Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, quer monetizar os recursos naturais brasileiros (Adriano Machado/Reuters)
Rodrigo Caetano
Publicado em 10 de dezembro de 2019 às 07h00.
Última atualização em 10 de dezembro de 2019 às 07h30.
O artigo 6 do Acordo de Paris é um dos pilares do documento. Ele trata da possibilidade de comercializar as reduções de emissões, por meio dos chamados créditos de carbono. Eles são obtidos, por exemplo, quando um país supera suas metas de reflorestamento, ou quando uma empresa adota iniciativas para cortar as emissões, como investir em energias limpas. Para poder funcionar, no entanto, esse mercado precisa ser regulado.
Essa é a pauta principal do Brasil na Cop25, conferência do Clima da ONU que acontece em Madri, nesta semana. Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente e chefe da delegação brasileira, não esconde sua missão de “monetizar os recursos naturais brasileiros”. Para ele, os países ricos, que já devastaram boa parte de suas florestas, devem pagar aos países em desenvolvimento para que preservem suas coberturas florestais.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, também presente à Cop, vai na mesma linha. “Eles (os países ricos) dizem que há um mercado potencial de 100 bilhões de dólares em crédito de carbono. Quanto vai ficar para o Brasil disso?”, afirmou Alcolumbre a Exame.
Definir as regras para a comercialização dos créditos de carbono não é simples. O principal ponto de divergência está no que fazer com o passado. Países em desenvolvimento, especialmente o Brasil, defendem que créditos gerados por esforços anteriores à regulamentação sejam válidos. Já os países desenvolvidos, em especial os da União Europeia, são contra. Eles alegam que boa parte desses créditos não se refere a esforços legítimos de redução de emissões. Há, ainda, a possibilidade de que um país receba duas vezes pelo mesmo esforço, em virtude da dificuldade de aferir os resultados anteriores.
A verdade é que há uma enorme diferença no tamanho das áreas preservadas na Europa e nos países em desenvolvimento. Mesmo com todo o desmatamento recente, o que resta das florestas brasileiras, que somam mais de 5 milhões de quilômetros quadrados, equivale a uma área maior do que a da União Europeia. A preocupação dos europeus é que, se o Brasil puder carregar todo esse potencial, eles terão uma enorme conta para pagar em créditos de carbono.
Por outro lado, o Brasil é o país que mais perdeu florestas entre 2010 e 2015, último dado disponível, de acordo com levantamento feito pela ONU. No mesmo período, países como o Reino Unido, a Austrália e até os Estados Unidos recuperaram parte de suas coberturas verdes.
As negociações entraram na reta final nesta segunda-feira, data que marcou o início da segunda semana da Cop25. A chegada de ministros de diversos países deve acelerar as tratativas. Salles, por sua vez, está em Madri desde o início da conferência – algo inusitado, pois, costumeiramente, é o corpo diplomático dos países que conduz as primeiras rodadas de conversas. Segundo o ministério, ele vem conversando com emissários e autoridades das nações signatárias do acordo desde o primeiro dia.
O vice-presidente executivo da Comissão Europeia, Frans Timmermans, no entanto, diz que não teve a oportunidade de falar com o ministro brasileiro. “Aguardo ansiosamente por isso”, afirmou Timmermans, que está à frente de um ambicioso projeto ambiental europeu, o European Green Deal, a ser revelado no próximo ano. De qualquer maneira, ele não vê motivos que impeçam o Brasil e a União Europeia de chegarem a um entendimento. “Será uma surpresa (não haver entendimento). Agora, devemos andar para frente com o Acordo de Paris, não para trás”, salientou o dirigente holandês.
Questionado sobre a divergência em relação ao tamanho das florestas, Timmermans considerou plausível a ideia de que a Europa deva acelerar as ações de reflorestamento. Do lado brasileiro, o discurso é de que essas diferenças são apenas detalhes técnicos ou de simples nomenclatura. Mas, está claro que um fracasso nessa negociação comprometerá a meta do país na Cop25.