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Da Redação
Publicado em 26 de janeiro de 2011 às 12h05.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu, em seu discurso em Davos, neste domingo (26/1) que os países ricos declarem "guerra contra a fome" e sugeriu aos países do G7 a criação de um fundo global para combater a pobreza. "Proponho a formação de um fundo internacional para lutar contra a miséria, a fome e a pobreza nos países do Terceiro Mundo", afirmou Lula no encontro anual do Fórum Econômico Mundial, na Suíça. Ele disse que o fundo poderia ser criado pelo G-7 (grupo das sete nações mais industrializadas do mundo) e apoiado por investidores internacionais. "Muitas vezes a pobreza, a fome e a miséria são o gatilho para o fanatismo e a intolerância", declarou Lula.
"Nós precisamos urgentemente nos unir ao redor de um mundo feito de paz e de combate à fome, e vocês podem estar certos de que o Brasil fará sua parte no trabalho." Em seu primeiro grande discurso diante de líderes políticos e empresariais mundiais, ele não detalhou sua proposta. Lula fez do programa "Fome Zero" uma prioridade de seu governo de centro-esquerda.
"O Brasil tem que sair desse círculo vicioso de obter novos empréstimos para pagar empréstimos anteriores... Nós queremos um livre comércio, mas um livre comércio caracterizado pela reciprocidade." Todos os esforços do Brasil em expandir suas exportações serão inúteis, ele acrescentou, se outros praticarem protecionismo enquanto falam em livre comércio da boca pra fora. Ele prometeu mostrar a mesma força na barganha com os países ricos que usava em seus anos de negociações com empregadores quando era um trabalhador da indústria e líder de sindicato.
"Nós queremos respeitar o direito de todos, de todo mundo. Mas eu também quero que os outros respeitem os direitos do Brasil. Nós não queremos ser tratados como cidadãos de segunda classe. Nós queremos ser tratados em termos igualitários." O Brasil, disse Lula, estava "combatendo a corrupção com bastante força" e estava aberto para o investimento externo. "O Brasil não pode continuar sendo um gigante adormecido. E se Deus quiser, nós vamos despertar esse gigante", falou.
Lula, um crítico frequente da globalização, fez um dos discursos mais elétricos no fórum de Davos até agora. Ele veio direto do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, que é denominado por alguns como o fórum "anti-Davos". O discurso do presidente brasileiro na Suíça foi recebido com aplausos. "Eu gostaria de convidar todos os que estão nesse encontro, nesta montanha mágica de Davos, para olhar para o mundo com novos olhos", disse Lula. "É absolutamente necessário construir uma ordem econômica mundial que atenda a demanda de bilhões de pessoas que vivem à margem."
Acidente
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, pretende continuar trabalhando de seu quarto de hospital em Davos (Suíça), onde se recupera de uma cirurgia no tornozelo esquerdo. Meirelles quebrou o tornozelo em três partes, neste sábado (25/1), ao escorregar em uma calçada com neve a caminho de um encontro com a vice-diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Anne Krueger. Ele não usava sapatos antiderrapantes, adequados para a neve. Meirelles informou à família em Goiânia, durante conversa telefônica, que a partir de amanhã vai estar "trabalhando normalmente" em seu quarto de hospital. Por recomendação médica, o chefe do BC terá de ficar mais quatro ou cinco dias no hospital, imobilizado. Depois ele poderá andar com a ajuda de muletas, que terá que usar por cerca de dois meses para não colocar o pé no chão.
A reação no Fórum Social
O pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feito neste domingo no Fórum Econômico Mundial, arrancou aplausos também no Fórum Social, em Porto Alegre. A estréia de Lula em Davos havia sido motivo de críticas como a feita pelo líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stedile --para quem a ida a Davos era perda de tempo, semelhante a "jogar pérolas aos porcos."
Alguns dos idealizadores do Fórum Social Mundial, de Porto Alegre, manifestaram publicamente seu desagrado com a presença de Lula em Davos. O sociólogo Emir Sader acredita que o Fórum Econômico Mundial é um evento decadente do neoliberalismo. "Nem Bill Gates aparece mais l", diz Sader. "Lula não deve emprestar seu prestígio a essa festa de alguns poucos banqueiros responsáveis por políticas que geram fome na África, Ásia, na América Latina e aqui mesmo no Brasil."
Cândido Grzybowsky, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, o Ibase, concorda: "A presença na Suíça é um equívoco porque prestigia uma reunião esvaziada". O diretor do jornal Le Monde Diplomatique e ex-presidente da Associação pela Tributação das Transações Financeiras (Attac), o francês Bernard Cassen, acha que só se justifica a presença de Lula na Suíça se for para dizer verdades aos poderosos: "Esperamos que seja a primeira e única vez que Lula vá a Davos".
O próprio Lula criticou várias vezes o Fórum Econômico Mundial. No ano passado, chegou a dizer, durante o II Fórum Social: "Lá (em Davos), eles discutem como acumular mais riquezas. Aqui (no Fórum Social Mundial), lutamos para distribuir com justiça as riquezas que a humanidade produz com muito trabalho e talento". Agora Lula poderá fazer o que a teleconferência que aconteceu em 2001, ligando representantes dos dois Fóruns, não conseguiu: aproximar os dois mundos.
Mas, neste ano, como presidente eleito, as coisas mudaram, e os dois eventos podem ter até alguma semelhança. A Executiva Nacional do PT divulgou nota em que condena uma possível guerra contra o Iraque, posição similar à que será defendida por Lula em Davos. "O PT junta-se à voz e à ação de todas as organizações que, nos cinco continentes, bem como o Fórum Social Mundial, condenam a guerra que se anuncia iminente", diz a nota. O presidente Lula deve dizer o mesmo em Davos no domingo, dia 26, segundo informou o senador Eduardo Suplicy (PT-SP). O senador afirmou que alguns petistas, como a senadora Heloísa Helena (AL), condenaram a ida de Lula a Davos, acreditando que sua participação na sexta-feira no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, já seria suficiente. "Eu, da minha parte, respeito a decisão do presidente Lula de ir a Davos como uma forma de ampliar a participação que já teremos em Porto Alegre", afirmou Suplicy.
O presidente do PT, José Genoino, foi atingido no rosto por uma torta atirada por uma ativista, durante sua participação no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. No momento em que Genoino defendia o discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Davos, uma ativista do grupo intitulado "Confeiteiros Sem Fronteiras" levantou do meio da platéia e atirou a torta, gritando "o Lula não nos representa em Davos". A moça foi contida pelos jornalistas que participavam de uma entrevista coletiva concedida por Genoino, mas escapou. O presidente do PT encarou o incidente como um ato democrático, mas repudiou a agressão, afirmando que este tipo de atitude "facilita à direita a truculência e o estado de deligerância". Ele acrescentou, no entanto, sentir-se "honrado em ser agredido defendendo Lula em Davos".
O grupo "Confeiteiros" disse em uma nota espalhada pelo local repudiar "a confusão promovida pelo Partido dos Trabalhadores, que quer fazer crer que o nosso movimento pode ser representado ou encarnado em algum tipo de governo". "Se alguém em Davos representa o movimento, somos nós mesmos, os milhares que ocuparam as ruas de Genebra, em protesto contra a reuniao de banqueiros, empresários e governantes que o PT legitimou."
A preparação dos eventos
Lula defendeu a participação no evento como uma forma de diminuir a distância entre os países ricos e pobres. Leia a íntegra da nota divulgada nesta quinta-feira (23/1):
"Depois de participar pela terceira vez do Fórum Social Mundial em Porto Alegre, vou a Davos para mostrar que um outro mundo é possível. Davos precisa ouvir Porto Alegre. Do mesmo modo que é necessário um novo contrato social no Brasil, é preciso um pacto mundial que diminua a distância entre os países ricos e os países pobres. É inadimissível que no início de um novo milênio ainda haja milhões de seres humanos que não tenham sequer o que comer. Por issso a prioridade do meu governo, no Brasil, é o combate à fome. Vou levar a Davos a mensagem de que os países ricos precisam também distribuir a renda no planeta."
Furlan participa pela primeira vez do Fórum de Davos como membro do governo. Há 10 anos ele representa o Brasil na Suíça como empresário de peso. O ministro acredita que Lula tem credibilidade para estimular as grandes empresas que estarão no Fórum Econômico a gerar mais emprego e exportações de suas subsidiárias no Brasil. "As questões sociais e de abertura de mercados têm ficado em segundo plano. Nossa experiência nos dois lados trará contribuições às discussões que são tomadas tanto em Davos quanto em Porto Alegre", afirmou o ministro.
Ele disse também que o governo brasileiro pode construir um crédito importante para reduzir o risco-país e conseguir abaixar a taxa de juros. Na opinião do ministro, o Fórum é uma oportunidade para o presidente levar a mensagem de que é preciso melhorar o mundo no sentido de reduzir o fosso entre ricos e pobres, em benefício de todos. "Acredito que o presidente Lula seja uma caixa de repercussão dos países em desenvolvimento que não têm conseguido participar das agendas de negociações", disse Furlan.