NYSE: bolsas americanas vivem um dos maiores ralis da história e já se levantam questionamentos sobre sua sustentabilidade (Michael Nagle/Bloomberg via/Getty Images)
Guilherme Guilherme
Publicado em 19 de agosto de 2020 às 18h23.
Última atualização em 19 de agosto de 2020 às 19h42.
Enquanto o mundo ainda sofre os impactos econômicos causados pela maior pandemia em um século, a nova máxima histórica batida pelo índice americano S&P 500 nesta quarta-feira, 19, voltou a fazer os investidores se questionarem sobre até onde o otimismo no mercado financeiro é sustentável.
Considerado o principal índice acionário do mercado financeiro, o S&P 500 subiu 55% entre a mínima, de março, e a máxima desta quarta, quando o índice ficou a apenas 4 décimos de bater os 3.400 pontos à espera de que republicanos e democratas cheguem a um acordo sobre mais um pacote de estímulos. Segundo dados do The Wall Street Journal extraídos da Birinyi Associates, a relação preço/lucro do S&P 500 passou de 21,9x, há um ano, para 35,39x. Já o preço/lucro da Apple, que se tornou a primeira empresa a bater 2 trilhões de dólares em valor de mercado nesta quarta, foi de 12,1x no início de 2019 para cerca de 35,3x, segundo a plataforma de informações financeiras Ychart.
São justamente os estímulos econômicos que estão impulsionando um dos maiores ralis da história das bolsas americanas. De acordo com levantamento feito pela consultoria McKinsey, os gastos governamentais para mitigar os efeitos da pandemia tinham chegado a 10 trilhões de dólares em junho — e essa quantidade só vem crescendo.
Com os juros nas mínimas históricas tanto em países desenvolvidos como em parte dos emergentes, ações e pedras preciosas — como ouro e prata — têm sido os destinos do dinheiro despejado nas economias. “O ouro tem se tornado uma proteção não contra eventos macroeconômicos, mas contra o próprio dinheiro. Quando o Congresso americano aprovar o novo pacote de estímulo, seu preço vai subir ainda mais”, comentou Jefferson Laatus, estrategista-chefe do Grupo Laatus.
Segundo ele, alta do S&P 500 acende um alerta, mesmo com o excesso de liquidez no mercado. “Há muito espaço para realização. Qualquer ruído sobre estímulos ou eleição americana pode dar espaço para uma devolvida mais forte.”
E no horizonte os fatores de risco são vários, como tensão comercial entre a China e os Estados Unidos, eleições americanas, além, é claro, da pandemia que ainda não acabou.
“Esses recordes do S&P aumentam a preocupação no mercado, principalmente quando se olha para as perspectivas. Desde a pandemia, o mercado voltou tudo e mais um pouco, enquanto isso, o consumo segue vivendo de auxílio emergencial”, avalia Bruno Lima, analista de renda variável da EXAME Research.
Embora o S&P já tenha renovado a máxima histórica, o principal índice da B3, o Ibovespa, ainda precisa subir cerca de 20% para superar os 119.593,10 pontos alcançados em janeiro. Desde a mínima de 2020, o índice brasileiro já subiu 63%, mas, em dólar, é necessário subir mais 58,2% para bater sua máxima histórica. Ainda que distante do pico, analistas acreditam que a influência do S&P 500 possa pesar negativamente sobre o mercado brasileiro.
Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, acredita em um movimento de correção no médio prazo. “Houve um descolamento entre o preço e o lucro que uma hora vai precisar ser fechado. Como as taxas de juro estão baixas, o pessoal acaba investindo em ações e inflando muito o mercado”, comenta.
Segundo Komura, os endividamentos governamentais para pagar a conta da pandemia e a possibilidade de os estímulos gerarem inflação podem, no futuro, provocar alta nas taxas de juro e fuga das bolsas de valores. No Brasil, a taxa de juro de 2% ao ano, levou milhares de pessoa a comprar suas primeiras ações, mas o mercado já precifica juros a quase 6% no início de 2021, com a taxa começando a se elevar já a partir do ano que vem.