Conheça o primeiro prédio a usar energia do solo em São Paulo
A tecnologia tem se mostrado efetiva na climatização de edifícios, com economia no consumo da energia gasta com ar-condicionado e redução das emissões de CO2
Gabriella Sandoval
Publicado em 10 de agosto de 2021 às 19h28.
Última atualização em 11 de agosto de 2021 às 10h35.
Em um feito inédito no país, uma edificação que usa energia do solo para climatizar seus ambientes está sendo erguida na capital paulista. O projeto é a continuidade de um estudo inovador realizado pela USP, na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), que analisou o uso das fundações como meio para a troca de energia térmica entre o prédio e o subsolo.
Batizado de CICS Living Lab, o edifício será a sede do Centro de Inovação em Construção Sustentável (CICS), na Escola Politécnica da USP, e servirá de laboratório vivo para testar tecnologias avançadas e sustentáveis de construção civil.
A descoberta
O sistema geotérmico – que usa a energia encontrada dentro da crosta terrestre, seja no solo, seja nas rochas e até na água – é um dos modelos de geração de energia renovável que mais crescem no mundo. Já é aplicado há pelo menos 20 anos nos Estados Unidos e em países da Europa. Porém, sua utilização nunca havia sido estudada para implementação no Brasil, que possui solo e clima diferentes desses lugares. Foi a pesquisadora Thaise Morais, do departamento de geotecnia da EESC, em sua tese de doutorado, quem avaliou pela primeira vez o desempenho dessa tecnologia nas condições brasileiras.
Como funciona
Resumidamente, o sistema funciona assim: por meio de estacas enterradas, que compõem a própria fundação do edifício, ele colhe ou rejeita calor do solo. Então, com a ajuda de um fluido (nos testes, foi usada água potável), os tubos instalados em seu interior levam essa energia até a superfície, onde uma bomba geotérmica realiza a troca de calor entre o subsolo e os ambientes do edifício. “Essa troca é feita de forma contínua e repetitiva até que a temperatura desejada para o ambiente seja alcançada”, explica Thaise.
Expectativas
De acordo com a pesquisadora, a experiência internacional demonstra que o modelo vem sendo eficiente e bem-sucedido para aquecer ou resfriar os ambientes e na redução do consumo de energia. “O uso dessas estruturas tem sido incentivado na Europa pelos governos a fim de reduzir os gastos e também a emissão de dióxido de carbono”, diz.
Pelas mesmas razões, a expectativa por aqui é que essa seja uma alternativa aos tradicionais sistemas de climatização, uma vez que o uso de ar-condicionado só cresce no país. Dados do Ministério de Minas e Energia mostram que apenas entre os anos de 2005 e 2017, no setor residencial, a posse desses aparelhos duplicou. E a estimativa é de que o número de aparelhos instalados passe dos atuais 30 milhões para 165 milhões até 2050 segundo o estudo The Future of Cooling, da Agência Internacional de Energia (IEA).
Quanto custa
Por enquanto, a instalação do sistema geotérmico não tem um custo definido no Brasil. Entretanto, é certo que, no longo prazo, o investimento é compensado pela economia dos gastos com energia elétrica.
Segundo Thaise, a tecnologia poder ser aplicada em qualquer tipo de edifício, mas ela ressalta que não há um resultado-padrão. Antes de implementar, será necessário conhecer as propriedades térmicas do subsolo do lugar e avaliar as condições de clima e a demanda do prédio. “O Brasil é um país de extensão continental, que apresenta temperaturas anuais médias que variam de acordo com a região. Portanto, a eficiência desse sistema também deve variar regionalmente.”
O pioneirismo da pesquisadora foi reconhecido pela Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica. A tese venceu o Prêmio Costa Nunes como melhor tese de doutorado do biênio 2018-2019, concorrendo com acadêmicos de todo o país. “Além de representar a importância do meu trabalho, a vitória também acaba divulgando a inovação e a relevância em implantar esse tipo de sistema no Brasil. Estamos no caminho certo”, celebra a pesquisadora.
O edifício construído na USP, que é um desdobramento de seus estudos, é financiado pelo CICS, um ecossistema com representantes de empresas e da academia dedicado a acelerar a inovação, a sustentabilidade e a produtividade na construção civil. As obras ainda não têm previsão de conclusão, pois foram interrompidas na pandemia.