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Civis de Aleppo entre a indignação e a decepção

Muitos moradores dos bairros resistentes se sentem presos entre duas linhas de fogo e há, inclusive, quem acuse os insurgentes de usá-los como "escudos humanos"

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 26 de setembro de 2012 às 17h15.

Alepo - A imagem romântica de um povo revoltado contra o tirano começa a se deteriorar em Alepo, a grande cidade do norte da Síria, onde os habitantes dão sinais de cansaço tanto dos bombardeios aos quais o Exército de Bashar al-Assad os submetem como dos abusos dos grupos rebeldes.

Muitos moradores dos bairros resistentes se sentem presos entre duas linhas de fogo e há, inclusive, quem acuse os insurgentes de usá-los como "escudos humanos".

Fayez Shooib, de 65 anos, morador de Saif al-Duula, um bairro arrasado pelos combates, não esconde sua desilusão.

"Fui ver minha mãe e quando voltei, encontrei minha casa ocupada por uma dezena de homens armados. Alguns estavam com minha roupa; usavam minha cozinha, viam minha televisão", se queixa este ex-topógrafo que viveu uma década em Nova York, "construindo uma ponte" e sofre de problemas cardíacos e diabetes.

"Eles me diziam: 'Tranquilo velho, que não vamos roubar nada.' Não têm respeito por nada nem por ninguém. Poderia ser o avô da maioria deles", afirma Fayez.

"Acreditam que por portarem armas ou por lutarem contra Assad podem fazer e desfazer, segundo seus caprichos; tentei colocá-los para fora, mas me disseram que não sairiam de lá", acrescenta.

Os rebeldes lhe propuseram que escolhesse qualquer casa da vizinhança para que eles derrubassem a porta e o colocassem lá, mas Shooib não aceitou.


"Imagina se os proprietários da casa chegam e me veem dormindo na cama deles; vão me matar. E o pior é que estariam no direito deles. Tive que dormir uma noite na rua porque não tinha onde ficar", lembra.

"Estamos pagando um preço muito alto para conseguir a liberdade. Não, não quero a revolução se é este o preço a pagar por ela".

Shooib diz que "em Alepo, há muitos edifícios vazios, novos, sem terem sido usados", e conta ter proposto, em vão, aos milicianos do Exército Livre da Síria (ELS) "que os ocupem e deixem as casas onde antes as famílias viviam".

Os rebeldes recusaram a ideia, porque "temem que, se ocuparem edifícios totalmente vazios, o exército do regime os tomará como alvos; por isso vivem próximo da população civil. Nos usam como escudos humanos", acusa.

Abu Hussein, um comerciante, denuncia saques cometidos pelos rebeldes.

"Entram nas lojas, levam o que consideram oportuno e, claro, não pagam absolutamente nada, porque, segundo eles, estão lutando pela minha liberdade. Esta é a liberdade que nos espera? Pois fiquem com ela, não quero", afirma.

Pouco depois, sua raiva diminui.

"Agradeço de coração que lutem, mas as coisas não estão sendo bem feitas. Estamos cometendo muitos erros pelos quais acabaremos pagando mais cedo ou mais tarde. As pessoas estão deixando de acreditar neles", alerta.

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