Relatório do FBI alertou que extremistas do Capitólio estavam "prontos para guerra"
Na primeira audiência no Senado sobre o tema, ex-encarregados da segurança no Congresso nos EUA admitiram falhas durante a invasão do Capitólio
Carolina Riveira
Publicado em 23 de fevereiro de 2021 às 19h24.
A invasão do Capitólio em 6 de janeiro expôs as fragilidades de segurança e inteligência do Congresso nos Estados Unidos . Essa foi uma das conclusões após falas de funcionários da segurança em audiência no Senado nesta terça-feira, 23, a primeira sobre o caso.
Os chefes da segurança no Capitólio, que renunciaram aos cargos após o episódio, criticaram agências federais, como o Departamento de Defesa e a Guarda Nacional, por não terem previsto a dimensão do ataque.
Entre as falhas reveladas está o fato de que, na véspera do ataque, o FBI, unidade de segurança e inteligência americana, enviou à polícia do Congresso um relatório alertando que grupos extremistas se dirigiam a Washington e que estavam "prontos para a guerra". O documento, no entanto, não chegou às mãos dos superiores.
Os depoimentos também revelaram que os militares, após os protestos começarem, foram "relutantes" em enviar tropas da Guarda Nacional para defender o Congresso, mesmo quando ficou claro que a situação havia se deteriorado.
Nas falas hoje, os agentes admitiram que foram pegos de surpresa com a dimensão do ataque. Os testemunhos demonstraram que os agentes foram superados em número pelos invasores, que estavam armados e agiam de forma coordenada, na visão dos agentes.
Segundo os depoimentos, o nível de ameaça da manifestação de 6 de janeiro foi classificado como "remoto" ou "improvável" antes do episódio, apesar de grupos extremistas, como os Proud Boys, terem deixado claro em suas declarações que viajariam a Washington para causar problemas.
"Estes criminosos vieram preparados para a guerra", disse o ex-chefe da polícia do Capitólio, Steven Sund.
Em um primeiro momento, Sund garantiu que "nenhuma entidade, inclusive o FBI", havia indicado "que haveria um ataque violento" e nessas dimensões. No entanto, durante a audiência de mais de quatro horas, Sund admitiu que a Polícia do Capitólio de fato recebeu um relatório do FBI sobre a ameaça de violência, mas que ele não chegou a ver o documento na época.
Sund renunciou ao cargo após os distúrbios, que deixaram cinco mortos, inclusive um policial. Outros dois agentes se suicidaram pouco depois.
Polícia "superada"
O sargento encarregado da Câmara dos Deputados, Paul Irving, e seu colega a cargo da segurança no Senado, Michael Stenger, também deixaram os cargos.
Na audiência, Irving afirmou que os dados de "inteligência não apontaram para um ataque coordenado contra o Capitólio e tampouco isso foi mencionado em nenhuma das discussões entre agências às quais eu assisti nos dias prévios ao ataque".
Em 6 de janeiro, o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dirigiu-se a seus seguidores, que se manifestavam perto da Casa Branca e os convocou a marchar até o Congresso e "lutar como o demônio".
Os incidentes, atiçados pelas reiteradas afirmações de Trump de que houve fraude nas eleições, visavam a interferir na certificação da vitória de Joe Biden, que acontecia no mesmo dia e terminou sendo interrompida.
Robert Contee, comandante interino da polícia de Washington, relatou que naquele dia, os agentes estavam literalmente "lutando por suas vidas" no Capitólio.
Além disso, admitiu ter ficado "atônito" diante da "reticência" do Departamento do Exército em enviar efetivos da Guarda Nacional para proteger o Congresso.
Os oficiais que participaram da audiência concordaram na necessidade de uma revisão profunda sobre a troca de informação de Inteligência, operações e procedimentos internos para determinar reformas que apontem a evitar que situações como as de 6 de janeiro se repitam.
"O pior do pior"
O presidente da Comissão de Segurança Interna do Senado, o democrata Gary Peters, descreveu o dia como "um dos mais sombrios" da história do país e afirmou que os problemas de segurança no Capitólio marcaram "uma falha sistemática e de liderança", que deve ser corrigida.
Os legisladores também ouviram o depoimento estremecedor da capitã da polícia Carneysha Mendoza, que entre outras coisas relatou como tentou conter um grupo de invasores.
"De verdade foi o pior do pior", pois os manifestantes usaram gás lacrimogêneo nos enfrentamentos com a polícia, disse Mendoza, que sofreu queimaduras químicas na pele que ainda não se curaram.
"Poderíamos ter tido dez vezes a quantidade de pessoas que tínhamos e acho que ainda assim a batalha teria sido igualmente devastadora", afirmou.