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Fogo de palha ou recuperação duradoura? Veja as quatro razões que impulsionaram os mercados

Na última semana as Bolsas de Valores do mundo todo ganharam fôlego, mas os analistas se perguntam até onde irão essas altas

Mercados: na semana passada as Bolsas de Valores do mundo inteiro registraram uma série de altas que surpreenderam os analistas. (Leandro Fonseca/Exame)
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Carlo Cauti

Publicado em 23 de outubro de 2022 às 17h04.

Última atualização em 24 de outubro de 2022 às 11h04.

Na semana passada as Bolsas de Valores do mundo inteiro registraram uma série de altas que surpreenderam os analistas. Desde segunda-feira até sexta, o Eurostoxx 600, principal índice da Europa, subiu 1,15%, mesmo com a crise energética amedrontando empresas e governos. Em Wall Street o Dow Jones ganhou 3,40%, o S&P 500 subiu 2,93% e o Nasdaq valorizou 2,69%, mesmo com a inflação nos EUA ainda muito elevada e a possibilidade concreta de mais altas das taxas básicas de juros por parte do Federal Reserve (Fed).

O Ibovespa,por sua vez, fechou a melhor semana desde novembro de 2020, chegando a uma alta de 6,98%. O principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo também ganha de todas as "concorrentes" estrangeiras pois no acumulado do ano já se valorizou 15,40%, enquanto as outas estão ainda em território negativo.

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A pergunta que muitos analistas se fazem é se essas recentes altas são apenas um "fogo de palha" ou se representam uma mudança de humor douradora nos mercados.

Mudança no governo britânico e resultados trimestrais animaram os investidores

Entre os eventos que levaram para a alta dos índices está a renúncia da primeira-ministra britânica, Liz Truss. Após a apresentação do pacote fiscal mais indigesto da história britânica, e a tentativa de salvar seu governo mudando de ministro da Economia, Truss não resistiu as pressões e deixou o cargo. Um alívio para o mercado britânico, que tinha perdido a confiança política conservadora de liderar o Reino Unido fora de uma das maiores crises de sua história.

A razão está ligada ao fato que os fundos de pensão na Grã-Bretanha utilizam uma grande quantidade de derivativos, e o forte aumento dos rendimentos dos títulos do tesouro direto local desencadeou gigantescas chamadas de margem que poderia ter gerado uma falência generalizada.

Do outro lado do oceano, os primeiros balanços divulgados nesta temporada de resultados estão aparecendo bem melhores do que o esperado. Os grandes bancos americanos, iniciando pelo Goldman Sachs (GSGI34), que reportou lucros trimestrais menores, mas acima do esperado. Os números dos bancos vieram, em geral, positivos em um contexto macroeconômico complicado. Até mesmo a Tesla (TSLA34) divulgou um balanço excelente, mesmo se não alcançou as metas muito ambiciosas que o mercado aguardava.

Por último, o que está deixando os mercados mundiais otimistas é também a queda do preço do gás, graças ao pacote de medidas aprovado pelo Conselho Europeu.

Com um cardápio como esse, não é surpresa que as Bolsas de Valores começassem a subir nessa semana.

"Nos EUA, estamos tendo uma temporada mista de resultados do terceiro trimestre de 2022, rumo das políticas monetárias por lá, continuou no radar do investidor, com as taxas de juros das Tresuries de 10 anos atingindo patamares bem próximos dos maiores níveis desde 2008. As taxas futuras de juros mostraram sinais de recuo, com sinais mais claros de uma moderação nas próximas altas pelo Fed. Por conta disso o rali foi forte e a semana fechou no campo positivo", explicou à EXAME Invest João Pires, sócio e assessor de investimentos da Acqua Vero, escritório de investimentos parceiro do BTG Pactual (BPAC11).

Motor da recuperação é outro: o pessimismo

Mas o verdadeiro motor dessa recuperação geral, que não sabemos por quanto durará, é acima de tudo um só: o pessimismo.

Os investidores passaram os últimos meses tão pessimistas que montaram carteiras tão defensivas para evitar riscos que é suficiente uma notícia positiva (mesmo que não estrutural) para que as ordens de compra voltem a aparecer em massa nos mercados.

A partir dessa consideração que é possível entender o motivo profundo da recuperação dos mercados no começo da semana. Isso pois nesses dias foi divulgada a pesquisa mensal que o Bank of America (BOAC34) realiza entre os gestores de todo o mundo. O quadro que apareceu era de pessimismo cósmico: 72% dos gestores esperam que a economia global piore nos próximos 12 meses. O segundo pior resultado após a pesquisa divulgada em julho.

Além disso, 91% dos gestores esperam que os lucros corporativos não aumentem nem 10% nos próximos 12 meses. Um nível tão negativo não era visto desde a crise de 2008. Difícil encontrar um pessimismo semelhante nas últimas décadas.

Esse humor tão negativo levou os investidores globais a se entrincheirarem em suas carteiras, reduzindo ao mínimo a exposição ao risco. Por isso que, no momento, gestores de todo o mundo encontram-se com carteiras com pouquíssimas ações e sobrecarregados de liquidez.

Para ter uma ideia, enquanto os peso das ações nas carteiras está na mínima histórica, a liquidez é equivalente a uma média de 6,3% do total sob gestão. O nível máximo desde outubro de 2001 após os ataques aos Torres Gêmeas.

E é exatamente com esse cenário que é suficiente qualquer faísca para para desencadear compras substanciais no mercado de ações. A questão é que, para que o bom humor se torne estrutural, o clima deve mudar primeiro. A inflação global deve começar a cair e os bancos centrais devem estar dispostos a reduzir as taxas básicas de juros. Algo que ainda vai demorar para acontecer.

Portanto, se para uma mudança de tendência estrutural nos mercados talvez ainda seja cedo, as notícias positivas vão continuar desencadeando altas acentuadas, mesmo se curtas.

"O problema de fundo dos mercados globais ainda não se resolveu: a inflação segue muito alta, os riscos para os preços de energia na Europa seguem assimétricos para cima e ainda não se sabe o nível final dos juros nos EUA e nas outras economias desenvolvidas. Alívios temporários, como o desta semana, são comuns, mas não devem ter continuidade se os problemas de médio prazo não forem resolvidos", declarou à EXAME Invest Luciano Sobral, economista-chefe da NEO Investimentos.

No Brasil é diferente

No caso do Brasil, a razão pela qual o Ibovespa se valorizou tanto foram duas: Vale e Petrobras. Além das novidades vindo da frente eleitoral.

Graças a uma valorização expressiva do minério de ferro e do petróleo dos últimos dias, Vale (VALE3) e Petrobras (PETR3) registraram respectivamente altas de 5,58% e 11,90%.

Além disso, as notícias oriundas da China, sobre uma possível mudança da política de lockdown para conter os surtos de Covid-19, deixaram os investidores animados sobre as perspectivas de vendas para o maior consumidor de minério e petróleo do planeta.

As novas pesquisas eleitorais também forneceram gás para a Bolsa de Valores de São Paulo (B3), com a primeira indicação de uma possível virada do presidente Jair Bolsonaro (PL) contra o ex-presidente Lula (PT), divulgada nesta sexta-feira (21) pelo Banco Modal/Futura.

Uma perspectiva que animou o mercado brasileiro, especialmente no caso da possível privatização da Petrobras, que o atual mandatário já sinalizou estar em seu eventual plano de governo.

"Com os bons números da economia brasileira e não havendo surpresas no cenário internacional, é bem provável que ocorra uma recuperação dos mercados nesse momento pós eleições e de definição de política monetária internacional", diz João Pires, "É claro que a expectativa se baseia na hipótese de uma sensação de equilíbrio econômico dos investidores, podendo haver ruptura em casa de alguma mudança mais brusca não prevista nos cenários mundiais”.

Em conclusão, se nos mercados internacionais a percepção dos analistas é que as altas sejam apenas um fogo de palha, no Brasil ao longo da semana já foram divulgadas previsões que o Ibovespa chegue a 150 mil pontos até o final do ano. Um rally natalino como esse seria o melhor presente de final de ano para muitos investidores brasileiros.

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