Vaticano: Bento XVI dirigiu o escritório doutrinal do Vaticano por 23 anos (Arturo Mari/ L'Osservatore Romano Vatican/Getty Images)
Reuters
Publicado em 11 de abril de 2019 às 11h47.
Última atualização em 11 de abril de 2019 às 12h04.
Vaticano — O ex-papa Bento XVI atribuiu os escândalos de abusos sexuais na Igreja Católica aos efeitos da revolução sexual dos anos 1960 e a uma decadência geral da moralidade.
Críticos acusaram o papa emérito de tentar desviar a culpa da Igreja.
Em um raro ensaio, Bento XVI, que durante 23 anos comandou o escritório doutrinal do Vaticano --muito criticado pela maneira como tratou dos casos de abuso sexual--, argumenta que a revolução sexual levou algumas pessoas a acreditarem que a pedofilia e a pornografia são aceitáveis.
O religioso de 91 anos, que em 2013 se tornou o primeiro papa a renunciar em seis séculos, também alertou que alguns seminários católicos têm uma cultura abertamente gay e por isso não preparam os padres adequadamente.
"Pode ser dito que, nos 20 anos entre 1960 e 1980, os padrões normativos anteriores sobre sexualidade desmoronaram completamente, e emergiu uma nova normalidade que a esta altura se tornou o tema de tentativas diligentes de perturbação", escreveu Bento XVI.
Bento XVI comandava o escritório doutrinal em 2002, quando os primeiros casos de abuso sexual na Igreja foram expostos na cidade norte-americana de Boston.
Desde então, escândalos de abusos na Irlanda, Chile, Austrália, França, Estados Unidos, Polônia, Alemanha e outras partes induziram a Igreja a pagar bilhões de dólares de indenizações às vítimas e a obrigaram a fechar paróquias. Muitos casos ocorreram décadas antes dos anos 1960.
As revelações de que padres predadores muitas vezes eram transferidos de paróquia em paróquia, ao invés de expulsos ou processados criminalmente, já que bispos acobertavam os abusos, abalaram a Igreja globalmente e minaram sua autoridade.
No final do ano passado, o cardeal australiano George Pell se tornou a autoridade católica mais graduada a ser condenada por delitos de abuso infantil. Seu papel como ex-assessor do papa Francisco levou o escândalo ao cerne da administração papal.
Bento XVI ofereceu suas avaliações em um longo ensaio publicado na Klerusblatt, revista mensal da Igreja de sua região nativa da Baviera, na Alemanha. Uma autoridade do Vaticano confirmou sua autenticidade.
"Entre as liberdades pelas quais a Revolução de 1968 tentou lutar está a liberdade sexual desenfreada, que não se curva mais a qualquer norma", escreveu, segundo uma tradução em inglês publicada por vários sites católicos.
Alguns teólogos usaram o Twitter para criticar Bento XVI.
Massimo Faggioli, professor de teologia da Universidade Villanova, classificou o ensaio como uma "caricatura" da Igreja pós Concílio do Vaticano II, "com todas as suas inventividades e alguns erros trágicos".