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O retorno dos homens da selva à civilização no Vietnã

Ho Van Thanh, de 83 anos, e seu filho Ho Van Lang, de 46, ficaram na selva por mais de 40 anos após sua casa ser bombardeada em 1972

Floresta no Vietnã: os dois homens, levados outra vez à aldeia à força em agosto de 2013, exibem um olhar perdido (Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 4 de outubro de 2015 às 11h29.

Tay Tra - Passados dois anos desde que retornaram à civilização, após quatro décadas isolados na selva de Vietnamit, Ho Van Thanh, de 83 anos, e seu filho Ho Van Lang, de 46, se adaptam com dificuldade à nova vida em uma aldeia da região central do país.

O idoso, um veterano do exército norte-vietnamita durante a Guerra do Vietnã , fugiu com seu filho quando ele tinha apenas três anos para a selva quando sua casa foi bombardeada em 1972, episódio em que morreram sua mãe e dois de seus quatro filhos.

Sua esposa sobreviveu e ficou sozinha na aldeia de Tay Tra com o filho mais novo, Ho Van Tri, que hoje cuida de seu pai e de seu irmão, perdidos durante mais de 40 anos.

"Costumava ir vê-los na selva duas vezes ao ano, levava um pacote de sal ou ferramentas e comprovava que estavam bem, mas não falava com eles porque meu pai não deixava que ninguém se aproximasse. Ele perdeu a cabeça durante a guerra e nem sabe que sou seu filho, acredita que não sobrevivi às bombas", explicou Tri à Agência Efe.

Os dois homens, levados outra vez à aldeia à força em agosto de 2013, exibem um olhar perdido em meio à modesta casa que as autoridades locais deram a eles para facilitar seu retorno à sociedade.

"A princípio, Lang se assustou por estar em um edifício de cimento. Ele só conhecia a casa que tinham em uma árvore na selva, mas já se acostumou", disse Tri.

O idoso, cego de um olho e com dificuldades auditivas, parece alheio à conversa, sentado de cócoras sobre a cama.

"Ele se nega a falar, mas o ouvimos cantar quando fica sozinho em casa", afirmou Tri.

Apesar de ter sido criado na selva, Lang se adaptou à nova vida melhor que seu pai. Não conhece o idioma vietnamita, mas fala com seus vizinhos na língua minoritária "cor" que aprendeu com seu pai e ganha algum dinheiro trabalhando no campo ou buscando lenha.

"Ele já sabia lavrar porque na selva os dois tinham uma pequena plantação", explicou Tri, que virou uma espécie de porta-voz, já que Lang só consegue ter conversas básicas.

Enquanto Tri relata as dificuldades que seu irmão viveu no princípio para aprender a se vestir (na selva só usavam tapa-sexo fabricado com folhas) ou para entender o funcionamento do dinheiro, Lang permanece sentado, com a coluna ereta e o olhar fixo e inexpressivo.

De vez em quando fecha os olhos, aborrecido por uma conversa que não entende, e apenas interpela seu irmão uma vez em mais de duas horas.

"À tarde quero ir colher folhas de chá para ferver", comentou. O chá é uma de suas descobertas desde que voltou à civilização, mas sua verdadeira predileção são biscoitos, macarrão e cigarros.

"Na selva, ele fumava o tabaco que cultivava, mas agora prefere os cigarros normais. Adaptou-se muito bem à nova comida e não quer voltar à selva", disse Tri.

Se há algo que ainda o fascina dois anos após sua chegada à cidade é a televisão.

"No começo ele ficava olhando o aparelho, sem se atrever a tocá-lo. Agora já sabe ligá-lo e passa várias horas ao dia vendo filmes ou shows musicais. Não entende o idioma, mas gosta de ver as imagens", contou Tri.

Com outras novidades, a adaptação foi mais complicada, especialmente as motos, cujo barulho do motor causava pavor.

"Agora já anda como passageiro, mas não se atreve a conduzí-las", disse o irmão.

Os aldeões o tratam com condescendência, como um menino de 46 anos, e dão por certo que há coisas que nunca aprenderá.

Embora se reúna com companheiros de lavoura, ele é proibido de provar cerveja ou outras bebidas alcoólicas por recearem que perca o controle.

"Uma vez bebeu um pouco e começou a dizer coisas sem sentido", relatou Tri.

Lang também não sabe ler e todos aceitam que é tarde demais para ensiná-lo.

Quando perguntado se desde seu retorno se relacionou com alguma mulher ou cogitou formar uma família, os curiosos ao redor de sua casa durante a entrevista caíram na gargalhada.

Seu irmão Tri também sorri e responde em seu nome: "Alguma vez comentou algo a respeito, mas já é velho demais. Além disso, nenhuma mulher da cidade se interessou por ele".

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Tay Tra - Passados dois anos desde que retornaram à civilização, após quatro décadas isolados na selva de Vietnamit, Ho Van Thanh, de 83 anos, e seu filho Ho Van Lang, de 46, se adaptam com dificuldade à nova vida em uma aldeia da região central do país.

O idoso, um veterano do exército norte-vietnamita durante a Guerra do Vietnã , fugiu com seu filho quando ele tinha apenas três anos para a selva quando sua casa foi bombardeada em 1972, episódio em que morreram sua mãe e dois de seus quatro filhos.

Sua esposa sobreviveu e ficou sozinha na aldeia de Tay Tra com o filho mais novo, Ho Van Tri, que hoje cuida de seu pai e de seu irmão, perdidos durante mais de 40 anos.

"Costumava ir vê-los na selva duas vezes ao ano, levava um pacote de sal ou ferramentas e comprovava que estavam bem, mas não falava com eles porque meu pai não deixava que ninguém se aproximasse. Ele perdeu a cabeça durante a guerra e nem sabe que sou seu filho, acredita que não sobrevivi às bombas", explicou Tri à Agência Efe.

Os dois homens, levados outra vez à aldeia à força em agosto de 2013, exibem um olhar perdido em meio à modesta casa que as autoridades locais deram a eles para facilitar seu retorno à sociedade.

"A princípio, Lang se assustou por estar em um edifício de cimento. Ele só conhecia a casa que tinham em uma árvore na selva, mas já se acostumou", disse Tri.

O idoso, cego de um olho e com dificuldades auditivas, parece alheio à conversa, sentado de cócoras sobre a cama.

"Ele se nega a falar, mas o ouvimos cantar quando fica sozinho em casa", afirmou Tri.

Apesar de ter sido criado na selva, Lang se adaptou à nova vida melhor que seu pai. Não conhece o idioma vietnamita, mas fala com seus vizinhos na língua minoritária "cor" que aprendeu com seu pai e ganha algum dinheiro trabalhando no campo ou buscando lenha.

"Ele já sabia lavrar porque na selva os dois tinham uma pequena plantação", explicou Tri, que virou uma espécie de porta-voz, já que Lang só consegue ter conversas básicas.

Enquanto Tri relata as dificuldades que seu irmão viveu no princípio para aprender a se vestir (na selva só usavam tapa-sexo fabricado com folhas) ou para entender o funcionamento do dinheiro, Lang permanece sentado, com a coluna ereta e o olhar fixo e inexpressivo.

De vez em quando fecha os olhos, aborrecido por uma conversa que não entende, e apenas interpela seu irmão uma vez em mais de duas horas.

"À tarde quero ir colher folhas de chá para ferver", comentou. O chá é uma de suas descobertas desde que voltou à civilização, mas sua verdadeira predileção são biscoitos, macarrão e cigarros.

"Na selva, ele fumava o tabaco que cultivava, mas agora prefere os cigarros normais. Adaptou-se muito bem à nova comida e não quer voltar à selva", disse Tri.

Se há algo que ainda o fascina dois anos após sua chegada à cidade é a televisão.

"No começo ele ficava olhando o aparelho, sem se atrever a tocá-lo. Agora já sabe ligá-lo e passa várias horas ao dia vendo filmes ou shows musicais. Não entende o idioma, mas gosta de ver as imagens", contou Tri.

Com outras novidades, a adaptação foi mais complicada, especialmente as motos, cujo barulho do motor causava pavor.

"Agora já anda como passageiro, mas não se atreve a conduzí-las", disse o irmão.

Os aldeões o tratam com condescendência, como um menino de 46 anos, e dão por certo que há coisas que nunca aprenderá.

Embora se reúna com companheiros de lavoura, ele é proibido de provar cerveja ou outras bebidas alcoólicas por recearem que perca o controle.

"Uma vez bebeu um pouco e começou a dizer coisas sem sentido", relatou Tri.

Lang também não sabe ler e todos aceitam que é tarde demais para ensiná-lo.

Quando perguntado se desde seu retorno se relacionou com alguma mulher ou cogitou formar uma família, os curiosos ao redor de sua casa durante a entrevista caíram na gargalhada.

Seu irmão Tri também sorri e responde em seu nome: "Alguma vez comentou algo a respeito, mas já é velho demais. Além disso, nenhuma mulher da cidade se interessou por ele".

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