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Seis ministros ligados a Kirchner decidem deixar governo Fernández

A manobra evidencia ainda mais a divisão entre os aliados de Fernández e o grupo ligado à vice-presidente, Cristina Kirchner

Governo Fernandez sofreu uma dura derrota nas primárias de domingo (Amilcar Orfali/Getty Images)

Governo Fernandez sofreu uma dura derrota nas primárias de domingo (Amilcar Orfali/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 16 de setembro de 2021 às 08h07.

Seis ministros do governo da Argentina, vários secretários e diretores de agências colocaram na quarta-feira, 15, seus cargos à disposição do presidente, Alberto Fernández, após a contundente derrota do partido governista nas primárias de domingo, que definiram os candidatos para a eleição legislativa de novembro. Os nomes que pediram demissão são todos ligados à vice-presidente, Cristina Kirchner.

A manobra evidencia ainda mais a divisão entre os aliados de Fernández e o grupo de Cristina. Segundo o jornal Clarín, o núcleo duro do kirchnerismo defende a radicalização do governo e pretende forçar a queda do chefe de gabinete, Santiago Cafiero, e dos ministros Matías Kulfas, do Desenvolvimento Produtivo, e Martín Guzmán, da Economia, que ontem estiveram reunidos com o presidente para demonstrar lealdade.

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Segundo a imprensa argentina, Fernández e Cristina conversaram por telefone, na segunda-feira, e se reuniram na noite de terça-feira por mais de três horas na Casa Rosada - o encontro não teria terminado bem, de acordo com fontes do governo citadas pelos principais jornais argentinos.

Ontem, o primeiro a anunciar a renúncia foi Eduardo "Wado" de Pedro, ministro do Interior, que enviou uma carta a Fernández manifestando as razões de sua decisão. "Ouvindo suas palavras no domingo à noite, quando você declarou a necessidade de interpretar o veredicto dado pelo povo argentino, considerei que a melhor maneira de colaborar com esta tarefa é colocar minha renúncia a sua disposição", escreveu o ministro.

Em seguida, Fernández recebeu a notícia das saídas dos ministros Martín Soria, da Justiça, Roberto Salvarezza, de Ciência e Tecnologia, Juan Cabandié, do Meio Ambiente, Jorge Ferraresi, do Desenvolvimento Territorial e Habitação, e Tristan Bauer, da Cultura. Secretários, diretores de agências e Fernanda Raverta, presidente da Aerolíneas Argentinas, também pediram para deixar o governo. "Conversamos com o presidente e, de uma forma ou de outra, todos renunciamos", disse Ferraresi, em entrevista à rádio Con Vos.

Elisa Carrió, ex-deputada e ex-candidata presidencial, acusou Cristina de querer dar um "golpe de Estado" em Fernández. "A tentativa de esvaziar o presidente por parte de uma vice-presidente é um golpe de Estado", declarou Carrió, que é ligada a Mauricio Macri, em entrevista à Rádio Mitre. "A vice-presidente não pode dizer ao presidente quem demitir, seja ele derrotado ou vitorioso. O presidente tem de exercer suas funções institucionais e resistir."

No início da noite, Fernández promoveu uma nova reunião de emergência na Casa Rosada com os ministros que não haviam entregado o cargo. Segundo assessores, o governo analisa mudanças para melhorar seu desempenho nas urnas em novembro, quando os argentinos renovarão 127 dos 257 deputados e 24 dos 72 senadores - além de representantes eleitos nas províncias.

As prévias de domingo, a primeira votação enfrentada por Fernández no cargo de presidente, foram vistas por analistas políticos argentinos como um plebiscito sobre seu mandato, marcado por medidas de combate à pandemia de covid-19 e por uma recessão econômica que começou em 2018. O resultado acabou sendo uma demonstração de força da oposição, que se torna uma ameaça ainda maior o peronismo nas eleições presidenciais de 2023.

De acordo com a contagem provisória dos votos das primárias, as listas de pré-candidatos a deputado da coligação governista Frente de Todos, de Fernández e Cristina, foram as mais votadas em apenas 7 das 24 províncias. Os nomes da coalizão opositora Juntos pela Mudança, ligada ao ex-presidente Mauricio Macri, foram os mais votados em 14. Já em relação às listas para o Senado, os governistas ganharam apenas em duas das oito províncias onde houve votação.

Como o voto na Argentina é obrigatório, as primárias se tornam uma espécie de pesquisa em grande escala. Nesse caso, o resultado faz com que o governo tema perder a maioria no Senado e impossibilita sua consolidação na Câmara dos Deputados quando, em 14 de novembro, terão eleições para uma renovação parcial do Congresso.

Fernández, sem força política própria, assumiu o cargo em dezembro de 2019 com uma chapa promovida pela ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015), agora vice.

Durante sua gestão, Fernández teve que enfrentar a pandemia de covid-19 e o aprofundamento da crise econômica que deixou quase metade da população na pobreza.

Com a popularidade em declínio, Cristina tem criticado no último ano a gestão de Fernández, revelando divergências internas e até referindo-se a "funcionários que não trabalham".

A Argentina acumula até agosto um aumento da inflação de mais de 30%, entre as mais altas do mundo, e um índice de pobreza de 42% em meio a uma recessão que dura desde 2018.

O governo também deve negociar com o FMI um acordo de ampliação das facilidades para substituir o Stand-By assinado em 2018 durante o governo Macri e pelo qual deve US$ 44 bilhões. (Com agências internacionais)

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