O que o mundo pode esperar da América Latina em 2020?
A América Latina não teve um ano fácil. A EXAME, Ian Bremmer, Steven Levitsky, Susan Segal e Oliver Stuenkel deram suas previsões para 2020 na região
Gabriela Ruic
Publicado em 20 de dezembro de 2019 às 06h00.
Última atualização em 20 de dezembro de 2019 às 07h00.
São Paulo – 2019 não foi um ano generoso para a América Latina .
No campo econômico, a região caminhou para mais um ano decepcionante. Segundo estimativas do banco UBS, a expectativa é a de que o crescimento entre os países latino-americanos em 2019 seja de apenas 0,5%, a menor taxa entre todas as regiões do mundo e o oitavo ano consecutivo de resultados abaixo da média mundial.
Já na política, foram observadas transições de poder no Brasil e na Argentina e insatisfação popular com os governantes atingiu níveis impressionantes. Como resultado, protestos e turbulências violentas aconteceram em vários países, como no Chile e na Bolívia.
Em 2020, o que o mundo pode esperar da América Latina? Para responder essa pergunta, EXAME conversou com Ian Bremmer, cientista político e presidente do grupo Eurásia, Steven Levitsky, cientista político e professor da Universidade de Harvard, Susan Segal, economista e presidente da American Society/Council of the Americas, e o Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas e autor de livros sobre países emergentes.
Ian Bremmer
Presidente da Eurásia, a maior consultoria de riscos políticos do mundo
“Podemos esperar que 2020 seja mais um ano difícil para a América Latina. Governos vão continuar tentando equilibrar as demandas por mais gastos e melhoria dos serviços públicos dos seus eleitores, mas farão isso em um cenário muito mais desafiador, que exigirá escolhas políticas difíceis.
Isso será particularmente pronunciado na Argentina, Equador, Colômbia e no Chile. Brasil e Argentina estão em uma situação um pouco diferente, já que seus líderes gozam de popularidade e isso lhes dá mais margem para manobrar. Para que isso continue, no entanto, vão precisar de um desempenho econômico decente. ”
Steven Levitsky
Professor de Harvard e coautor do best-seller“Como as democracias morrem”
“Podemos esperar divergências. Não há apenas uma América Latina, mas muitas. É uma região grande, heterogênea, com países caminhando em direções muito diferentes. Em geral, as condições econômicas não são boas, mas caminham bem em alguns lugares (como no Chile e no Peru) e não tão bem em outros (Argentina e Venezuela). Infelizmente, a tragédia na Venezuela deve continuar, assim como em outros países andinos (Bolívia, Equador e talvez no Peru).
A violência de organizações criminosas irá continuar a ser um grande problema no México, na América Central e no Brasil. Chile e Brasil são interrogações importantes. O Brasil é uma democracia sólida que está saindo de uma tempestade de crises com um presidente autocrata. Já o Chile está passando por uma grande reforma constitucional, que poderá gerar inovações importantes para a democracia. ”
Susan Segal
Economista e presidente da organização Americas Society/Council of the Americas
“A região continua enfrentando os mesmos desafios que enfrenta há décadas: precisa de crescimento sustentável e inclusivo para que a classe média não se sinta tão fragilizada. Eu diria que esse é o maior desafio da América Latina. A queda dos preços das commodities acabou limitando o espaço para crescimento.
Sobre 2020, é preciso olhar país por país. Acho que podemos ver um pouco de crescimento no Brasil. Observamos uma tendência positiva e algumas das reformas que o governo está fazendo podem realmente ajudar a abrir mais espaço para a classe média.
A migração nunca foi um tema importante na América Latina, mas hoje é em razão do que está acontecendo na Venezuela. Também temos novos governos em alguns países e há dúvidas sobre como será a relação entre eles”.
Oliver Stuenkel
Professor de Relações Internacionais da FGV e autor de“O mundo pós-ocidental: Potências emergentes e a nova ordem global”
“A região teve a pior performance econômica do mundo e isso deve se repetir no ano que vem: não veremos uma solução para a Venezuela e teremos muitas dificuldades na Argentina, Chile e Colômbia. A situação também deve piorar mais ainda no México, cuja economia continua desacelerando.
Baixo crescimento e instabilidades vão continuar no ano que vem. Isso traz implicações para a política, já que os baixos gastos sociais em função da realidade econômica resultam em baixas taxas de aprovação dos governos.
A expectativa, portanto, é de uma região à deriva, com risco elevado de interferência crescente por atores externos, como Estados Unidos e China, algo que já vemos na questão da Venezuela. É um panorama bastante pessimista e o foco da diplomacia deverá ser redução e danos. Não é o momento de pensar em novos projetos, mas de proteger o que existe. ”