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Projetos urbanísticos estão na origem dos protestos turcos

Foi em um pequeno espaço verde, com cerca de 600 árvores no coração do lado europeu de Istambul, que teve início o movimento de protesto


	Protestos em Istambul: Por trás desses grandes projetos, como os mais discretos de reabilitação urbana, muitos denunciam o domínio de determinados grupos econômicos ligados ao AKP sobre a cidade.
 (Stoyan Nenov/Reuters)

Protestos em Istambul: Por trás desses grandes projetos, como os mais discretos de reabilitação urbana, muitos denunciam o domínio de determinados grupos econômicos ligados ao AKP sobre a cidade. (Stoyan Nenov/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 3 de junho de 2013 às 16h56.

Istambul - Os grandes projetos urbanísticos do primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, estão na origem da contestação que sacode Istambul há quatro dias, com manifestantes que se mobilizam para preservar sua cidade dos interesses econômicos e ideológicos do governo.

Foi em um pequeno espaço verde, com cerca de 600 árvores no coração do lado europeu de Istambul, que teve início o movimento de protesto que se espalhou por todo o país e simbolizou o descontentamento em relação ao governo.

As primeiras manifestações aconteceram no parque Gezi para impedir a construção no local da réplica de uma caserna militar do império otomano, que deve abrigar um centro cultural, um centro comercial e, como Erdogan ressaltou no domingo, uma mesquita.

"Podemos ver claramente a síntese entre o liberalismo e o islamismo do governo: de um lado ele fala em construir um grande centro comercial e, de outro, fala em construir uma esplêndida mesquita que simbolizará a glória da sociedade muçulmana", considera Simten Cosar, cientista político da Universidade de Hacettepe (Ancara).

O símbolo ganha mais força pelo fato de o parque Gezi estar localizado nos arredores da Praça Taksim, que por décadas foi o local de manifestação de todas as lutas sociais.

"Trata-se de transformar Taksim em um local mais conservador, mais capitalista. Trata-se de um acerto de contas com a corrente reformista", confirma o urbanista Murat Cemal Yalçintan, da Universidade Sinan.

O governo também lançou um projeto de construção de uma gigantesca mesquita com uma capacidade de 30.000 lugares na mais alta colina de Istambul, Camlica, com vista para todo Bósforo.


E para além do parque Gezi e da construção de mesquitas, Erdogan e seu Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) têm outras ambições para Istambul.

Ao norte da cidade, o primeiro-ministro lançou oficialmente na semana passada a construção de uma terceira ponte ligando as duas margens do Bósforo, por um valor de cerca de 3 bilhões de dólares.

A ponte deve integrar um gigantesco projeto que inclui a construção de um imenso aeroporto --que poderá receber até 150 milhões de passageiros por ano--, a de um canal ligando o Mar Negro ao Mar de Marmara para aliviar o Bósforo e de duas novas cidades, cada uma com um milhão de habitantes, às margens deste canal.

"O objetivo deste projeto é a abertura de novas terras para a construção", alerta Tayfun Kahraman, presidente da Câmara dos Urbanistas de Istambul, que instalou uma tenda no parque Gezi.

"Na cidade, não há mais terras aptas à construção. É por isso que o Estado privatiza todos os terrenos públicos e aprova projetos gigantes de infraestrutura que devem permitir declarar novos terrenos construíveis", acrescenta Kahraman, lamentando a provável destruição das florestas do norte de Istambul, "uma riqueza natural de importância vital para a cidade".


Por trás desses grandes projetos, como os mais discretos de reabilitação urbana, muitos denunciam o domínio de determinados grupos econômicos ligados ao AKP sobre a cidade.

"Está claro que o projeto de reabilitação urbana não foi concebido para proporcionar melhores condições de moradia para as pessoas, mas para mudar de mãos alguns título de propriedade", comenta Sami Yilmaztürk, secretário-geral da Ordem dos Arquitetos de Istambul .

Ele lembra que, em muitos bairros "remodelados", os moradores mais pobres foram forçados a procurar uma nova casa nos arredores da cidade, dando lugar a uma população mais abastada, para a alegria das imobiliárias.

"Há muitos exemplos em Istambul, onde terrenos municipais foram vendidos e, em seguida, tiveram seu plano de ocupação da terra modificados para permitir a construção de grandes arranha-céus. Há enormes interesses financeiros, que envolvem grupos bem definidos", indica, por sua vez, Kahraman.

"As pessoas estão conscientes e reagem muito fortemente a isso", diz o urbanista, considerando que "os moradores de Istambul querem tomar posse de sua cidade."

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