Khashoggi: o Washington Post disse que a última reportagem de Khashoggi era sobre a falta de liberdade de imprensa no mundo árabe (Divulgação/Reuters)
AFP
Publicado em 18 de outubro de 2018 às 15h25.
Os Estados Unidos decidiram dar à Arábia Saudita "mais alguns dias" para explicar o desaparecimento do jornalista Jamal Khashoggi há mais de duas semanas, reforçando a impressão de que Washington procura proteger seu aliado saudita.
Negando qualquer intenção de "encobrir" Riad, o presidente Donald Trump ressaltou nos últimos dias os interesses estratégicos que ligam seu país ao reino sunita, citando a luta contra o terrorismo, a necessidade de conter a influência do Irã xiita, bem como os contratos bilionários de armas.
No único indício de uma posição americana mais firme neste contexto, o secretário do Tesouro Steven Mnuchin cancelou, nesta quinta-feira, sua participação em uma conferência de investidores em Riad.
O encontro, marcado para 23 a 25 de outubro, sofreu diversas deserções com crise provocada pela suposta morte de Khashoggi no consulado saudita de Istambul.
"Eu disse ao presidente Trump esta manhã que deveríamos dar a eles mais alguns dias, para que nós também tenhamos uma compreensão completa dos fatos" em torno do desaparecimento de Khashoggi, afirmou o chefe da diplomacia americana, Mike Pompeu.
"Nós deixamos claro que levamos este caso muito a sério", acrescentou ele depois de uma reunião no Salão Oval com Donald Trump.
No Twitter, o presidente americano garantiu que discutiu o caso "em detalhes" com seu secretário de Estado, mas não disse uma palavra sobre possíveis medidas futuras.
A publicação de novas imagens das câmeras de segurança mostrando os movimentos em Istambul de um oficial dos serviços de segurança próximo ao príncipe herdeiro saudita aumentou ainda mais a pressão sobre Riad.
Segundo o jornal New York Times, o homem em questão, Maher Mutreb Abdulaziz, que foi identificado pelas autoridades turcas como um dos membros de uma equipe de 15 agentes enviados por Riad para assassinar o jornalista, faz parte da comitiva do príncipe herdeiro e homem forte da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman.
Nas novas imagens divulgadas nesta quinta-feira pelo jornal pró-governamental turco Sabah, é possível ver um homem apresentado como Mutreb chegar às 6h55 GMT ao consulado da Arábia Saudita, e às 13h53 em frente à residência do cônsul.
Khashoggi havia entrado no consulado por volta das 10h15 e nunca mais saiu.
Mutreb pode então ser visto em fotos deixando um hotel de Istambul com uma "mala grande" e acompanhado por um grupo de homens às 14h15 GMT. Ele chega 45 minutos depois no aeroporto de Istambul para pegar um voo.
A imprensa turca, alegando basear-se em gravações sonoras feitas no local, já havia publicado na quarta-feira novas informações contundentes segundo as quais Jamal Khashoggi foi torturado e assassinado no consulado no dia do seu desaparecimento.
O Washington Post divulgou na quarta-feira o que apresenta como a mais recente contribuição de Jamal Khashoggi, um texto em que o repórter discute a falta de liberdade de imprensa no mundo árabe.
"Infelizmente, essa situação provavelmente não vai mudar", lamenta o jornalista nesta coluna transmitida por seu tradutor no dia seguinte ao seu desaparecimento.
A Anistia Internacional, a Human Rights Watch, os Repórteres Sem Fronteiras e o Comitê para a Proteção dos Jornalistas pediram à Turquia que solicite uma investigação da ONU sobre o caso Khashoggi.
"O envolvimento das Nações Unidas é a melhor garantia contra a mentira saudita ou contra tentativas de outros governos de ignorar o problema, a fim de preservar lucrativas relações comerciais com Riad", disse Robert Mahoney, diretor executivo ajunto do Comitê de Proteção dos Jornalistas, citado no comunicado.
"Dado o possível envolvimento das autoridades sauditas no desaparecimento forçado de Khashoggi e em seu assassinato, bem como pela falta de independência do sistema de justiça penal saudita, a imparcialidade de qualquer investigação por parte das autoridades sauditas seria questionável", acrescenta a declaração.
A Promotoria de Istambul divulgou uma declaração dizendo que informaria ao público sobre o andamento da investigação "se necessário".