Com canção sobre a Ditadura, Nubank lança campanha sobre o "novo"
Com vídeo de Elis Regina cantando em 1976, marca usa famosa canção para falar que "o novo sempre vem"
Guilherme Dearo
Publicado em 15 de maio de 2018 às 11h54.
Última atualização em 16 de maio de 2018 às 11h18.
São Paulo - Bancos e empresas de cartão de crédito adoram criar campanhas e comerciais cheios de poesia, música, arte e etc. Talvez uma maneira de deixar um assunto tão espinhoso (finanças, juros, contas, cálculos) mais palatável ao grande público.
A mais nova tentativa de fazer poesia com o dinheiro veio do Nubank .
Em sua nova campanha lançada nessa semana (criação da agência Soko), a marca se vale do mote "o novo sempre vem" (o Nubank se coloca no mercado como uma nova alternativa aos modelos tradicionais - Itaú, Bradesco etc.) e usa a icônica canção "Como Nossos Pais", na voz de Elis Regina.
No vídeo em que Elis canta (uma gravação de 1976, para o programa Fantástico), a marca coloca o seu logo roxo no canto direito e frisa alguns trechos da canção, como "digo que estou encantada com uma nova invenção" e "as aparências não me enganam, não". Segundo a marca, o vídeo foi "repaginado". Alguns ruídos no som original foram eliminados, por exemplo.
Só é mais complicado entender a relação entre uma empresa privada de serviços financeiros e a canção, escrita em 1976 pelo cantor Belchior, em meio à violência da Ditadura Militar brasileira - canção que, em sua voz e na voz de Elis, fala da repressão sentida pela juventude e as esperanças (e desesperanças) em relação ao futuro (política, economia, cultura, sociedade).
Além do vídeo, o Nubank espalhou mobiliário urbano por São Paulo. As peças foram colocadas em avenidas com presença dos "bancos tradicionais", como na Avenida Paulista e na Faria Lima.
Nos relógios de rua, por exemplo, a marca colocou frases como "Cuidado. Há perigo na esquina". Que perigos? Se falamos dos anos 70, seriam prisões arbitrárias, assassinatos, torturas, perseguições. Perigo não era força de expressão. Em 2018, o perigo parece ser metafórico mesmo. Seriam os perigos... os bancos? Ou os juros dos bancos?
A marca tenta usar a letra da música, que fala dos jovens presos ao passado, presos às escolhas dos "velhos", dos "pais", para falar que seu serviço contrapõe os tradicionais serviços bancários e atrai clientes em busca do novo. Segundo a marca, 16 milhões de pessoas já pediram um cartão Nubank (a marca tem uma "fila" e os pedidos são analisados e aprovados individualmente).
Ao site Exame, Cristina Junqueira, cofundadora do Nubank, disse que"'Como Nossos Pais' tem um tom contestador muito próximo a tudo o que fazemos no Nubank, e foi uma identificação imediata".
Para ela, o sentido da música não se restringe ao contexto em que foi escrita. "A música é atemporal, e não se aplica apenas ao contexto da época em que foi lançada. Sua crítica não é só sobre o contexto de 1976, mas a toda estagnação e resistência a qualquer mudança social. E isso diz muito sobre o contexto em que o Nubank surgiu: de uma frustração ao modo como as coisas eram feitas no mercado financeiro desde sempre", explica Cristina.
Sobre a campanha, ela diz: "É uma celebração ao fato de que 'o novo sempre vem' e também uma lembrança para nós mesmos de que temos que sempre continuar inovando e não nos conformar com o que conseguimos até aqui, e por isso entendemos que a música continua extremamente relevante mesmo passados mais de 40 anos.
Pelo menos, a campanha indica que os tempos ficaram, ao que parece, menos difíceis. Se os jovens da década de 70 queriam buscar o novo, romper com o passado e se libertar dos seus pais porque isso significava o direito de votar, o direito de ir e vir, o direito de viver, os jovens de 2018 só precisam resolver o impasse sobre qual cartão de crédito vão usar, o x ou o y. Ufa!
Assista: