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"Além de enfrentar as crises, precisamos reflorestar as mentes e a consciência", diz Sonia Guajajara

Durante o TEDxAmazônia em Manaus, a Ministra dos Povos Indígenas do Brasil destacou a urgência de nos inspirarmos nos saberes ancestrais dos povos indígenas para garantir o futuro do planeta

Sonia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas do Brasil: "Belém não será só a COP do financiamento, mas deve deixar um legado de implementação" (TEDx Amazônia/Divulgação)

Sonia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas do Brasil: "Belém não será só a COP do financiamento, mas deve deixar um legado de implementação" (TEDx Amazônia/Divulgação)

Sofia Schuck
Sofia Schuck

Repórter de ESG

Publicado em 1 de dezembro de 2024 às 15h45.

Última atualização em 1 de dezembro de 2024 às 16h01.

"Estamos vivendo um período de muitos desafios ambientais, climáticos, sociais e espirituais. E parte disso é por conta das relações humanas, exploração predatória da natureza, desigualdades de poder e de riquezas", disse Sonia Guajajara, Ministra dos Povos Indígenas do Brasil, durante o TEDxAmazônia realizado em Manaus, bem no coração da Amazônia.

Presença muito aguardada no último dia do evento que discute o resgaste da "ancestralidade coletiva" para driblarmos os desafios mais urgentes do planeta, a ministra veio representar os povos originários e ecoar as vozes da floresta

É impossível discutir todas estas crises de forma isolada e em caixinhas, lembrou. "É importante trazermos estas reflexões, exemplos e vivências dos povos para realacionarmos todas elas". E a solução está justamente nos saberes ancestrais e cultura dos povos da floresta, os grandes guardiões da Terra e protetores da natureza. 

"Não é poesia quando Davi Kopenawa diz que estamos segurando o céu, é um fato científico: a vida no planeta não poderia suportar o desaparecimento dos indígenas", disse. Não à toa, precisamos aprender muito com o viver destas populações, e fazer prevalecer os interesses coletivos em vez dos individuais, frisou. 

"O planeta já sofre as consequências das mudanças climáticas e os riscos serão sentidos por todos, embora de forma desigual.  Para além de enfrentar as crises, precisamos reflorestar as mentes e a consciência humana", destacou.

Segundo ela, o modelo de desenvolvimento econômico predominante hoje é o extremo "moderno, colonial e capitalista", e que desde o século 16, levou a uma série de crises sucessivas. "São ciclos baseados na destruição de comunidades e povos. Tudo pelo lucro", lamentou. 

No século 21, o mesmo modelo nos levou a ultrapassar todos os limites planetários. Neste cenário, o conhecimento dos povos indígenas é cada vez mais inestimável: "Mesmo os grandes estudiosos e sociólogos não conseguem entender e trazer a defesa de que a Terra é sagrada", complementou.  

A ministra conta que, em sua trajetória, foi percebendo o desastre e as consequências drásticas que vivemos até hoje a partir deste modelo de desenvolvimento -- baseado na colonização do Brasil pelos Europeus, exploração e 'roubo' de recursos naturais. 

"A economia pode até funcionar a curto prazo quando pensamos apenas em gerar lucro, mas sem a ecologia ela vai fatalmente colapsar no longo prazo. E se o mundo material der as costas para o sagrado, vamos entrar em colapso.", disse. Para evitarmos o pior, ela acredita que não se pode separar a economia da ecologia, meio ambiente e espiritualidade. 

Frente o tamanho do desafio, ela cita duas dificuldades: o "mundo europeizado" e também o "desencantamento" -- que fala muito sobre como as pessoas se distanciaram do sagrado e da conexão entre a vida e a natureza. "Hoje, precisamos voltar a entender o sentido de algumas práticas que os povos indígenas já falam há muito tempo", disse. 

E é aí que entra a ideia de reflorestar mentes e a consciência humana. Como exemplo, a ministra citou o período de pandemia da Covid-19, onde se buscava por uma cura em uma vacina. No caso do combate à crise climática, a solução seria o despertar da consciência da humanidade e a união do conhecimento científico e ancestral.

Nesta luta, todos tem seu papel: governos, setor privado, organizações e também a sociedade, lembrou Sonia. "Não podemos esperar apenas que os países mais ricos e desenvolvidos resolvam. A  responsabilidade precisa ser compartilhada", disse.

Em alusão ao tema central de financiamento na Conferência do Clima da ONU (COP29) em Baku, a ministra reiterou que o acesso aos recursos é crucial, mas não é só isto: é preciso de todos os atores. 

Rumo à COP30 no Brasil em 2025, ela também destacou que não há mais tempo de realizar COPs sem encaminhamentos práticos. "Belém não será só a COP do financiamento, deve deixar um legado de implementação". 

Além disso, complementou que as Cúpulas do Clima da ONU realizadas até então não foram capazes de evitar o aumento da temperatura e em 2024, vivemos o ano mais quente da história. "Então, por que não há uma urgência proporcional ao tamanho do problema e das responsabilidades em relação ao financiamento para enfrentar os históricos desafios da destruição?", refletiu. 

Como demandas do ministério, estão o fim do garimpo e o desmatamento zero na Amazônia e em todos os biomas do país -- este também crucial para cumprirmos a nova meta climática (NDC) brasileira de reduzir em até 67% as emissões até 2035. "O Brasil tem se comprometido e temos alcançado números significativos. Mas ao mesmo tempo em que reduzimos, também sofremos grandes incêndios florestais e queimadas que provocam emissões", acrescentou. 

Pensando em levar a voz indígena para o centro dos debates e tomadas de decisão da COP30, o ministério também promove um programa de formação para líderes das comunidades levarem suas demandas aos negociadores. "Será a maior e a melhor COP em participação dos povos originários", garantiu. 

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