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Irmãos Kouachi, discípulos de rede islamita em Paris

Said e Cherif Kouachi, acusados do massacre no jornal Charlie Hebdo e mortos em ação policial, faziam parte de grupo muçulmano doutrinado nos anos 2000


	Cherif Kouachi (E) e seu irmão Said Kouachi: Said frequentou uma universidade fundamentalista no Iêmen
 (French Police/AFP)

Cherif Kouachi (E) e seu irmão Said Kouachi: Said frequentou uma universidade fundamentalista no Iêmen (French Police/AFP)

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Da Redação

Publicado em 9 de janeiro de 2015 às 15h02.

Paris - Os irmãos Said e Cherif Kouachi, acusados do massacre na revista satírica Charlie Hebdo e mortos em uma ação das forças de segurança no nordeste de Paris, faziam parte de um grupo de jovens muçulmanos franceses doutrinados nos anos 2000 em Paris.

Cherif, o irmão mais novo, foi condenado em 2008 a três anos de prisão, depois de ter sido detido quando ia viajar ao Iraque. Said, o mais velho, esteve em 2011 no Iêmen, onde recebeu treinamento militar, segundo fontes americanas.

Ambos estiveram vinculados à chamada rede de Buttes-Chaumont, o nome de um parque do norte de Paris, onde os integrantes faziam exercícios físicos e recrutavam combatentes para a jihad ("Guerra Santa") no Iraque.

Depois de desbaratar a rede, a polícia descreveu Cherif Kouachi como um jovem que odiava os infiéis e que tinha a intenção de agir na França.

Seus vizinhos de Gennevilliers, a noroeste de Paris, onde vivia com sua esposa, descreviam um homem serviçal e cortês.

Na mesquita da cidade, onde Cherif ia orar em algumas sextas-feiras, o responsável, Mohammed Benali, afirma que não mostrava nenhum sinal de radicalização.

No entanto, lembra que antes das eleições presidenciais de 2012 havia manifestado seu desgosto quando o imã solicitou aos fiéis que fossem votar.

Já Said frequentou uma universidade fundamentalista no Iêmen antes de receber o treinamento militar da Al-Qaeda para o manejo de armas.

Segundo um estudante que compareceu à universidade no Iêmen junto a Said, o jovem visitou pela primeira vez Sanaa em 2009. Junto a vários europeus originários do norte da África, estudou na Universidade al-Iman, um estabelecimento religioso fundado pelo clérigo fundamentalista Abdel Majid al-Zindali.

A pista de Said se perde entre 2010 e 2012, mas as autoridades de segurança do Iêmen acreditam que nesse período ele teria recebido um treinamento para o manejo de armas no sul e no sudeste do país.

Na Universidade al-Iman, Said Kouachi pedia para ser chamado de Mohammed, segundo o testemunho de um companheiro de classe que falou com a AFP sob anonimato.

"Era disciplinado, calmo e discreto", disse o estudante iemenita.

Os dois irmãos estiveram sob o cuidado dos serviços sociais entre 1994 e 2000 em um centro educacional do centro da França.

O chefe do serviço educacional do centro, Patrick Fournier, os descreveu como perfeitamente integrados e sem problemas de conduta.

Cursos do emir

Os irmãos Kouachi, franceses de origem argelina, seguiram os cursos religiosos do jovem "emir" Farid Benyettou em casas particulares ou mesquitas de Stalingrad, um bairro popular do nordeste de Paris.

A partir de 2003, Cherif seguiu os cursos de Benyettou e pouco a pouco foi se convertendo, o que o levou, entre outras coisas, a parar de fumar maconha e a respeitar os ritos religiosos, segundo fontes próximas ao caso.

Em seus cursos, Benyettou apoiava a Jihad no Iraque, um tema que tratou, em particular, com Cherif, a quem dizia que, neste contexto, o Islã considera legítimos os atentados suicidas.

"Quando Benyettou falava comigo, eu tinha a impressão que de certa maneira me dizia: 'Vê? As provas estão diante de você'", disse Cherif Kouachi aos investigadores. "Quando ele falava, tinha a impressão de que a verdade estava ali, na minha frente", contou.

Naquele momento negou qualquer intenção de agir na França e não foi processado.

No entanto, Benyettou, que o descreveu como "muito impulsivo e muito agressivo", afirmou que Cherif Kouachi teria falado "sobre sua intenção de atacar a comunidade judia em Paris antes de ir participar da Jihad".

Em 2004, manifestou a Benyettou seu desejo de viajar ao Iraque. O "emir" confiou a ele a missão de "se unir ao grupo de Abu Musab al-Zarkaui", líder naquele momento do braço iraquiano da Al-Qaeda.

Benyettou "me falou de setenta virgens e de uma grande casa no Paraíso" e de "detonar contra uma base americana um caminhão carregado de explosivos", disse Cherif.

Detenção

No entanto, Cherif, "um indivíduo indignado pelas torturas que os americanos infligiram aos iraquianos", segundo testemunhas não chegou a viajar ao Iraque.

Em 2005, foi detido antes de pegar o voo rumo à Síria, de onde viajaria ao Iraque. Disse na época que já não estava tão decidido e que havia seguido seus planos por orgulho, segundo fontes próximas ao caso.

Cherif foi finalmente condenado em 2008 a três anos de prisão.

Na prisão Cherif conheceu Djamal Beghal, uma figura do islã radical francês, que exerceu, segundo as fontes, "uma grande influência" e o levou a praticar "um Islã muito rigoroso".

Anos antes, Cherif, com a cabeça raspada e uma barba rala na foto divulgada na noite de quarta-feira pela polícia, falava de sua paixão pelo rap, como mostra um vídeo de 2004 divulgado pela televisão francesa.

Especialistas em islamismo radical acreditam que Cherif Kouachi finalmente viajou ao Iraque depois de sair da prisão, em 2010, mas esta informação não foi confirmada. Também há dúvidas sobre o local onde os irmãos Kouachi aprenderam a usar armas.

A investigação sobre a rede de Buttes-Chaumont fornece alguns elementos como resposta.

Ao que parece, Benyettou o colocou em contato com um instrutor que ensinou a ele, segundo Cherif, sobre o uso das armas.

"Explicou que havia três níveis de tiro: curto, longo ou rajadas, e os tipos de munições em um curso que durou uma hora", disse Cherif, acrescentando que também havia buscado informação na internet sobre os fuzis kalashnikov.

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