Presidente da Itália decide dissolver Parlamento e país terá eleições antecipadas
Após a renúncia do primeiro-ministro, Mario Draghi, o presidente italiano concluiu que não havia apoio suficiente para um novo governo no atual Parlamento
Carolina Riveira
Publicado em 21 de julho de 2022 às 13h35.
Última atualização em 22 de julho de 2022 às 00h31.
O presidente italiano, Sergio Mattarella, decidiu por dissolver o Parlamento da Itália e convocar novas eleições nesta quinta-feira, 21, após concluir que não há apoio suficiente para formar um novo governo na atual coalizão.
A decisão veio após a renúncia do primeiro-ministro Mario Draghi, que renunciou na madrugada desta quinta-feira, diante de um racha na coalizão de governo.
Com a decisão de Mattarella, a Itália terá, então, suas eleições antecipadas. As eleições precisam acontecer dentro de 70 dias, segundo a Constituição.
Originalmente, o pleito estava marcado para junho de 2023.
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Enquanto as eleições não ocorrem, um gabinete de transição continuará sendo liderado por Draghi, que é ex-presidente do Banco Central Europeu e chegou ao cargo máximo da Itália em 2021.
Com a renúncia do premiê hoje, os parlamentares precisariam entrar em um acordo para encontrar um novo líder que mativesse a coalizão por mais um ano até as eleições originais. Mas Mattarella afirmou nesta quinta-feira que as dificuldades de Draghi em obter unidade no Parlamento mostraram que não havia "nenhuma possibilidade" de que um governo pudesse ser formado, ainda que se trocasse o líder.
Como começou a crise na Itália
Draghi já havia apresentado uma primeira renúncia no fim da semana passada, depois que o Movimento 5 Estrelas (M5S), grupo relevante em sua coalizão, boicotou uma votação do governo no Senado, abrindo de vez o racha na base governista.
O M5S, que cresceu durante a crise da zona do euro nos anos 2010 com pautas antissistema, vem criticando Draghi pela inflação alta na Itália e pelo apoio à Ucrânia na guerra com a Rússia.
O presidente Mattarella rejeitou a primeira renúncia de Draghi na semana passada, e pediu que o premiê tentasse obter apoio e falasse novamente ao Senado na quarta-feira, 20. A expectativa era que, durante esse período, houvesse um novo acordo capaz de dar força à permanência de Draghi no governo, o que não ocorreu.
Ontem, Draghi novamente ganhou uma votação de confiança sobre seu governo no Senado, mas três grupos políticos se abstiveram de apoiar o governo: o M5S voltou a se abster, e foi acompanhado pelo Liga Norte, de Matteo Salvini, de extrema-direita, e pelo Forza Italia, do ex-premiê de direita Silvio Berlusconi.
A rejeição dos três grupos sinalizou que o governo poderia ficar inviável na prática, o que levou Draghi a renunciar novamente, desta vez com sua saída aceita pelo presidente Mattarella.
O sistema político na Itália é parlamentarista, com o presidente chefe de Estado, mas o primeiro-ministro chefe de Governo, tendo de ter uma coalizão que forme maioria no Parlamento.
Como presidente, Sergio Mattarella tem somente a prerrogativa de aceitar renúncia dos premiês e, a partir daí, pedir ao Parlamento que forme uma nova coalizão ou convocar novas eleições.
A opção por eleições antecipadas era vista por boa parte da elite política como problemática para a estabilidade do país, criando turbulências na política e na economia italianas em um momento altamente delicado. No entanto, a continuidade de uma coalizão sem liderança definida e com pouco apoio poderia deixar o governo italiano em um "limbo" até o ano que vem, o que levou Mattarella a optar por convocar eleições.
Situação econômica preocupa
A saída de Draghi, visto como figura de credibilidade pelos mercados, aumenta as incertezas sobre a situação econômica na Itália, cuja dívida chega a 150% do PIB e com riscos que podem piorar com a alta dos juros, afetando toda a zona do euro.
Para além da crise política em casa, a Itália, terceira maior economia da União Europeia, está também no centro da crise econômica e energética em meio à guerra na Ucrânia.
A inflação italiana superou 7%, puxada pela alta nos preços de energia que afetam toda a Europa com a guerra.
O país recebe 40% de seu gás importado da Rússia, um dos países com maior dependência. A Itália já teve significativa redução de fornecimento russo neste ano, no que é visto como uma retaliação do governo Vladimir Putin contra membros da União Europeia pelo apoio à Ucrânia.
Com a inflação em alta em toda a Europa, a sucessora de Draghi no Banco Central Europeu, Christine Lagarde, confirmou nesta quinta-feira o primeiro aumento da taxa de juros da zona do euro em mais de uma década.
Draghi assumiu o governo da Itália em 2021, sendo um nome já conhecido na Europa por seu período à frente do Banco Central Europeu (BCE), de 2011 a 2019, liderando a resposta europeia durante a última crise do euro nos anos 2010.
O ex-banqueiro chegou ao governo italiano sem experiência prévia na política, mas sendo escolhido para liderar a coalizão em meio a uma busca italiana por estabilidade e reformas econômicas após sucessivas crises.
O fim do acordo no governo também pode afetar o recebimento pela Itália de recursos do pacote de mais de € 700 bilhões da União Europeia, destinado à recuperação econômica pós-pandemia. A Itália tinha novos recursos do plano europeu para receber nas próximas semanas.
O novo cenário de juros fará a Itália enfrentar custos mais altos para refinanciar sua dívida, tornando o país mais arriscado aos investidores e aumentando os desafios na União Europeia.