Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal - STF (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Rodrigo Caetano
Publicado em 1 de setembro de 2021 às 06h00.
O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira, 1, o julgamento do chamado marco temporal de demarcação de terras indígenas, que estabelece a data da promulgação da Constituição como limite para a reivindicação de territórios. Caso decida pela validade do marco temporal, povos que não ocupavam suas terras no dia 5 de outubro de 1988 perdem o direito a ela.
A questão opõe proprietários de terra e indígenas. Ambos defendem suas próprias interpretações da Constituição. Os primeiros alegam que é preciso pacificar a questão fundiária traçando uma linha no passado. Para os indígenas, a situação parece arbitrária, uma vez que alguns povos não ocupavam seus territórios na data limite por falta de opção.
Em oposição ao marco temporal, indigenistas e ambientalistas advogam pela “teoria do Indigenato”. Para eles, a Constituição é clara ao afirmar que o direito indígena à terra é originário, ou seja, antecede a criação do estado brasileiro.
Concretamente, o STF irá analisar um recurso proposto pela Fundação Nacional do Índio (Funai), com base em um caso específico ocorrido em Santa Catarina, mas com repercussão geral, o que significa que a decisão servirá de base para todos os outros casos semelhantes.
A discussão começou com uma ação do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, antiga Fundação de Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente (Fatma), que usa o argumento do marco temporal para negar a necessidade de reconhecimento da terra indígena Ibirama-Laklãnõ, na Reserva Biológica do Sassafrás, onde vivem os povos Xokleng, Guarani e Kaingang.
“É um processo muito difícil por colocar coisas diferentes no mesmo julgamento, como comunidades indígenas que viraram praticamente uma cidade e outras que estão sendo invadidas por criminosos”, afirma Marcello Brito, presidente do conselho da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG). E as populações indígenas são muito importantes pelo que eles são e pelo que eles representam”
A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou contra o marco temporal, em junho deste ano. O PGR, Augusto Aras, afirma que a Constituição “reconhece aos índios direitos originários sobre as terras de ocupação tradicional, cuja identificação e delimitação há de ser feita à luz da legislação vigente à época da ocupação".
A ameaça à demarcação de terras também mobilizou a comunidade internacional. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a ONG Human Rights Watch (HRW) foram algumas das entidades que se posicionaram contra o marco temporal, por entenderem que a tese é um retrocesso nos direitos indígenas.