Queimada na Amazônia: floresta está entre as quatro maiores regiões do globo em termos de queima de biomassa (Manoel Marques/VEJA)
Da Redação
Publicado em 1 de outubro de 2012 às 09h31.
São Paulo - Para entender como as emissões de queimadas na <a href="https://exame.com/noticias-sobre/amazonia" target="_blank"><strong>Amazônia </strong></a>estão alterando o clima local e de todo o planeta, um grupo de pesquisadores brasileiros e britânicos tem sobrevoado a região desde o dia 12 de setembro.</p>
Com o auxílio de equipamentos de ponta, os cientistas coletam dados sobre a composição química e as propriedades físicas da fumaça emitida. Verificam ainda de que forma os gases e as partículas sólidas lançados no ar modificam a composição das nuvens, alteram a química da atmosfera e interagem com a radiação solar.
“Foram realizadas 35 horas de voo até o momento. Nossa meta é chegar entre 60 e 70 horas até 5 de outubro, quando termina a fase de coleta de dados”, disse Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos coordenadores do projeto South American Biomass Burning Analysis (SAMBBA).
O SAMBBA, resultado de uma parceria entre a USP, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a Universidade de Manchester, no Reino Unido, e o serviço meteorológico britânico, conhecido como UK-Met-Office, foi destaque esta semana na sessão de notícias do site da revista Nature.
A iniciativa conta com apoio do Natural Environment Research Council (Nerc), da Inglaterra, que ajudou a financiar a aeronave. Os equipamentos usados na coleta de dados foram cedidos por diversas universidades britânicas.
No Brasil, os experimentos estão sendo financiados pela Fapesp, por meio de dois projetos de Auxílio à Pesquisa – Regular, um coordenado por Artaxo e outro por Karla Longo, do Inpe.
“O projeto teve origem em uma cooperação já existente há vários anos entre Inpe e UK-Met-Office para o desenvolvimento de modelos de previsão climática”, contou Longo.
Tanto os pesquisadores britânicos como os brasileiros, acrescentou Longo, sentiam a necessidade de melhorar a previsibilidade dos modelos para a região amazônica. “Ainda não é bem conhecido o impacto das queimadas na previsão do clima”, disse.
Ben Johnson, do Met Office do Reino Unido, destaca que a Amazônia está entre as quatro maiores regiões do globo em termos de queima de biomassa. “Realizamos experimentos semelhantes em países como Canadá e África do Sul. As previsões de nosso serviço de meteorologia abrangem todo o globo e esperamos, com esses dados da América do Sul, melhorar a qualidade das previsões”, disse.
Planejamento
Uma grande equipe de cientistas participa do planejamento das missões de coleta de dados, que abrangem a maior parte da Bacia Amazônica, contou Artaxo.
Para isso, são analisados dados de satélites, projeções feitas pelos modelos climáticos já existentes e informações da Aerosol Robotic Network (Aeronet) – uma rede que, em parceria da USP com a Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, faz medições frequentes da coluna de aerossóis, as partículas sólidas da fumaça, sobre a Amazônia.
“Combinamos todas essas informações para decidir aonde voar e que tipo de voo fazer. Podemos fazer medições a 150 metros de altitude, para analisar as propriedades da fumaça recentemente emitida, ou a 12 quilômetros de altitude, para ver as alterações físico-químicas sofridas pela fumaça envelhecida e transportada pela convecção”, explicou Artaxo.
O avião de pesquisa, um grande jato de quatro motores, é equipado com instrumentos como espectrômetros de massa, monitores de ozônio, gases de efeito estufa e fotômetros de absorção e espalhamento de luz. Há também o equipamento Lidar, um laser que mede a distribuição vertical de partículas de aerossóis a cada segundo.
“Os equipamentos conseguem fazer medidas extremamente precisas e em alta resolução temporal. No caso dos gases de efeito estufa (CO2, CH4, N2O), por exemplo, a margem de incerteza é de 0,1%”, disse Artaxo.
Segundo o pesquisador, estão sendo analisadas tanto as emissões resultantes do desmatamento quanto as relacionadas à prática de queimadas da agricultura e de manutenção de pastos.
“Embora esses dois tipos de queimadas se concentrem em regiões diferentes da Amazônia – desmatamento ao norte, na região do norte do Mato Grosso, e agricultura mais próximo da fronteira com o Cerrado –, as emissões estão relativamente perto e se misturam na atmosfera”, disse.
Um dos objetivos do estudo é avaliar a diferença entre esses dois tipos de emissões e a contribuição de cada um deles para o efeito estufa e as mudanças climáticas na região. “Medimos a quantidade de sulfato, de nitrato e de material orgânico na fumaça em tempo real. Também analisamos as propriedades físicas das partículas sólidas, como tamanho desde 10 nanômetros e os coeficientes de absorção e de espalhamento de radiação. Tudo isso está relacionado com o impacto das emissões sobre o clima e o balanço radiativo terrestre”, disse Artaxo.
O grupo também mede as concentrações de monóxido de carbono, de ozônio, de óxidos de nitrogênio e de compostos orgânicos voláteis. “Existe uma enorme gama de compostos orgânicos voláteis e muitos deles nunca foram medidos em queimadas no Brasil”, afirmou.
Após o término da coleta de dados, terá início o processo de análise da grande quantidade de informações e de aprimoramento dos modelos climáticos que, segundo os cientistas, deve durar cerca de quatro anos.
“Modelos climáticos são representações numéricas dos processos químicos e físicos que acontecem na atmosfera. É necessário, portanto, conhecer bem os fenômenos para construir um conjunto de equações que os representem de forma precisa”, destacou Longo.
Também participam da coordenação do SAMMBA os pesquisadores Hugh Coe e Saulo Freitas, da Universidade de Manchester e Inpe, respectivamente.