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Como a cidade mais antiga da Holanda virou um ícone "verde" da Europa

Namega evidencia o potencial de ações locais para enfrentar desafios das mudanças climáticas e criar novas oportunidades para negócios e pessoas

Namega: mobilidade urbana é central no plano da cidade.  (Nijmegen/Divulgação)

Namega: mobilidade urbana é central no plano da cidade. (Nijmegen/Divulgação)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 27 de fevereiro de 2019 às 16h16.

São Paulo – Enquanto governos nacionais travam longas discussões diplomáticas sobre como combater as mudanças climáticas, é no campo de batalha cotidiano das cidades que as ações se concretizam. Cidade mais antiga da Holanda, Namega (Nijmegen, em holandês) é um exemplo de que as soluções estão ao alcance das administrações locais.

Com mais de dois mil anos de idade, a cidade de 170 mil habitantes foi eleita a mais “verde” da Europa no ano passado. O título não transparece o passado turbulento de Namega, mas acena para um futuro próspero e sustentável, capaz de inspirar cidades mundo a fora.

Situada nas colinas com vistas para o imponente Vale do Reno, na fronteira com a Alemanha, a cidade surgiu como um acampamento militar romano no primeiro século da Era Cristã. Sua posição estratégica continuou a exercer influência em sua história e desenvolvimento nos séculos seguintes.

O declínio após a queda do Império Romano foi seguido por um boom nas práticas agrícolas e de comércio, que atingiu o auge no século 17, ajudado pela proximidade da cidade ao Rio Waal, que hoje liga o porto de Roterdã à Alemanha.

Localizada a apenas 8 km da fronteira alemã, Namega sofreu ocupação na Segunda Guerra Mundial e viu seu centro histórico ser destruído por bombardeios equivocados das forças aliadas. A reconstrução durou até o início dos anos 80.

Cidade modelo

Saltamos então para 2018, quando a cidade emerge de uma história turbulenta para atuar como ícone bem-sucedido da revolução verde na Europa.

“Namega provou ser uma cidade que trabalha com sustentabilidade de forma integrada em várias disciplinas, como a separação de resíduos, mudanças climáticas, planejamento urbano, mobilidade inteligente e transição de energia”, disse ao site EXAME, Paul Matthieu, diretor de Transição Energética de Namega.

Na semana passada, Matthieu veio ao Brasil participar do evento “O Papel das Cidades na Transição Energética”, realizado na sede do CEBRI (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) no Rio de Janeiro em parceria com o Consulado-Geral da Holanda e a Catavento Consultoria.

Em entrevista por email, ele conta como a gestão ecológica, aliada a intervenções em mobilidade e projetos de energia ajudaram a colocar Namega na vanguarda do movimento de sustentabilidade na Europa.

Os transportes são, em geral, a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa e de poluição nas cidades. Como nas demais regiões holandesas, as bicicletas têm espaço privilegiado nos planos de mobilidade urbana em Namega: 250 mil magrelas são responsáveis por 65% das viagens para o centro da cidade e para a Universidade Radbound (20% da população local é formada por estudantes). Toda a frota de ônibus da cidade e parte dos automóveis são abastecidos por biogás produzido na região.

A cidade quer ser neutra em energia até 2045. O plano para atingir essa meta é economizar em 50% o consumo total e gerar energia renovável para os outros 50%. Um trabalho que só será possível se realizado de maneira integrada por moradores, empresas e instituições.

“O desafio aqui é ser um governo responsivo, capaz de apoiar as iniciativas dos habitantes de Namega. E para garantir que essas ações não sejam exclusivas apenas para pessoas afortunadas e bem-educadas. Mas para que todos os cidadãos se sintam confortáveis e estimulados a participar. Por isso, temos canais e práticas comunitárias nos 44 bairros da cidade”, diz Matthieu.

Vista aérea da cidade de Namega, na Holanda. (Nijmegen/Divulgação)

Um dos exemplos dessa sinergia em ação, segundo ele, foi o projeto Room for The Waal (algo como “Espaço para o Rio Wall”), que consistiu na drenagem de um antigo canal esquecido da cidade para dar mais espaço para o rio, reduzindo riscos de inundações em 30 pontos.

“Foi uma das respostas mais desafiadoras e bem sucedidas para adaptação climática. O projeto foi concebido em 2000 e finalmente realizado em 2016 com o apoio de muitas partes e especialmente dos nossos cidadãos”, destaca.

A instalação da primeira usina eólica da cidade (a Nijmegen-Betuwe Windpark), que contou com apoio da sociedade e ONGs para atrair investidores interessados no projeto, é outro resultado do trabalho conjunto. Hoje, a usina abastece 7 mil casas (ou 10% da cidade).

“Foram também os cidadãos que apoiaram o governo local na implementação de medidas mais sustentáveis para a cidade”, destaca Matthieu, como a expansão da reciclagem de lixo, que já atinge 67% do material coletado, com meta de chegar a 75% até 2020, e a instalação de telhados verdes, que somam 1400 metros quadrados em área.

O mundo poderá adotar o modelo de desenvolvimento de Namega? Se há uma lição a ser aprendida é que tanto a abordagem ascendente de política pública, ou seja, de cima para abaixo (top down), quanto a de baixo para cima (bottom up) são necessárias. “Ao fazer isso, é possível ter um planejamento urbano participativo e que inclua todos os diferentes temas sobre sustentabilidade”, avalia Matthieu.

“Sabemos, porém, que para uma parte da população de Nijmegen, as ambições em sustentabilidade são menos desafiadoras porque são confrontadas com outras questões em seu cotidiano, como renda, desemprego, bem-estar social”, pondera.

A cidade possui uma taxa de desemprego de 12%. “Acreditamos que a transição energética que está em curso é um caminho para um futuro mais próspero”, afirma. Não à toa, a esperança é simbolizada na cor verde.

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