Dez anos após Sandy Hook, uma mãe compartilha sua dor e sua busca por cura
Desde 14 de dezembro de 2012, "as famílias ficaram com um buraco no coração, e falta à nossa nação uma parte de sua alma", disse nesta quarta-feira (14) o presidente Joe Biden, ao criar um "Dia da Lembrança" nacional por este massacre
AFP
Publicado em 14 de dezembro de 2022 às 18h36.
Jenny Hubbard não consegue acreditar que já se passou uma década desde a morte de sua filha de seis anos na Escola Fundamental Sandy Hook, em Connecticut, o pior ataque a tiros em um centro de ensino da história dos Estados Unidos.
Desde 14 de dezembro de 2012, "as famílias ficaram com um buraco no coração, e falta à nossa nação uma parte de sua alma", disse nesta quarta-feira (14) o presidente Joe Biden, ao criar um "Dia da Lembrança" nacional por este massacre.
Naquele dia, Catherine Violet Hubbard foi uma das 26 pessoas, incluindo 20 crianças com idades entre seis e sete anos e seis mulheres, assassinadas por um jovem em Newtown, localidade bucólica da região da Nova Inglaterra, no nordeste dos Estados Unidos.
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Esta chacina, executada em cinco minutos por Adam Lanza — que anteriormente tinha matado a mãe, suicidando-se após o assassinato em massa —, comoveu os Estados Unidos e o mundo. Mas não gerou mudanças na legislação sobre as armas de fogo em um país onde elas abundam.
"É uma lembrança da fugacidade do tempo", diz Hubbard, de 50 anos, sobre o aniversário nesta quarta-feira, que, como ocorre todos os anos, será marcado por uma reflexão tranquila nesta cidade de apenas 27.000 habitantes.
Desde aquele dia sombrio de 2012, Jenny Hubbard tem a sensação de ter "vivido uma vida inteira", porque, desde então, tudo é "totalmente diferente".
"E, ao mesmo tempo, é como se fosse ontem", afirma, em voz baixa.
Esta mãe lembra daquela manhã de inverno, dez dias antes do Natal, quando acompanhou a filha e seu irmão de oito anos até o ponto do ônibus escolar.
"Já estavam pensando nas férias. Foi uma daquelas manhãs que lembro como apressada e caótica, mas também como uma das melhores manhãs que tivemos", conta.
Às 9h30 locais, Lanza, de 20 anos, entrou na escola, armado com um fuzil de assalto Bushmaster AR-15 e duas pistolas, após matar a tiros sua mãe em casa.
"Recebemos um telefonema de que alguma coisa tinha acontecido, e o resto do dia foi essa nebulosa de saber que algo terrível tinha ocorrido, mas sem entender sua magnitude", recorda-se Hubbard.
"Perda impensável"
Hubbard soube da morte da filha em um posto dos bombeiros, para onde as autoridades tinham levado as crianças sobreviventes.
"A maioria das pessoas estava petrificada, (era) uma perda impensável", destaca.
Lentamente, Hubbard diz que conseguiu se recuperar, graças à bondade dos demais e à fé.
"O primeiro passo foi me levantar da cama por meu filho. Tive que fazer isso, porque ele tinha o direito de viver. Depois, dia após dia, dava mais um passo",conta.
Mas sempre há dias obscuros: o início das aulas a cada ano e cada ataque a tiros em massa, como ocorreu em maio em Uvalde, no Texas, quando 19 estudantes e dois professores foram mortos a tiros por um jovem.
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"A viagem não é fácil. É solitária e obscura às vezes", diz.
Há décadas, ocorrem nos Estados Unido ataques com armas de fogo em ambientes diferentes: escolas, locais de culto, supermercados. Segundo o site Gun Violence Archive, mais de 600 assassinatos em massa (assim considerados quando pelo menos quatro pessoas morrem, ou ficam feridas) deixaram os Estados Unidos em luto desde o começo de 2022.
Há dez anos, o então presidente Barack Obama chorou ao discursar à nação pelo massacre de Sandy Hook. E, há alguns dias, disse que aquele 14 de dezembro de 2012 ficaria marcado como o pior dia de sua Presidência (2009-2017).
- Proibição dos fuzis de assalto -
Biden, vice-presidente de Obama em 2012, disse nesta quarta que "continua lutando" para proibir novamente, como ocorreu entre 1994 e 2004, os fuzis de assalto, armas com carregadores de grande capacidade.
Após o massacre em Uvalde, o Congresso aprovou uma legislação para impedir que pessoas potencialmente perigosas comprem este tipo de armas. Mas a maioria dos congressistas e o poderoso lobby americano das armas, a NRA, opõem-se a uma lei realmente vinculante, argumentando que seria inconstitucional.
Isto revolta o diretor-executivo da Connecticut Against Gun Violence, Jeremy Stein: "os civis não deveriam ter acesso a armas que damos aos soldados", disse à AFP.
Como demonstração pública de dor e recordação, Newtown inaugurou em novembro um memorial aos mortos no massacre. Rosas brancas repousavam sobre cada nome esta semana.
Perto dali fica o Santuário de animais Catherine Violet Hubbard, de 14 hectares, que Hubbard fundou em homenagem à filha, que amava os animais.
Hubbard se pergunta como seria Catherine aos 16 anos, mas tenta se agarrar a tudo o que viveram juntas.
"Nunca vou entender porque isto não é possível na minha vida, mas levo comigo os seis anos que ela compartilhou comigo e as lembranças", desabafa.
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