deslocou dezenas de seus soldados à passagem "Donetsk" para participar da análise da carga, denunciou que seu trabalho e o dos funcionários da alfândega ucraniana foi impedido por seus equivalentes russos.
Quem reagiu com graves acusações contra Moscou e inclusive a Cruz Vermelha foi o chefe do Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU), Valentin Nalivaichenko, que chamou de "invasão" a entrada do comboio humanitário russo em território ucraniano.
O chefe do SBU não hesitou em afirmar que parte dos caminhões são conduzidos por militares russos cujo objetivo é sequestrar cidadãos ucranianos, ocultar os crimes dos milicianos pró-Rússia e dirigir os blindados fornecidos por Moscou.
Lisenko também se uniu às acusações contra a Rússia e denunciou a entrada na Ucrânia de outros 20 caminhões russos através da mesma passagem fronteiriça "Izvarino" pelo qual chegou o comboio humanitário.