Da Redação
Publicado em 1 de outubro de 2018 às 16h19.
Última atualização em 2 de outubro de 2018 às 16h00.
O pagamento de bônus de saída para evitar que executivos embarquem na concorrência faz parte do jogo no mercado corporativo. Mas o que aconteceu na gestora de planos de saúde Qualicorp nesta segunda-feira entra em outra esfera. A empresa se comprometeu a pagar, no quarto trimestre, 150 milhões de reais a seu próprio fundador, José Seripieri Filho, conhecido como Junior, para que ele evite abandonar o barco e fundar uma companhia concorrente.
Junior é dono de 15% da companhia e, segundo a coluna de Lauro Jardim em O Globo, ameaça largar tudo. Nesta segunda-feira, a empresa anunciou o acordo para que seu fundador fique mais seis anos no negócio e não venda o equivalente a 32% de seus papéis, como era especulado no mercado.
O empresário, segundo comunicado da Qualicorp, ainda se comprometeu a “não competir com os negócios da companhia”, nem “solicitar qualquer cliente, fornecedor, distribuidor ou qualquer pessoa a deixar seu emprego ou deixar de prestar serviços para a companhia”.
A Qualicorp reconheceu, em comunicado, que o “mercado da companhia está em momento de forte transformação e o conselho de administração entendeu essencial contratar alinhamento estratégico e de longo prazo com o acionista, fundador e principal liderança”. Afirmou ainda que a oferta de bônus foi feita após consultoria de empresas como McKinsey, Spencer Stuart e Mercer, e que não teve participação de Seripieri.
Segundo relatório do banco Itaú BBA, a decisão é um sinal negativo em termos de governança corporativa, o que é um motivo de preocupação para os investidores. “Nós esperamos uma reação negativa”, afirmou o banco. Ela veio: nesta segunda-feira, 1, as ações da Qualicorp caíram 30%, o equivalente a 1 bilhão de reais. Desde janeiro a empresa perdeu 50% de seu valor de mercado.
Segundo o Itaú BBA, Seripieri é um “empreendedor extremamente bem sucedido e um executivo de grande valor para a empresa”. A companhia faturou 1,9 bilhão de reais em 2017 e, segundo previsão do banco, manteria um crescimento constante de 5% a 10% ao ano até 2020.
Um analista ouvido por EXAME afirmou que a expressiva queda das ações revela como o mercado viu a solução como surpreendente. Mas Júnior está em tratativas para vender a empresa desde o início do ano passado, conforme noticiou EXAME. Ele já vendeu a empresa uma vez: o fundo Carlyle comprou 70% do negócio em 2012. Mas depois Junior voltou a comprar o controle da empresa.
“Se nem o fundador, que é a pessoa que começou e que mais conhece o negócio, tem interesse no longo prazo, isso passa uma mensagem muito ruim”, diz um gestor de investimentos.
Fundada em 1997, a Qualicorp criou o mercado de planos coletivos por adesão no país e abriu capital em 2011. Na época, Junior, que não costuma tirar fotos nem dar entrevistas, tinha 43 anos. Seu público alvo são profissionais liberais, servidores públicos, estudantes e outras categorias profissionais.
Em 2017 o faturamento da Qualicorp cresceu 5,6%, para 2,075 bilhões de reais, mas o lucro líquido caiu 8,3%, para 386 milhões de reais. Nos últimos anos a empresa vem, assim como as principais operadoras de planos de saúde, sofrendo com os desafios de um setor que perde clientes e vê os custos médicos disparar.
É um negócio que traz uma série de desafios, mas que faz salivar empreendedores como Seripieri. Segundo executivos ouvidos por EXAME, Junior estava em negociação com dois fundos de investimento, mas não chegou a um acordo sobre o valor — queria ao menos 1 bilhão de reais por suas ações.
Com a decisão de hoje, o empresário vai precisar segurar o ímpeto por mais seis anos.
Em nota, assessoria da empresa informou que “a Qualicorp esclarece que a referida decisão, visando um alinhamento estratégico de médio prazo, foi tomada por unanimidade por seu Conselho de Administração, sem a participação do sr. Seripieri e respeitados todos os ritos legais. Além disso, é importante esclarecer também que sr. Seripieri Filho não é controlador da companhia.”
A McKinsey esclarece, quanto a notícias veiculadas nesta segunda-feira, que não atua em qualquer definição referente a mérito ou valor de acordos de não competição com executivos.
A matéria foi atualizada às 16h de terça-feira (2) para incluir o posicionamento da McKinsey.