Brasil fecha 2024 com aumento de 46% nos incêndios e bate recorde dos últimos 10 anos
Dados do Programa Queimadas do Inpe registraram 278,3 mil focos de fogo no ano passado e a Amazônia foi o bioma mais atingido, com 140.346 ocorrências
Repórter de ESG
Publicado em 3 de janeiro de 2025 às 13h39.
Última atualização em 3 de janeiro de 2025 às 14h08.
O Brasil fechou 2024 com 278.229 focos de incêndio durante o ano, aumento de 46% em relação a 2023, quando registrou 189.901 ocorrências. É isto que mostram os dados do programa BD Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que analisa a série histórica desde 1998.
Este é o piornúmero de queimadasdesde 2010, quando o país registrou 319.383 ocorrências.
O bioma mais atingido foi a Amazônia, com 140.346 queimadas e alta de 42% na comparação com o ano anterior.Em seguida estão Cerrado (81.468), Mata Atlântica (21.328), Caatinga (20.235) e Pampa (424).No Cerrado, o aumento foi de 60% no período de análise — maior número desde 2012 (90.579). Já o Pantanal disparou 120%, pior registro desde 2020 (22.116).
Luciana Gatti, cientista climática do Inpe e coordenadora do Laboratório de gases de efeito estufa, disse à EXAME que o cenário é desesperador e conta queesteve na Amazônia nos últimos dias de novembro de 2024 e viu Manaus e Santarém (PA) ainda cobertas de fumaça.
"Eram cinco meses queimando. Não temos nem o quecomemorar em relação à queda no desmatamento. Na Amazônia, as árvores morrem e não se recuperam após o fogo. O que nasce no lugar, não é nem comparável", lamentou.
A especialista se refere à redução de 30,6% na perda de vegetação na Amazônia legal em 2024, apresentada em novembro pelo sistema Prodes, do Inpe. O número teria sido celebrado por representar a menor área desmatada em nove anos, mas, segundo Luciana, não considera as queimadas e tem subnotificação.
"O fogo acaba sendo usado como arma de desmatamento, pois muitas vezes é considerado acidental e é mais difícil de provar e responsabilizar quem o causou. No entanto, utilizando medições com avião, recebi em 2024 inúmeras fotos que mostram claramente que a queimada é planejada para desmatar. Isso torna a situação extremamente complicada", explicou ela.
Além disso, o monitoramento do Inpe revelou que 48% dos focos de incêndio foram na América do Sul (511.575), e o Brasil lidera o ranking dos países com mais registros.
Oestado de São Paulobateu recorde no país: um aumento de 423%, com 8.702 ocorrências.E oPará,que será sede daConferência do Clima da ONU (COP30)pela primeira vez no Brasil, também preocupa: foram 56,06 mil registros, uma alta de 34% — inclusive maior que no Amazonas (30%), onde foram identificados 25.499 focos de fogo.
2024, o ano de uma seca histórica
A seca histórica no Brasil em 2024, influenciada pelo fenômeno do El Niño e agravada pelas mudanças climáticas, fez as chamas se alastrarem ainda mais pelo país.Dados do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden) apontaram que a estiagem afetou 26% do território nacional no ano passado e foi a maior em extensão e intensidade dos últimos 70 anos.
Segundo Luciana, as consequências das queimadas são terríveis,pois existe uma relação direta entre perda de vegetação, eventos extremos, redução de chuvas e desequilíbrio climático no Brasil.
"Aquantidade de floresta assassinada pelo fogo é gigantesca. Coloca 'a perder' todo o ganho obtido com a queda no desmatamento. São florestas que representam emissões de carbono e que continuarão emitindo CO2 por décadas, devido à decomposição das árvores mortas", destacou.
Emissões brasileiras
Outro grande problema é que as queimadas não entram no inventário de emissões nacionais como fonte de CO2, ressaltou ela. No Brasil, a maior parte delas vem do uso da terra e perda de vegetação causadas principalmente pela agropecuária. A especialista acredita que a solução poderia ser embargar a propriedade de quem promove queimadas em áreas para criar gado.
"Se tivéssemos uma política de redução do rebanho bovino, poderíamos diminuir significativamente as emissões. A Amazônia deveria ter produção de gado apenas para consumo local, e não para alimentar o mundo", acrescentou.
Para ela, seria preciso diminuir em 10% ao ano esta produção no país e na Amazônia, em torno de 20%, visando combater o problema de forma efetiva.