Investindo em startups: casar pensando em separar
Como tomar uma das decisões mais difíceis de investimento, apaixonando-se igualmente pelo começo e pelo (potencial) fim da relação?
Colunista
Publicado em 18 de janeiro de 2024 às 08h33.
Há muitas idiossincrasias relacionadas a startups, uma vez que as diversas partes interessadas (fundadores, investidores de cada fase, potenciais compradores) têm interesses fundamentalmente diversos durante o desenvolvimento da mesma.
Se você é um potencial investidor, recomendo que faça cursos específicos antes de começar a colocar o seu dinheiro em algo tão fascinante, pois há muitos riscos envolvidos além do “fulano ganhou uma grana investindo em startups”.
No entanto, meu objetivo com esse texto é tratar desse aparente paradoxo: você investe em uma startup pensando no desinvestimento, ou seja, é como se você se casasse pensando em uma separação.
O namoro, o casamento e a separação
A ironia é que, já no “namoro”, você tem que avaliar a “separação”. Além de investigar o potencial daquela startup, é importante imaginar que o seu retorno acontecerá apenas em um “evento de liquidez”, ou seja, se ela for vendida a outro grupo de investidores, a uma outra empresa ou se abrir seu capital na bolsa de valores. Embora haja outras oportunidades, essas são as mais comuns.
Durante o “casamento”, ou seja, após você entregar o seu dinheiro aos fundadores, a sua atuação nem sempre é muito grande, pois outros investidores - e os próprios fundadores - costumam ter maior poder de decisão. Costuma ser um tanto frustrante imaginar que, diferentemente de um investimento em ações, ou mesmo em renda fixa, você não tem muito espaço de manobra. Há uma altíssima taxa de risco e o frio na barriga é constante.
Porém, lá na “separação” é que vemos se tudo isso valeu a pena. São nesses momentos em que você faz a conta de quanto investiu, por quanto tempo, e quanto recebeu, para ter uma ideia do seu retorno (e poder comparar com o que deixou de ganhar em outros investimentos).
Traduzindo o conceito em exemplos reais
Para tornar esse processo um pouco mais tangível, irei utilizar o “ LatAm Tech Report 2023 ”, da Latitud, como material de apoio. Nele, você poderá observar que o ecossistema tecnológico da região está repleto de oportunidades, em especial para as startups.
Com um PIB (Produto Interno Bruto) que ultrapassa US$ 6 trilhões (R$ 29,21 trilhões), uma população próxima a 700 milhões e uma quantidade absurda de problemas a resolver, a América Latina oferece um terreno fértil para startups com forte orientação tecnológica.
Esse relatório trabalha com algumas verticais e resumo aqui as oportunidades e possíveis oportunidades de saídas para elas, com o objetivo de consolidar o conceito de “namorar”, “casar” e “separar”.
Fintechs
O setor é promissor devido à crescente demanda por serviços financeiros digitais e soluções inovadoras em uma região com alta taxa de pessoas sem acesso a serviços bancários tradicionais.
Exemplos incluem empresas como Kapital e QI Tech, que revolucionaram o acesso a serviços financeiros na região. Essas startups são atraentes para aquisições por grandes instituições financeiras, que podem utilizar-se destas tecnologias para melhorarem sua eficiência ou qualidade de serviço, mas também tem potencial para IPOs (venda de ações na Bolsa de Valores), dada a sua capacidade de crescimento rápido e significativo impacto no mercado.
E-commerce
A ascensão do e-commerce na América Latina é impulsionada pelo aumento da penetração da internet e mudanças nos hábitos de consumo, influenciados pela pandemia.
Startups como Mercado Livre e Rappi têm demonstrado como o comércio eletrônico pode ser adaptado às necessidades e características locais. Há também diversas empresas que oferecem soluções inovadoras para o e-commerce, as quais têm potencial para serem adquiridas por grandes empresas do mercado varejista ou para formarem fusões estratégicas, expandindo, assim, sua presença e alcance no mercado.
Healthtechs
O envelhecimento da população, normalmente associado a recursos econômicos limitados, gera a necessidade de soluções de saúde mais eficientes e acessíveis, como a telemedicina e a gestão preventiva baseada em informações, tornando este setor extremamente promissor.
Startups como Memed e Dr. Consulta são exemplos de inovações em saúde digital que atraem o interesse de grandes corporações farmacêuticas e de prestação de serviços de saúde, buscando inovações para integrar em seus serviços, além de oferecerem potenciais parcerias ou acordos de licenciamento.
Edtechs
Com a digitalização da educação, seja na produção ou distribuição do conteúdo, há uma crescente demanda por soluções tecnológicas que facilitem o aprendizado e a gestão educacional, tanto para o público final como para a educação corporativa.
Startups como Descomplica e Veduca mostram como a educação pode ser transformada pela tecnologia. Estas são candidatas a aquisições por grandes instituições educacionais, ou até editoras, em um setor que está acelerando seu processo de concentração.
Agtechs
Dada a herança agrícola da região, as startups de agtech são fundamentais. A tecnologia voltada para aprimorar a eficiência, sustentabilidade e gestão da cadeia de suprimentos agrícolas é particularmente promissora, potencializando as vantagens naturais de nossa região.
Startups como Solinftec e Agrosmart exemplificam como a tecnologia pode revolucionar práticas agrícolas. Estas startups são atraentes para aquisições por grandes empresas do setor agroindustrial, além de oferecerem oportunidades para parcerias com cooperativas agrícolas.
Preparado para casar e se separar?
Investir em startups de tecnologia na América Latina com um plano de saída bem definido não só oferece a possibilidade de um retorno financeiro significativo, mas também a chance de contribuir para a transformação digital em uma das regiões mais dinâmicas e carentes de inovação no mundo. Então, coloque sua roupa mais bonita (estude!), chame seus amigos (invista em grupo!) e saia para o rolê.