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"Está cada vez mais arriscado ficar vendido em bolsa", diz Ruy Alves, gestor da Kinea

Para a Kinea Investimentos, dados mais fracos de inflação são sinal de que o país está no caminho certo e abre espaço para o BC cortar juros

Ruy Alves, gestor da Kinea Investimentos (Kinea/Reprodução)

Ruy Alves, gestor da Kinea Investimentos (Kinea/Reprodução)

Guilherme Guilherme
Guilherme Guilherme

Repórter de Invest

Publicado em 12 de abril de 2023 às 12h54.

Última atualização em 12 de abril de 2023 às 15h00.

Dados mais fracos do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) divulgados nesta semana provocaram euforia no mercado brasileiro, com o Ibovespa registrando sua maior alta em seis meses. Para Ruy Alves, gestor da Kinea Investimentos, este pode ser um sinal de que está cada vez mais arriscado ficar vendido na bolsa brasileira.

"A bolsa está precificada para um país que não vai funcionar. Se o mercado passar a acreditar que o país vai funcionar, o valuation é outro", afirmou Ruy Alves, em entrevista à EXAME Invest.

Para ele, dados mais fracos de inflação é um sinal de que o país está no caminho certo e abre espaço para o Banco Central passe a avaliar o corte de juros. "A inflação convergente [para o centro da meta] pode levar o Banco Central cortar juros legitimamente. Se o mercado sente que o corte é por pressão política, coloca-se mais prêmio de risco para frente. Mas se o corte for legítimo, o prêmio de risco é menor."

Agora, a expectativa do mercado é para o arcabouço fiscal, que ainda precisa ser entregue ao Congresso. De acordo com Alves, o que foi apresentado até agora não é perfeito, mas é muito melhor do que se esperava. "Credibilidade fiscal e controle inflacionário aliviam a parte longa da curva de juros e joga o preço das ações para cima, dada a menor taxa real de desconto. É nisso que estamos apostando", afirmou.

Kinea: R$ 70 bi sob gestão

Com três décadas de mercado financeiro e passagens por grandes gestoras, como JGP e Adam Capital, Ruy Alves foi para a Kinea em 2020, onde é responsável pela gestão macro global. Com R$ 70 bilhões sob gestão, a gestora é uma das maiores do país. Confira a entrevista com Ruy Alves, gestor da Kinea Investimentos.

EXAME Invest: O Ibovespa apresentou uma forte reação positiva ao IPCA abaixo do esperado para março. Isso muda alguma coisa?

Cortar juros no curto prazo pouco importa se a curva longa não ceder. Então, o corte forçado de juros, por razões políticas, não traria benefícios para o mercado porque não afeta o juro de longo prazo. Mas se o mercado começa a ver esse processo como sustentável, com arcabouço fiscal sustentável e inflação sob controle, a curva longa poderia começar a ceder. Se a parte longa começar a diminuir, o mercado de ações tem como responder. O mercado de ações geralmente é valorizado a uma taxa real de 10 anos e a taxa lá na frente não cedeu, começou a subir [nos últimos meses]. Credibilidade fiscal e controle inflacionário aliviam a parte longa da curva de juros e joga o preço das ações para cima, dada a menor taxa real de desconto. É nisso que estamos apostando.

O juro real brasileiro é insustentável porque o país tem um fiscal primário de -1%, sendo que o crescimento não deve ser de mais de 1%. Isso dá zero para pagar juro real. Para pagar juro real tem que ter crescimento ou superávit primário. Com essa função, toda vez que tenta-se pagar juro real aumenta-se a dívida. O único jeito de não aumentar dívida é um crescimento real na mesma proporção ou com superávit primário. Por isso, o que tem que cair é o juro real de longo prazo.

E qual é a influência da inflação de curto prazo nessa equação?

Se o mercado começa a ver que a inflação é convergente passa a tirar prêmio de risco. A curva longa é prêmio de risco. É um componente do que as pessoas acham que vai ser os juros no futuro, mas o mercado pede mais prêmio devido ao fator incerteza. Quando a inflação fica sob controle, a curva inteira começa a ceder porque o mercado começa a ver que a curva é convergente. Esta é outra aposta que nós tinhámos.

A inflação abaixo do esperado estanca também projeções cada vez mais altas de IPCA?

Sim. Com Selic de 13,75 e quase 8% de juros reais acreditávamos que a inflação ia ceder. Com ela cedendo, o mercado passa a colocar uma probabilidade menor de a inflação ser divergente. Desde que o Lula chegou, as expectativas de inflação só sobem. Então, quando começa a vir um processo convergente inflação corrente, a curva toda cede -- o que é bom para ativos de risco. 

Isso abre espaço para o Banco Central cortar juros?

Sim. E torna o trabalho do Roberto Campos Neto mais fácil. Se a inflação se mostrar mais convergente, ele pode cortar legitimamente sem ser por pressão política. Se o mercado sente que o corte é por pressão política, coloca mais prêmio de risco. Se sente que é um corte legítmo e que a inflação é convergente, é colocado menos prêmio.

Esse processo, de certa forma, torna mais arriscado ficar vendido na bolsa?

Sim, claro que torna. A bolsa está precificada para um país que não vai funcionar. Se começa-se a acreditar que o país vai funcionar, o valuation da bolsa é outro.

É de se esperar uma reação mais forte nos próximos meses?

As pessoas passaram a precificar um caminho insustentável. Qualquer cenário que mostre um caminho sustentável vai levar à valorização de ativos de risco.

Pelo que foi apresentado até agora, o arcabouço fiscal é positivo? Qual é a avaliação de vocês?

Não é perfeito, como nada é no Brasil. Mas não há países com fiscal perfeito. Todos eles têm dívida divergente, problemas com orçamentos, pressões políticas populistas. O mundo está assim, os Estados Unidos e a Europa estão assim. Este arcabouço precisa ser repensado em termos de nível correto de carga tributária e não permite a dívida convergir, mas é melhor do que esperávamos um mês atrás.

Pensando no cenário americano. Até quinta-feira passada, havia probabilidade maior de o Fed parar de subir juros, o que mudou com o payroll. Como vocês avaliam este cenário?

Existem dois cenários nos Estados Unidos: o de um cenário superaquecido ou recessionário. Se for superaquecido, os juros estão subprecificados. Mas se a recessão vier antes, o mercado está certo em prever o corte de juros dessa maneira. Mas ainda não temos certeza do cenário.

Olhando para esse cenário, as bolsas americanas estão baratas?

Barato não está. Os lucros já estão sendo revisados para baixo e prêmio de risco é o mais baixo dos últimos 20 anos. Não é um cenário atrativo. A bolsa tende a performar mal quando a taxa de juros é muito baixa e quando os juros sobem muito rapidamente porque a bolsa vê isso como um mercado apertado. Há risco de margem, de crescimento econômico e o risco financeiro. No processo inflacionário, a receita vem primeiro, depois os custos. Primeiro reajusta o preço do pruduto, depois reajusta o salário dos funcionários. No ano passado, houve crescimento de receita, porque a inflação estava subindo. Mas os custos com funcionários, que é 70% de uma empresa americana, não subiram. Hoje, a inflação está menor, mas é preciso remunerar melhor o funcionário pela inflação passada. Então, tem muito risco de margem nesse momento.

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